1º BIMESTRE
1. Relações entre
espaço geográfico e globalização
A principal forma
de expressão da chamada globalização é o aumento das relações na escala global.
Globalização: escalas e tecnologias
O que é a
globalização? Quais as implicações desse processo em nosso cotidiano? Há
vantagens? Quais? Há problemas? Quais?
O texto de Ralph
Linton, na página 3 do caderno do aluno, permite uma reflexão sobre o
significado das relações que se desenvolvem na escala mundial. Refere-se a uma
longa história de trocas culturais entre diversos grupos sociais e nações.
Considerando que as trocas atuais são muito mais volumosas e aceleradas, até
onde terão chegado as influências entre os povos? Isso não dará condições para
perceber-se que, na atualidade, a escala mundial está bem mais plena de
relações? Será que estamos nos transformando em “cidadãos do mundo”, bem mais
do que apenas cidadãos nacionais?
O espaço geográfico
é uma construção humana sobre uma superfície natural transformada, composta por
edificações e obras diversas, dispostas para possibilitar a constante interação
dos homens entre si e entre os bens que eles produzem e os bens naturais. Por
tudo isso, o espaço geográfico é parte integrante da sociedade.
Tendo esse
entendimento de espaço geográfico em mente, podemos retornar à análise do
processo de globalização. Teria a globalização uma dimensão espacial clara na
sua constituição? O espaço geográfico transformou-se para que a globalização,
que corresponde ao aumento extraordinário das relações na escala mundial,
pudesse acontecer.
O que percebem da
globalização, com situações observadas em seu cotidiano?
Como o lugar se
insere no mundo?
Em um primeiro
momento, ficará mais fácil entender como a escala global se insere no lugar, na
escala local. Identificar o global no local é algo que observamos diariamente:
as influências de outros países, de outras culturas no nosso dia a dia é um
exemplo de algo global que se insere no local. A escala global passa pelo seu
lugar, e seu lugar está nesse mundo que está se construindo.
Na medida em que o
global vai se inserindo no lugar e transformando-o, o lugar também vai
transformando o mundo. Entretanto, vários fatores condicionam as possibilidades
concretas de inserção do lugar no mundo. Como isso acontece?
Pode-se trabalhar
com os três grandes níveis de escala: local, regional (nacional) e global. Os
dois últimos níveis (o nacional e o global) agem sobre o primeiro (o local),
mas não podem substituí-lo. O local, por mais influências alheias absorva,
sempre tem sua particularidade.
A globalização é o
encurtamento das distâncias em razão dos avanços tecnológicos, é a
homogeneização dos lugares a partir da uniformização dos processos produtivos,
do consumo, dos hábitos, a expansão das corporações para regiões fora de seus
países de origem.
Qual é o “motor” da
globalização? A globalização é um processo que já vem ocorrendo há muito tempo?
As grandes
navegações e o processo de colonização de novos espaços pelos europeus
ocorreram no chamado Período Técnico. Esse longo período foi pródigo em
avanços: a bússola, os portulanos, a imprensa, e posteriormente a máquina a
vapor e o telégrafo são alguns exemplos do que a humanidade incorporou nesse
período.
Esses aparatos
técnicos possibilitaram, a certos países, atuar numa escala global: acelerar os
contatos e as trocas, ter acesso a novos bens e outras culturas, expandir sua
força econômica, construindo um regime capitalista. Mas não era, nesse momento,
globalização.
A globalização, no
presente, tem outra força e outra qualidade. Antes de tudo, ela é fruto de uma
revolução tecnológica nas comunicações e na eletrônica, que encurtou distâncias
e criou novas formas de comunicação e organização. Tais alterações também podem
ser consideradas como responsáveis pelas grandes mudanças no cenário
geopolítico do século XX, alimentando novas formas de organização econômica ao
aproximar mercados e reorientá-los em blocos comerciais (Nafta, MERCOSUL, etc).
Essa reorganização
é diferente daquele manifestada durante o período da “Guerra Fria”, quando o
mundo era polarizado por forças hegemônicas lideradas pelos Estados Unidos da
América (EUA) e pela extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), que utilizaram seus sistemas econômicos – capitalismo e socialismo –
como forças de pressão internacional.
Contemporaneamente,
os progressos técnicos estão intimamente ligados à aceleração do tempo,
característica-chave do processo de globalização. Essa aceleração muda nossas
relações com a distância geográfica, agora mais facilmente transposta. Trata-se
da compressão do tempo-espaço: o encolhimento do mapa do mundo, graças a
inovações nos transportes que encolhem o espaço por meio do tempo.
A figura “O
encolhimento do mapa do mundo”, na página 7 do caderno do aluno, demonstra a
metáfora do “encolhimento” ou da nova relação das sociedades com a distância,
relacionada ao desenvolvimento dos meios de transporte. Pode-se afirmar,
portanto, que o mundo ficou menor para o ser humano. As pessoas, os remédios,
as mercadorias chegam muito mais rapidamente a seus destinos.
O que permite
compreender o processo de globalização é a incorporação de novas tecnologias no
espaço, ou seja, o advento da revolução tecnológica, ainda em andamento e
responsável, também, pela integração de economias e mercados. No entanto, é
possível perceber que se trata de um fenômeno que vai muito além da integração
econômica e de mercados, que por si só já é um evento de grande complexidade.
As empresas
multinacionais transformaram-se em transnacionais e atualmente são empresas
globais. Os mercados não são mais apenas locais, mas planetários. Temos a
universalização do sistema produtivo, do sistema financeiro e das formas de
comunicação. Mas essa universalização não engloba todos os segmentos de uma
sociedade: por exemplo, uma universalização da política. Não é possível afirmar
a existência de um espaço global. O que na verdade existe é um conjunto de
espaços nacionais e algumas redes que atuam na escala global. Será que todos os
lugares e povos são atingidos pela globalização com a mesma intensidade? A
resposta é não!
Alguns exemplos de
comunidades que não são favorecidas são as comunidades indígenas, as
comunidades quilombolas (grupos humanos remanescentes dos antigos quilombos –
povoados de escravos fugidos à época da escravidão no Brasil), as comunidades
camponesas, praticantes ainda da agricultura de subsistência, pescadores ou
caiçaras.
Por isso, por mais
contraditória que seja a expressão, a globalização não é universal. Mas podemos
afirmar que a globalização já implica num maior interdependência dos países
entre si e das pessoas de certa maneira, numa articulação instantânea entre os
diferentes lugares do mundo (conexão on-line), numa certa tendência à
uniformização de padrões culturais.
Pode-se dizer que,
a multiplicação dos espaços de lucro (domínio de mercados, locais de
investimento e fontes de matérias-primas) foi uma força que conduziu o mundo à
globalização. Entretanto, até este momento, há limitações para a amplificação
do fenômeno: o progresso técnico atinge poucos países e regiões e, ainda assim,
de forma circunscrita (limitada, restrita, com limites determinados) e com
efeitos que não vão se generalizar.
Está em construção
uma nova cartografia do mundo, com as redefinições no espaço geográfico.
2. Diferenças
regionais na era da globalização
Vamos
aprofundar o conceito de globalização, identificando seus efeitos na economia e
no cotidiano dos indivíduos, a produção das diversidades e desigualdades
regionais, apesar da maior tendência de homogeneização (igualar, já que todos
têm acesso a tudo) desencadeada por esse processo. Vamos identificar a
existência de divisões de trabalho, tanto no processo produtivo – divisão
social do trabalho – como entre atividades econômicas, que se territorializam –
a divisão territorial do trabalho (cada região pode desenvolver determinado
tipo de trabalho).
Globalização: regionalização e
identidades locais
Como há uma
crescente interligação econômica no plano da escala mundial, podemos aprofundar
esse entendimento com os exercícios do caderno do aluno.
3. As
possibilidades de regionalização do mundo contemporâneo
O mundo
contemporâneo, por conta da globalização, permite diversas interpretações e
classificações das regionalizações na escala mundial. Vamos comparar as
diferentes propostas de regionalização e de onde vêm estas idéias.
Os modos de ver a ordem mundial
A leitura e a
interpretação de diversos mapas é uma das habilidades mais importantes da
Geografia. Sua aprendizagem possibilita aplicá-la sistematicamente em todos os
conteúdos da Geografia, além de contribuir para a solidificação do aprendido. A
cartografia expressa, graficamente, relações espaciais entre fenômenos que
tenham expressão geográfica. Envolve, necessariamente, comparação,
diferenciação e classificação dos objetos, além da análise das relações entre
eles. Os mapas e gráficos complementam as idéias expressas
pelos conceitos, permitindo observar diversos aspectos da realidade
sintetizados no mapa ou mesmo no gráfico, tornando-nos aptos a compreender,
interpretar e analisar a realidade que os cerca e o mundo em sua complexidade.
A divisão regional
mais tradicional de todas e a primeira natural do mundo é a divisão por
continentes: Américas, Europa, Ásia, África e Oceania. Baseada em fatores
naturais, apresenta a divisão entre terras emersas (continentais e ilhas), os
oceanos e mares.
O mapa que fizemos
no capítulo 1 (Relações entre espaço geográfico e globalização), apresentando o
sentido dos fluxos de países e regiões mais dinâmicos economicamente (ou seja,
onde as coisas que usamos são produzidas) é um exemplo de regionalização, a
partir desses fluxos econômicos.
Quando pensamos nos
países ou nas regiões mais desenvolvidos, com empresas mais poderosas lembramos
dos Estados Unidos, Canadá, Japão, Europa ou países da Europa Ocidental, ou
ainda a Austrália. Temos uma visão que esses países e continentes são
referências em tecnologia avançada, em riqueza da economia e das pessoas. O
mundo contemporâneo é muito influenciado pelos países com economia mais
dinâmica, os países mais desenvolvidos (aqueles que registram o maior número
de empresas e marcas que consumimos). Essas relações entre os diferentes países
e/ou continentes do mundo se estabeleceram através da tecnologia, em especial
as de transporte e comunicações e até a proximidade pode ser um fator. Nossos
hábitos, modos de vida, esporte, itens de consumo (vestuário, automóveis,
eletrodomésticos), além dos produtos da indústria cultural e de entretenimento
(principalmente música e cinema) têm uma grande influência dos Estados Unidos.
Afinal, estamos inseridos na sociedade de consumo e os apelos publicitários são
muito eficazes.
Principais processos de integração
regional, 2007
Os processos de
integração regional representados no mapa “Principais processos de integração
regional, 2007”, na página 18 do caderno do aluno, são a expressão de uma
nova ordem que é multipolar. Alguns blocos estão polarizando forças econômicas
e políticas, interferindo inclusive na ordem geopolítica, que envolve a força
militar dos países e blocos. O mundo contemporâneo é muito influenciado por
países com economias mais dinâmicas.
O bloco americano
(NAFTA – Acordo de Livre Comércio da América do Norte) tem o dólar como
referência monetária e está sob a liderança dos Estados Unidos. Eles exercem
incontestável influência regional, mas, acima de tudo, sua influência se dá na
escala global.
O segundo bloco é o
europeu (UE – União Européia), cuja referência monetária é o euro, sob comando
dos países que compõem a União Européia e com área de influência abrangendo o
norte da África e parte do Oriente Médio. Esse bloco também exerce poderosa
influência na escala global.
Finalmente, temos o
Bloco da Ásia ou do Pacífico (ASEAN). A referência monetária ainda é o iene
(moeda japonesa) e a área de projeção econômica compreende o chamado Cinturão
do Pacífico (China, Austrália e Nova Zelândia). Neste bloco, a influência dos
Estados Unidos é, também, muito significativa.
Essa atual
configuração encontrada já está mudando, o que demonstra a mudança constante
das regionalizações. A China, por exemplo, com seu dinamismo econômico,
destaca-se no bloco do Pacífico, colocando em cheque a liderança do Japão na
região.
Mas, não somente
entre os blocos, o poder das influências se altera. Entre blocos e regiões,
novos laços se estabelecem. O Brasil, por exemplo, tem procurado, estrategicamente,
incrementar o intercâmbio comercial com a China, fazendo acordos comerciais com
esse país, e com isso diminuir sua dependência (e do restante da América do
Sul) com os EUA. O Brasil já é o principal parceiro comercial da China na
América Latina. Empresas brasileiras têm ampliado seus negócios naquele país,
exportando, por exemplo, as turbinas geradoras para a hidrelétrica de Três
Gargantas. A cooperação estende-se para o setor aeroespacial, com o desenvolvimento
conjunto de satélites para meteorologia e telecomunicações.
O mapa “A
bipolaridade e a ordem westfaliana, 1950-1980” na página 20 do caderno do
aluno, representa e exemplifica uma regionalização de acordo com os sistemas
econômicos vigentes na maior parte do século XX, isto é, o grupo de países
capitalistas (sob a liderança dos Estados Unidos) e o grupo de países
socialistas (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas).
Depois de um
período de crescimento econômico, marcado por intensa industrialização do país
e posteriormente pela corrida espacial estabelecida entre EUA e URSS, a economia
da URSS perdeu terreno para os países capitalistas desenvolvidos e, pela
primeira vez, em 1985, o PIB do Japão superou o soviético. Além disso, a URSS
acumulou um atraso em relação ao desenvolvimento tecnológico em setores
importantes, como o das telecomunicações e da informática (o chamado segmento
das TICs – tecnologias de informação e comunicação), um dos fatores
responsáveis pela desintegração do império soviético. Para enfrentar a crise
econômica, a União Soviética passou a investir menos em armamentos e ampliar
as aplicações na agricultura e na indústria de bens de consumo. Ao mesmo
tempo, passou a desenvolver uma política de reaproximação com os Estados
Unidos. Esta abertura estendeu-se aos países socialistas que estavam sob a
esfera de dominação da URSS, em especial no Leste Europeu. Dois acontecimentos
marcam emblematicamente este período:
1. A queda do
Muro de Berlim, em 1989 (símbolo do fim da Guerra Fria) e a reunificação da
Alemanha, dividida em capitalista e socialista, ao término da segunda Guerra
Mundial. O Muro de Berlim dividia a cidade em duas partes - Berlim Oriental
(socialista) e Ocidental, (capitalista);
2.
A independência de várias das repúblicas que compunham a URSS. Em 1991,
dez repúblicas das quinze anteriores que compunham a URSS fundaram a CEI -
Comunidade de Estados Independentes: Armênia, Belarus, Casaquistão, Federação
Russa, Moldávia, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia,
Uzbequistão. Em 1993, mais duas repúblicas ingressaram na CEI: Geórgia e
Azerbaijão. Ficaram de fora a Estônia, a Letônia e a Lituânia, que se
incorporaram à União Européia. Assim a URSS deixou de existir, e pode-se dizer
que a Guerra Fria chegou ao fim, rompendo o poder bipolar dividido entre EUA e
URSS.
Começa um novo
período, após a crise e a dissolução da URSS, uma NovaOrdem Mundial, com
um mundo multipolarizado, como observamos no mapa “Principais
processos de integração regional, 2007”, na página 18 do caderno do aluno,
que representa um mundo dividido entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos
ou um mundo subordinado ao sistema capitalista, e com a hegemonia dos Estados
Unidos e das grandes corporações internacionais. A contraposição desenvolvimento/subdesenvolvimento,
em escala mundial, corresponde a um processo histórico, de interdependência
entre países e marcado por relações comerciais (de troca) desiguais, que
produzem estruturas econômicas, sociais e espaciais diferenciadas. Trata-se
também de uma forma de dividir o mundo, resultante da posição ocupada pelas
regiões no interior do sistema mundial e em cada momento histórico.
Para entendermos
essa condição de desigualdade, o comércio mundial de mercadorias indica três
pólos dominantes: América do Norte; União Européia e; Ásia e Oceania, enquanto
o restante do planeta fica numa condição periférica, numa condição de maior
fragilidade, formando um comércio tripolar, como observamos no mapa “Comércio
mundial de mercadorias, 2006” na página 21, do caderno do aluno. A
condição marginal na participação na troca mundial de mercadorias de certas
áreas do planeta (América do Sul e Central, África e partes da Ásia)
corresponde a uma indicação, entre outras possíveis, da condição de
subdesenvolvimento (ou de atraso econômico) de alguns países, o que corresponde
a uma possível visão de uma divisão do mundo entre países desenvolvidos e
subdesenvolvidos. Essa condição, à margem dos grandes fluxos comerciais do
mundo, não significa que os países da “periferia” não se relacionam com os dos
“centros”. Eles se relacionam, mas são relações marcadas por várias
desigualdades e desvantagens no valor econômico das transações e no poder de
decisões. Os quadros “O que os países periféricos recebem dos países centrais”
apresentam as relações entre o “centro” e a “periferia”, na página 23 do
caderno do aluno, e esquematizam as relações que estão se transformando, mas
que foram marcadas ao longo das últimas décadas pelas características
apresentadas. Ainda é possível enxergar nesse mundo, agora multipolar, um
centro e uma periferia, com a existência de desigualdades.
4. Os principais
blocos econômicos supranacionais
Vamos
comparar os blocos econômicos supranacionais, para compreender as conseqüências
de seu funcionamento na escala regional e mundial, os impactos sobre os países
membros, as estratégias de agrupamento como parte do processo de integração
econômica na escala mundial e a concorrência entre empresas e nações. Os blocos
econômicos são uma possibilidade para a afirmação econômica e política dos
países envolvidos.
A formação dos blocos supranacionais
Quais
os motivos que levaram esses países a se unir e não agir solitariamente no
mercado internacional? Vamos estudar a respeito da área de abrangência dos
diversos blocos econômicos supranacionais, a compreensão dos impactos
territoriais e as conseqüências para os países membros e para os demais.
Ao interpretarem
esses blocos, vocês irão aprender que essas localizações não são dados
meramente pontuais, mas que têm, de fato, um significado estratégico e
político.
Um bloco econômico
é uma associação de países com vistas a defender interesses comuns na área do
comércio ou mesmo de outros envolvimentos de caráter econômico e político. A
intensificação das relações econômicas, na escala mundial, estimulou os países
a se agruparem para fazer frente à nova configuração econômica após o fim da
Guerra Fria. Países que fazem parte de um bloco disputam a hegemonia em função
da concorrência comercial por meio de isenção de tarifas alfandegárias, ou
mesmo a partir de uniões mais amplas.
São vários os modos
de organização dos blocos supranacionais, a começar que alguns são uniões mais
profundas, e outros mais parciais. Alguns exemplos:
1. Áreas de livre comércio (ALCA e
Nafta);
2. União aduaneira (MERCOSUL);
3. Mercado comum (União Européia).
Alguns blocos se
organizaram já há algum tempo, buscando uma maior integração, como é o caso da
União Européia, enquanto outros desenvolveram integrações de caráter apenas
comercial, como o Nafta, e outros ainda almejam ampliações de caráter
aduaneiro, como o MERCOSUL. Portanto, esses blocos apresentam distinções
técnicas importantes.
O mercado comum
apresenta um processo de integração, que leva em consideração a livre
circulação de mercadorias, pessoas, capitais e moeda. Além disso, promove a
formação de órgãos integrados em diferentes níveis, como o Parlamento Comum e
Banco Central Comum e almejam ainda uma política militar comum.
A União aduaneira,
como é o caso do MERCOSUL, abrange uma área de livre comércio e uma união
aduaneira, ou seja, as tarifas de importação para países fora do bloco devem
ser combinadas e aceitas por todos seus membros. Neste sentido, o MERCOSUL
apresenta formas de integração um pouco mais sofisticadas do que o Nafta.
A área de livre
comércio apenas estabelece a isenção total de tarifas para mercadorias
produzidas e comercializadas entre os seus membros. Este é o caso do Nafta e do
bloco da Bacia do Pacífico (Apec). Neste caso, cada país estabelece o imposto
de importação para os produtos dos países não-signatários (não participante) do
acordo, e apresentam moeda própria. Com relação às áreas de livre comércio, a
Organização Mundial do Comércio (OMC) define que uma região desse tipo só se
constitui como tal quando 85% ou mais do comércio é livre.
2º BIMESTRE
5.
A declaração dos direitos universais do homem
A ONU surgiu
durante a Segunda Guerra Mundial. É uma importante organização voltada para a
promoção da paz e da segurança coletiva. A história e o funcionamento da ONU
serão abordados no próximo tema. Porém, é importante informar que a Declaração
Universal dos Direitos Humanos foi proclamada pela Assembléia Geral em 1948, e
que se tornou uma espécie de documento-síntese do ideário (planejamento) das
Nações Unidas, a ser atingido por todos os povos e todas as nações. Qual a sua
compreensão acerca dos direitos básicos da pessoa humana?
Apresentação da Declaração Universal
dos Direitos Humanos e discussão de alguns de seus artigos
Vamos ler um trecho
da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nas páginas 9 e 10 no caderno do
aluno: é importante que acompanhem com atenção a leitura destes artigos e tirem
as possíveis dúvidas sobre o significado de cada um.
6. A Organização
das Nações Unidas (ONU)
Os objetivos desse
capítulo são:
- investigar o mecanismo de
financiamento da ONU;
- a tensão entre o Conselho de
Segurança (instância deliberativa maior das Nações Unidas) e o poderio dos EUA,
tornada explícita em 2003, por ocasião da II Guerra do Golfo;
- o significado da proposta de
reforma do Conselho de Segurança, com destaque para a posição da diplomacia
brasileira neste processo, e;
- analisar criticamente os resultados
dos Objetivos do Milênio, conjunto de metas estabelecidas pelas Nações Unidas
em 2000, em cujo horizonte estava a drástica redução da pobreza no mundo até
2015.
A ONU (http://www.onu-brasil.org.br/) foi criada em
1945, na Conferência de São Francisco, por representantes de 51 países, que
buscavam garantir a paz entre os povos e estabelecer um sistema de segurança
coletiva. Atualmente, 192 países fazem parte da organização. A Assembléia Geral
e o Conselho de Segurança são os órgãos deliberativos (capazes de resolver,
após exame, discussão) das Nações Unidas.
Na Assembléia
Geral, cada Estado dispõe de um voto; as principais decisões são tomadas por
maioria qualificada de dois terços, enquanto as decisões corriqueiras só
necessitam de maioria simples. Nas questões de paz e segurança, a Assembléia
Geral produz apenas recomendações, pois a tomada de decisões é atribuição do
Conselho de Segurança.
O Conselho de
Segurança é composto por cinco membros permanentes e dez rotativos, eleitos
pela Assembléia Geral. Os membros permanentes são Estados Unidos, Federação
Russa, China, Grã-Bretanha e França. Qualquer um deles pode bloquear uma proposta
com a apresentação de um voto negativo, mesmo que os outros quatro membros
permanentes e os dez membros não-permanentes tenham votado a favor. Chama-se a
esta situação de “poder de veto”. As decisões sobre temas de paz e segurança
dependem de uma maioria de nove votos e da inexistência de um veto.
Atualmente, o
Sistema das Nações Unidas é composto por agências, fundos e programas
especializados que trabalham em áreas diversas, como saúde, trabalho,
agricultura, educação e meio ambiente. Algumas das importantes são:
- Organização Mundial da Saúde (OMS):
discute e propõe novas práticas de erradicação de doenças e de promoção da
saúde;
- Organização Internacional do
Trabalho (OIT): elabora regras internacionais para assegurar os direitos do
trabalhador e para combater todas as formas de trabalho escravo;
- Organização das Nações Unidas para
a Agricultura e a Alimentação (FAO): desenvolve programas de combate à fome e
de incremento da produtividade agrícola e pecuária;
- Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO): elabora programas de educação e
cultura e estimula a cooperação científica internacional;
- Fundo das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF): atua em programas de saúde e de bem estar das crianças;
- Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD): busca combater a pobreza e promover o desenvolvimento;
- Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente (PNUMA): responsável pela proteção do meio ambiente, cujo
objetivo é capacitar nações e povos a aumentar sua qualidade de vida sem
comprometer a das futuras gerações.
O momento de
fundação da ONU e de seus mecanismos foi a favor da paz com o contexto da
Segunda Guerra Mundial. O sentido e a necessidade de organizações multilaterais
no contexto histórico global são marcados pela intensificação dos fluxos de
idéias e de mercadorias entre os países do mundo e pela dimensão igualmente
global da problemática ambiental.
Quem financia as atividades da ONU?
Os recursos para a
manutenção da estrutura da ONU e para o cumprimento das decisões do Conselho de
Segurança e da Assembléia Geral são provenientes das contribuições anuais dos
países membros. A ONU é composta por 192 países, mas eles não contribuem
igualmente para o orçamento da instituição, pois a contribuição é calculada a
partir da capacidade econômica de cada país.
Observando o mapa
“Quem financia a ONU?”, na página 14 do caderno do aluno, verificamos que os
maiores financiadores dos programas e agências da ONU são os Estados Unidos, os
países da União Européia e o Japão. Isso se deve ao fato de estas serem algumas
das maiores economias do mundo. O Brasil é o principal financiador da ONU
porque a nossa economia ocupa o primeiro lugar na América do Sul. No continente
africano, apenas quatro países contribuem com somas anuais superiores a 1
milhão de dólares: África do Sul, Argélia, Líbia e Nigéria. Isso ocorre porque
a esmagadora maioria dos países africanos vive em condições de extrema pobreza.
Entretanto, nem
todos os países cumprem regularmente suas obrigações para com a ONU. A ONU é,
sobretudo, financiada pelos países ricos e pelas economias mais fortes. A
escassez de recursos compromete muito os programas em prol da melhoria da
qualidade de vida da população mundial, essencialmente daquela parcela que vive
nos países mais pobres. Os EUA são a maior economia do mundo e um dos
principais financiadores da ONU, mas são responsáveis por sucessivos e
significativos atrasos de suas contribuições. Desde 1986, a dívida
tem sido superior à dívida somada de todos os demais países-membros. Os atrasos
sucessivos que o país acumula com a organização resultam em escassez de
recursos materiais para investimento em programas essenciais para a comunidade
internacional, tais como os de auxílio ao desenvolvimento (PNUD) e de proteção
ao meio ambiente (PNUMA).
O Conselho de Segurança
É o órgão da
Organização das Nações Unidas que discute e decide sobre assuntos relacionados
aos conflitos armados e à segurança do mundo. Ele é composto de 15 membros,
sendo que apenas cinco são permanentes e possuem direito a veto: Estados
Unidos, Federação Russa, China, Grã- Bretanha e França.
Na década de 1990
foi lançada uma ampla discussão sobre a reforma do Conselho de Segurança das
Nações Unidas. Desde então, em compasso com a nova ordem econômica e política
do mundo, o Japão e a Alemanha, potências derrotadas na Segunda Guerra Mundial,
aspiram (desejam) a se tornarem membros permanentes, assim como países
subdesenvolvidos de grande expressão econômica e estratégica, tais como Índia e
o Brasil.
As propostas de
reforma, porém, esbarram na resistência dos Estados Unidos e, também, na
ausência de consensos regionais. De um lado, os Estados Unidos temem um
Conselho de Segurança mais democrático e ainda mais difícil de controlar do que
o atual. De outro, países como o Paquistão e a Argentina não enxergam com bons
olhos a perspectiva de consolidação da liderança regional da Índia e do Brasil,
respectivamente.
A segunda ofensiva
norte-americana ao Iraque, iniciada em 2003, ocorreu à revelia (ao acaso) do
Conselho de Segurança. A China, a França e a Federação Russa se opuseram à
operação. Assim, o Conselho de Segurança foi desrespeitado pela maior potência
do mundo.
Em maio de 2005, o
Brasil, a Alemanha, a Índia e o Japão apresentaram uma proposta de expansão do
Conselho de Segurança da ONU. Estes quatro países, conhecidos como G-4,
reivindicaram assento permanente no Conselho de Segurança da ONU para eles e
para mais dois países do continente africano (escolhidos posteriormente).
Entretanto, todos os atuais membros do Conselho de Segurança, com exceção da
França, se pronunciaram contra a proposta. Os Estados Unidos, por exemplo,
defende que a reforma do Conselho de Segurança ocorra desde que os novos
membros, quaisquer que sejam eles, abram mão do direito de veto, que
continuaria prerrogativa exclusiva dos cinco membros permanentes originais. A
Argentina e o Paquistão se pronunciaram contra a candidatura do G-4, pois não
aceitam a liderança regional dos seus vizinhos (Argentina – Brasil e Paquistão
– Índia).
Os Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio
Em uma reunião
histórica, realizada em setembro de 2000, a ONU apresentou um amplo programa de
metas orientadas para reduzir a pobreza no mundo até 2015. Trata-se dos oito
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM):
1.
Reduzir a pobreza extrema e a fome;
2.
Assegurar o ensino fundamental para todas as crianças do mundo;
3.
Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres;
4.
Reduzir a mortalidade infantil;
5.
Melhorar a saúde materna;
6.
Combater as principais doenças epidêmicas;
7.
Assegurar um meio ambiente sustentável e;
8.
Estabelecer um mecanismo mundial de auxílio ao desenvolvimento.
Os Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio procuram assegurar a satisfação universal das
necessidades humanas básicas, principalmente nas áreas de saúde, educação,
ambiente e a promoção da melhoria da qualidade de vida da população mundial.
Para cada um dos sete primeiros OMD, foi estabelecido um conjunto de metas
específicas.
Analise a tabela
“Para onde vai o dinheiro do mundo?” na página 20 no caderno do aluno. A
persistência de parcelas da população mundial que não são atendidas em suas
necessidades básicas não é conseqüência de falta de recursos, mas das decisões
tomadas pelos países ricos sobre como despendê-los. Afinal, os gastos com
armamentos, publicidade, cosméticos e guerras são, muitas vezes, superiores aos
gastos necessários para melhorar a qualidade de vida das populações mais pobres
do mundo.
7.
A Organização Mundial do Comércio (OMC)
Os
objetivos dessa situação de aprendizagem são:
- apresentar o
contexto de surgimento e os mecanismos de funcionamento da OMC;
- sensibilizar
para o assunto e apresentar, em traços gerais, os principais eixos
estruturantes dos fluxos internacionais de mercadorias;
- analisar os
fluxos de comércio mundial, de forma a iluminar a correspondência entre
desenvolvimento econômico, competitividade e controle sobre os mercados
mundiais e;
- abordar o
sentido e o resultado das rodadas de liberalização do comércio mundial
encabeçadas pela OMC.
A
Organização Mundial do Comércio (OMC) tem sua origem no Acordo Geral Sobre
Tarifas e Comércio (GATT, pela sigla em inglês), assinado por 23 países em
1947. O objetivo principal era diminuir as barreiras que a maior parte dos
países impunha ao comércio internacional, facilitando os fluxos
internacionais. No entanto, os produtos de interesse dos países pobres,
especialmente os dos setores agrícolas e têxteis, foram desde logo sujeitos a
regras especiais e não foram liberalizados.
Em
1995, O Acordo Geral de Comércio e Tarifas (GATT) se transformou na Organização
Mundial de Comércio (OMC), que atualmente conta com 148 países membros
(responsáveis por 97% do comércio mundial) e continua com o propósito de zelar
pelo livre comércio, evitando as taxas alfandegárias exageradas e o
protecionismo. Com a criação da OMC, os setores agrícola e têxtil entraram na
arena das rodadas de liberalização.
Desde
a sua criação, a OMC encarrega-se de estabelecer regras para o comércio
internacional e buscar a solução de controvérsias entre os países membros, mas
muita gente considera essas regras injustas, pois elas são iguais para todos,
independentemente de seu grau de desenvolvimento e competitividade. Assim, os
países ricos, detentores das tecnologias mais avançadas e, por isso mesmo, mais
competitivos, tendem a ampliar o controle que já exercem sobre os mercados
mundiais.
Um
dos sinais mais claros do desenvolvimento econômico é o controle de uma
parcela do mercado mundial. A repartição desse mercado entre os países é extremamente
desigual. Os países industriais centrais controlam mais de 70% das exportações
mundiais, deixando, portanto, menos de 30% das exportações para todos os demais
países juntos. Sozinha, a UE (União Européia) tem quase a metade das exportações
mundiais e o G-7 (grupo dos sete países mais ricos do mundo, formado por
Grã-Bretanha, Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão e Estados Unidos)
tem um pouco mais da metade. O comércio entre as zonas subdesenvolvidas é muito
pequeno. Assim, a maior parte do comércio internacional é realizada entre
os países ricos, e um dos motivos é o controle que eles exercem sobre as
tecnologias avançadas, que garantem maior produtividade às economias, e o
controle que têm sobre os mercados mundiais.
A
maior parte dos países busca proteger seu mercado interno, erguendo barreiras à
importação de mercadorias. As barreiras protecionistas, na forma de tarifas e
regras específicas, incidem sobre as mercadorias importadas; assim, a maioria
dos países busca proteger seu mercado interno.
As desigualdades
no comércio mundial
O
comércio mundial está estruturado em torno de três polos: Europa, América do
Norte e Ásia/Oceania. Isso mostra o domínio que os países ricos exercem sobre o
comércio mundial. As Américas do Sul e Central e a África ocupam posições
marginais, com um fluxo relativamente reduzido de importações e exportações.
O mercado
mundial do algodão
A participação
dos países pobres nos fluxos do comércio internacional é, em grande parte,
limitada pela baixa produtividade das economias e pela escassez de tecnologias
disponíveis. Entretanto, no mercado de produtos agrícolas, existe um outro
fator que pesa fortemente contra o conjunto dos países pobres exportadores de
alimentos: os subsídios agrícolas concedidos aos produtores dos países ricos.
Subsídio é a ajuda em dinheiro ou de outra ordem, como descontos em impostos,
dada a qualquer empresa ou a particular. Em conjunto, os países desenvolvidos,
em especial os países membros da União Européia e os Estados Unidos,
concedem cerca de US$ 315 bilhões anuais em subsídios agrícolas, quase um
quarto do PIB brasileiro ou três quartos do PIB argentino. Isso significa que
o governo remunera os agricultores, que assim, podem comercializar seus
produtos por preços inferiores ao custo de produção. Nestas condições, a concorrência
se torna muito difícil.
Com
o surgimento da OMC e das rodadas multilaterais de negociação, a redução dos
subsídios agrícolas finalmente entrou em pauta. Entretanto, elas têm
fracassado sistematicamente, principalmente devido à insistência dos EUA e da
União Européia em subsidiar seus produtores. O gráfico “Subsídios agrícolas na
Europa e nos Estados Unidos 1999-2004”, na página 24 do caderno do
aluno, pode dar uma idéia da dimensão destes subsídios. Os subsídios
agrícolas têm efeitos perversos para os países pobres, que dependem das
exportações dos seus produtos da agricultura.
8. O Fórum Social
Mundial
Os objetivos desse
capítulo são:
- apresentar as concepções que
embasam o Fórum Social Mundial;
- apresentar o sentido das práticas
sociais que sustentam a idéia de que “um outro mundo é possível”;
- dialogar propostas que defendam a
democratização da informação e;
- conscientizar a participação da
sociedade civil como pilar para a construção deste “outro mundo”.
O Fórum Social
Mundial, cuja primeira edição ocorreu em 2001, em Porto Alegre, não é uma
entidade ou uma instituição, mas um espaço de debate e de troca de experiências
que articulam movimentos sociais, organizações não-governamentais e
representantes da sociedade civil (pessoas comuns) do mundo todo para propor
alternativas ao domínio que o capital e as grandes corporações exercem sobre a
vida dos países e povos do mundo. Trata-se, portanto, de uma proposta
inteiramente nova de articulação da sociedade civil, que independe das
instâncias governamentais tradicionais e proclama a idéia de que “um outro
mundo é possível”, socialmente mais justo e menos atrelado aos interesses
hegemônicos que comandam a globalização contemporânea.
Alguns objetivos
desse Fórum são adoção de práticas ambientalmente sustentáveis, eliminação da
pobreza, universalização do acesso à educação e à informação, entre outros.
A última edição do
Fórum Social Mundial aconteceu em 2009, na cidade de Belém, Pará. A democratização
da informação, o combate à pobreza e à exclusão social e a busca por um modelo
de desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente responsável estavam na
pauta.
3º BIMESTRE
9. As populações e
o espaço geográfico
Quando nos referimos
às coletividades humanas, usamos diversas palavras. Ao mencionar a palavra
população (humana), o sentido imediato é quantitativo: população quer dizer
volume de pessoas; em julho de 2009, população mundial significava 6,8 bilhões
de pessoas.
O estudo
quantitativo das populações é uma das atribuições da demografia, mas ao
relacionar as populações ao espaço onde elas se distribuem, na verdade onde
elas se concentram, entramos no horizonte da Geografia das Populações. Os
grupos humanos não são apenas volumes estatísticos. É bom não esquecer a
complexidade que cerca a vida humana no planeta e não há resposta fácil às
perguntas quantitativas. Por exemplo: Quantos habitantes você acredita que há
no mundo hoje? Você considera esta quantidade grande ou pequena? Por quê? Em
sua opinião, qual deveria ser a população ideal do mundo? Nenhuma dessas
respostas pode prescindir (recusar) de análises de situações que envolvam
diversas variáveis; em especial, é preciso uma resposta que articule população
e espaço geográfico.
Nas grandes
cidades, os congestionamentos de automóveis, as filas nas quais pessoas
aguardam um serviço, o número elevado de desempregados e a multiplicação do
número de moradias precárias são problemas sociais dos quais já tomamos
conhecimento e assim, percebemos a presença comum de um elemento quantitativo:
- congestionamento – volume elevado
de automóveis;
- fila – uma espécie de
congestionamento de pessoas;
- número elevado;
- multiplicação.
E
aqui é provável que surja um poderoso senso comum: esses problemas teriam como
razão fundamental o fato de que há “muita gente no mundo” ou algumas
alternativas parecidas como “muita gente na cidade”, “os pobres têm muitos
filhos” etc. Levamos muito a sério o senso comum que os problemas se devem à
existência de “muita gente no mundo”. E é compreensível que assim o seja, em
especial no mundo contemporâneo. Afinal, as sociedades modernas se caracterizam
pela existência de grandes grupos populacionais vivendo juntos, nas mais
simples práticas cotidianas. É só observar os índices de freqüência nas praças
esportivas de futebol, por exemplo: números como 80 mil pessoas ou mais são
freqüentes.
Problematizando: há muita gente no
mundo?
- Referências para medir, para
quantificar: Qual a referência para afirmar que há muita gente, ou que havia
pouca gente no mundo? Gente demais é uma medida que deve se relacionar a algo,
o que não parece acontecer quando se enuncia esse senso comum. Logo, a
afirmação “há gente demais no mundo” só terá força de fato se houver relações a
se estabelecer.
- O combate à mortalidade: o Rei
Henrique VIII, da Inglaterra, que viveu entre 1491 e 1547, teve seis filhos com
Catarina de Aragão. Apenas uma menina sobreviveu à primeira infância. Isso com
um rei todo-poderoso. O grande problema eram as doenças infectocontagiosas, que
hoje se sabe combater. Logo, o controle das doenças é um fator de crescimento
populacional. Resolvemos um problema que ameaçava a humanidade e essa resolução
gerou outros problemas agora relacionados ao excesso de gente. Faz sentido?
- Desigualdade na distribuição
populacional: a distribuição da população é desigual no interior dos blocos
continentais. Há grandes vazios populacionais. Então, há um número elevado de
pessoas nos locais de concentração, por exemplo, nas grandes cidades. Um bom
exemplo é a cidade de Tóquio, a maior delas: nenhuma outra metrópole do mundo
consegue tanta eficiência na circulação de sua população e nela há o maior
volume de gente concentrada.
- População e desenvolvimento social:
no Paquistão, o adensamento populacional (número de habitantes por km2)
é de 227 hab./km2. Já na Holanda essa densidade é de 409 hab./km2.
Logo, tendo em vista esse resultado a Holanda é mais povoada. Tem mais gente
proporcionalmente ao tamanho do seu território. No entanto, qualquer que seja a
comparação entre índices que medem qualidade de vida, a Holanda leva vantagem.
Assim, o número menor de habitantes por km2 não parece aqui,
ser a questão decisiva.
A
esses exemplos de problematização podem ser acrescentados outros. O que será
necessário para que afirmações sobre a população mundial façam sentido? Afinal,
podemos medir a população sob múltiplos aspectos, mas que conclusões podem ser
tiradas dessas medidas?
A população mundial
está concentrada em alguns pontos, e não dispersa pelo planeta. E isso pode ser
detectado já no início da era cristã e muitos desses principais centros de
povoamento são os mesmos de antigamente. Se há gente demais no mundo e isso
causaria problemas, não parece haver uma contradição enorme e de fundo com um
dado da Geografia das populações: o modo de o ser humano viver é se
concentrando, aglomerando-se?
O ser humano busca
viver em meio a muita gente. Tanto é assim, que se constroem centros de grande
concentração – eliminando a distância geográfica – que nada mais são do que as
cidades, as grandes cidades especialmente. Agora se encontrou um parâmetro, uma
referência, para avançar na discussão sobre a população ideal do mundo?
Seguramente
encontrou-se uma lógica na forma de produção e organização dos espaços humanos:
os seres humanos vivem juntos, concentram-se preferencialmente. Espalhar-se,
criar distâncias entre seus membros, não foi e não é a lógica dominante de vida
entre as populações humanas. Pelo menos, desde o período Neolítico da história
humana. Nós formamos centros de densidade demográfica que são parâmetros para
discutir medidas de população: a densidade demográfica relaciona volume
populacional e extensão territorial. Agora estamos em um dos caminhos para dar
sentido aos números populacionais. Esse caminho relaciona população e espaço
geográfico. Há muito que discutir a respeito dessa relação, em especial sobre a
escolha do ser humano em viver aglomerado. Porém, essa não é a única referência
para discutir a dimensão de um país e outros números populacionais.
10. As referências
geográficas e econômicas da demografia
A demografia não
vale por si só. Saber quais são os volumes populacionais e suas dinâmicas (o
ritmo de seu crescimento, índices de natalidade e mortalidade, estrutura de
idades – envelhecimento e rejuvenescimento) são informações sem dúvida muito
importantes. Mas, sozinhas, elas pouco significam.
Para lhes dar mais
sentido é preciso saber as condições geográficas dos territórios onde se
encontram os volumes populacionais. Por exemplo: se a população estiver em sua
maioria nas cidades ou se estiver no campo, as diferenças na vida e nas
condições sociais serão enormes. É preciso também conhecer as condições
econômicas: é comum se encontrar casos de grandes populações mais bem
protegidas, pois têm acesso à moradia, à alimentação, assim como é igualmente
comum encontrar populações pequenas sofrendo enormes carências.
Nesse tema, a
prioridade será trabalhar as referências concretas que dão sentido aos números populacionais:
as condições dos espaços geográficos e da economia. Vale ressaltar que outras
dimensões da vida humana (cultura, regime social, política) também contribuem
para dar sentido aos números populacionais. E é sempre oportuno lembrar-se
disso.
As relações complexas da população
com o espaço geográfico
Por si só, a
evolução do crescimento da população mundial tem vários aspectos que chamam
muito atenção. Observe o gráfico “População mundial” da página 14 no caderno do
aluno; ele mostra que há 2.400 anos a população mundial era de 250 milhões de
habitantes e que após 1.900 anos (início do século XVI) essa população havia
apenas dobrado (500 milhões), e que em apenas 505 anos a população mundial
multiplicou-se 13 vezes, chegando ao número atual de 6.500 bilhões de
habitantes. Está visível, a curva do gráfico não engana: quanto mais nos
afastamos do passado mais a velocidade de crescimento populacional se acelera.
Algumas informações
complementares que dão a dimensão do que tem sido o crescimento populacional no
mundo:
- Somente no período entre 1980 e
1990 o número de pessoas no planeta aumentou aproximadamente 923 milhões. Esse
número é bem próximo da população total do mundo inteiro na época de Thomas
Robert Malthus (1766-1834), um economista sempre lembrado quando se discutem
números da população. Na época, ele não via como a humanidade conseguiria se
sustentar caso a população continuasse a crescer no ritmo de sua época, que era
bem mais lento do que hoje;
- Nota-se facilmente que em nossa era
os seres humanos se comunicam mais. Isso se deve, sem dúvida, ao
desenvolvimento dos meios de comunicação. Mas além desse fato, os homens estão
mais próximos uns dos outros pela singela razão de que há mais homens na superfície
terrestre. Se imaginarmos os homens igualmente distribuídos sobre as “terras
emersas habitáveis”, a distância entre duas pessoas há dois milênios era de 1
km. Hoje em dia, a distância seria menos de 150 metros. Uma distância ao
alcance da voz (GRATALOUP, 2007);
- Leia mais um item na página 15 do
caderno do aluno.
Que
relações os números da população e seu ritmo de crescimento têm com o espaço
geográfico? Até aqui foram observados e discutidos dois aspectos dessa relação:
- O ser humano produz de forma
dominante espaços concentrados (muita gente, muitos objetos e equipamentos,
muitas edificações) e a relação população e espaço deve levar isso em conta;
- Uma maneira razoável de se captar
isso é a relação entre o volume de população e a extensão territorial. E essa
relação é denominada densidade demográfica.
Mas
há outras relações estabelecidas entre população e espaço geográfico que devem
ser consideradas para se pensar de maneira qualificada na questão das
quantidades adequadas de população. Duas dessas relações básicas e imediatas,
dentre muitas possibilidades, são:
- o quanto a natureza suporta: vêm do
meio físico (que denominamos natureza), em especial do modo como ela se
manifesta na superfície terrestre, as condições para o ser humano construir
seus espaços e prover sua vida. Os recursos naturais, tal como diversos grupos
sociais os usam, são inesgotáveis? Qual a “carga” de seres humanos e de seus
engenhos (e modos de vida), que a natureza pode suportar, sem que surjam
problemas? E mesmo que a natureza ainda possa suportar muito de nossa ação
sobre ela, até que ponto se deve fazer isso, até onde é ético modificá-la?
Sobre esse aspecto, muitas outras interrogações podem e devem ser adicionadas;
- quais os espaços que são
habitáveis: um geógrafo do começo do século XX, Max Sorre, atualizou uma noção
dos gregos antigos sobre quais são os espaços que podem ser habitados. Esses
constituem, na designação dos gregos, o ecúmeno. Anecúmeno seria exatamente o
contrário: áreas que não podem ser habitadas. Diante da tendência humana de se
concentrar e também da extensão das terras emersas, há ainda, nesse sentido,
espaço a ser habitado. Mas, existem anecúmenos? Podemos habitar os desertos
quentes, como o núcleo do Saara? Ou a Antártida?
Agora
dois casos específicos de relação população e espaço, como exemplo, para
concluirmos. Leia os casos na página 18 do caderno do aluno. Comparando os dois
casos é certo que há um distanciamento crescente a favor da Ásia tropical na produtividade
agrícola. E aí um dado notável: é a Ásia, o continente mais densamente povoado,
que alimenta melhor sua população enquanto a África, com frágeis densidades,
experimenta dificuldades crescentes para alimentar sua população (BRUNET &
DOLLFUS, 1990). Podemos afirmar que na Ásia tropical não há gente demais,
embora a densidade demográfica da região seja alta, mas a população vive em
melhores condições de vida em termos de alimentação. Nas chamadas sociedades
desenvolvidas há mais gente nas cidades, mas ao mesmo tempo essas sociedades
possuem grande produção agrícola porque no campo de alguns países desenvolvidos
estão em vigência elementos do que se convencionou chamar de revolução verde
(referência ao impressionante aumento da produção agrícola na segunda metade do
século XX, marcado pelo uso intensivo de tecnologias – irrigação, máquinas e
implementos agrícolas, fertilizantes e agrotóxicos etc. – e pela monocultura,
produção intensiva de um único tipo de lavoura, redução do custo de manejo e
que obtém maior produtividade com menos mão de obra).
As relações complexas da população
com a economia
A
economia é uma atividade humana complexa. Em nossos dias, essa complexidade
aumentou tanto que ao cidadão comum tornou-se praticamente impossível
acompanhá-la. Economia é o conjunto de ações que o ser humano realiza para
resolver sua vida material (biológica, inclusive). Por exemplo, conseguir e
produzir alimentos para comer e sobreviver é o princípio absoluto das práticas
econômicas. Depois dela é que as outras podem vir.
Por
essa razão, a questão primeira, a mais básica, que envolve a relação “tamanho
das populações e economia” é a produção de alimentos. Se o tamanho de uma
população, num dado território, for maior do que a capacidade que essa
população tem de produzir alimentos, o que vai acontecer com ela? Malthus
afirmou, há dois séculos (1798), que a produção de alimentos vinha perdendo
terreno e prognosticou desastres terríveis resultantes do consequente
desequilíbrio “na proporção entre o aumento natural da população e os
alimentos”. Será que o medo dele era justificado? Numa corrida entre o
crescimento da população e a produção de alimentos, quem está ficando para
trás?
Não
há indícios que justifiquem (na escala do mundo) os temores de Malthus. Aliás,
ele estava redondamente enganado. Contudo, isso não significa que em certas
situações do passado, e mesmo em algumas do presente, a falta de capacidade de
produção de alimentos não tenha pesado no ritmo de crescimento populacional. É
só verificar quanto tempo a população se manteve no mesmo tamanho (veja o
gráfico novamente da página 14). Os números que aparecem na tabela “Índices de
produção de alimentos per capita segundo regiões”, da página 19 do caderno do
aluno, são índices estatísticos. Ela trata da produção de alimentos por pessoa
(per capita). É necessário destacar a coluna correspondente ao período
1979-1981. Ela foi transformada em base do índice e, por isso, todos os seus
números são 100,0. Nas outras colunas aparecem as variações para cima e para
baixo em relação a esse índice de 100,0. Quer dizer:
- variação para cima: produção de
alimentos por pessoa aumentou, ou era mais alta;
- variação para baixo: produção de
alimentos diminuiu, ou era mais baixa.
Vamos
analisar o caso particular da África: há crescimento na produção por pessoa em
todos os continentes e países citados, menos na África, inclusive nos
continentes mais povoados atualmente. Para finalizar: a produção e o consumo de
alimentos por pessoa são hoje consideravelmente maiores que no tempo de
Malthus, o que ocorreu junto com uma grande elevação nos padrões gerais da
vida. Não existe na realidade nenhuma crise significativa na produção mundial
de alimentos. A taxa de expansão dessa produção evidentemente pode variar, mas
a tendência de crescimento é bem clara. Há gente demais no mundo?
Rizicultura inundada: plantação de
arroz em terreno encharcado de água;
Técnicas hidráulicas e irrigação:
sistemas e técnicas para acesso a água na produção agrícola.
11. Populações:
perfil interno, desigualdades, migrações internacionais
Lembramos
anteriormente que a palavra população nos remete para o quantitativo: volume de
pessoas. A dinâmica do crescimento populacional e o modo como ela se distribui
podem ser captados pelas técnicas estatísticas. Elas funcionam como ponto de
partida para entender a vida humana no planeta, e não como ponto de chegada.
Para além das medidas, há muita complexidade a ser compreendida. Para se ter
dimensão do quanto há para ser compreendido, a própria estatística pode ampliar
seu olhar e mergulhar em aspectos internos dos perfis da população. Outras
medidas da população vinculadas à organização geográfica aprofundam nosso
entendimento da Geografia das populações. Em especial, porque por esse meio
podem ser identificados padrões populacionais que vão contribuir para se
entender uma série de questões relevantes e difíceis na vida das sociedades
contemporâneas.
Nesse tema vamos
sugerir e indicar alguns caminhos possíveis para confrontar o perfil interno
das populações e identificar certos padrões que estruturam as desigualdades
existentes entre as populações dos países, das regiões e entre a população
interna de um único país. Para abordar o tema das populações no mundo atual, um
bom recurso é expor ditos muito repetidos, tratados como verdadeiros. Um
exemplo comum é a afirmação de que há gente demais no mundo, o que já se
discutiu levando-se em conta as variáveis presentes na relação da população com
o espaço e a economia (e outras dimensões do social). Aproveitando a
oportunidade desse comentário, temos mais um senso comum: o Brasil é um país
jovem, por isso um país do futuro. A primeira afirmação se refere à nossa curta
história após a chegada dos portugueses (500 anos). Essa nossa juventude
justificaria as dificuldades socioeconômicas do Brasil. Mas, isso é bastante
duvidoso visto que nos EUA, que possuem a mesma curta história, há uma
realidade socioeconômica bastante distinta da brasileira. Quanto a segunda
afirmação, que é a que serve para explorar a questão demográfica, o senso comum
se refere ao Brasil como país jovem utilizando como referência o fato de a
nossa população ter um número elevado de crianças e jovens. E isso seria algo
que nos dá uma vantagem, que nos indica um futuro melhor. Pensar nesta questão,
coloca-nos no centro das discussões mais importantes sobre a dinâmica das
populações e sobre as questões do desenvolvimento.
As desigualdades entre as populações
do mundo
Será
que o perfil interno das populações dos países mais ricos se assemelha ao
perfil das populações dos países mais pobres? Será que há padrões, quer dizer:
países desenvolvidos teriam uma estrutura populacional própria e os menos
desenvolvidos também teriam seu padrão? Observem os mapas ”Mundo: população com
menos de 15 anos “ e “População com mais de 60 anos” na página 23 do caderno do
aluno: eles apresentam o mesmo fenômeno, a idade das populações (estrutura
etária). A diferença é que um representa a população infantil (até 15 anos) e o
outro a população idosa (acima dos 60 anos). Em ambos os mapas os dados formam
classes, e são números relativos (em percentual), não absolutos. O mapa é a de
distribuição da população infantil no mundo e mostra visualmente as áreas de
maior população contrastando com as de menor, numa seqüência ordenada. Para
representar visualmente essa ordem – que vai dos que têm mais aos que têm menos
– foi utilizada a seqüência de cores quentes (vermelho, laranja) para cores
frias (verde). Visualmente, essa ordem não faz sentido, pois a única maneira de
entender o que o mapa representa é consultando a legenda. No mapa de população
idosa foram utilizadas as tonalidades de uma única cor. Onde a tonalidade é
mais escura (maios intensidade de pigmentos), maior é o percentual de idosos e
onde a tonalidade é mais clara, o contrário. Sem dúvida o mapa de população
idosa consegue uma comunicação mais eficiente. A ordem dos dados é representada
por uma ordem visual das tonalidades de uma única cor, enquanto a ordem de
cores apresentada no primeiro mapa (população infantil) não é uma ordem visual
natural, e sim uma escolha arbitrária, baseada na lógica das cores frias e
quentes. Por exemplo: para qualquer observador, o vermelho, o laranja, o
amarelo e o verde representam visualmente cores diferentes, sem dar sensação de
mais ou menos intensas. Logo, não criam, juntas, uma ordem. No caso do mapa de
idosos, para perceber a lógica geográfica do fenômeno representado, nem é
preciso a consulta da legenda, pois o observador perceberá onde o fenômeno é
mais intenso e onde o fenômeno é menos intenso. Um bom critério para resolver
sobre a eficiência dos dois mapas é perguntar “qual mapa consegue responder
visualmente, de forma mais rápida onde se concentram os maiores índices da
população na faixa de idade representada?”
Analisando
esses mapas, vocês terminam tendo uma visão correlacionada entre a distribuição
da população de idosos e a população infantil e vai notar uma coincidência
invertida que pode ser expressa nos enunciados: países com maior população
idosa têmmenor população infantil e; países com menor população
idosa têm maior população infantil. Se listarmos os países e
as áreas extremas das duas situações: mais idosos e mais população infantil. O
que acontece nas situações intermediárias, por exemplo, no caso do Brasil? Se o
Brasil está numa posição intermediária em relação ao volume de população
infantil, isso significa que ele também está numa posição intermediária à
população idosa? Existem, de grosso modo, três grandes padrões no perfil
populacional, em termos de idade (veja tabela na página 24 do caderno do
aluno). Por exemplo, existe um padrão na Europa ocidental que está presente em
vários países vizinhos e que o mesmo se dá, em alguma medida, na América do
Sul. Mas os países não estão condenados a permanecer com esses padrões
populacionais: os países do padrão 3 já tiveram uma situação semelhante aos de
padrão 1. Aliás, na altura do século XVIII todas as populações estavam próximas
ao padrão 1 (muita população infantil e baixa população idosa). O regime
demográfico era marcado por fortes natalidade e mortalidade. Atualmente os
países do padrão 3 são aqueles onde nascem poucas pessoas e a vida se estende
bastante. Pode-se dizer que o padrão 1ao padrão 3 houve uma transição
demográfica, que de certa maneira vem atingindo as populações em geral. O
Brasil recentemente encontrava-se no padrão 1, mas se pode dizer que ele se
encontra atualmente no padrão 2. Essa transição demográfica está em constante
andamento, mas não mudam naturalmente, tanto que a situação do padrão 1 se
manteve por grande parte da história humana. Mudanças na organização social têm
relação direta com a transição demográfica: o progresso econômico e as ações
sanitárias fizeram baixar a mortalidade e propiciaram o enorme crescimento da
população mundial. Outras mudanças nas estruturas sociais (o que inclui o
espaço geográfico) e no comportamento dos indivíduos serão responsáveis pela
queda da natalidade que num futuro não tão distante irá estabilizar o
crescimento populacional.
Dessa
identificação dos padrões populacionais e de sua dinâmica (transição
demográfica) é importante destacar a seguinte afirmação: os padrões populacionais
não são independentes das condições sociais (econômicas, geográficas,
culturais, políticas etc.). Essa constatação é um portal para se ingressar na
complexidade da vida humana no planeta. Demonstrações muito conhecidas e
objetivas confirmam a relação padrão populacional e condições sociais. Vamos
confrontar os padrões populacionais (1, 2 e 3) com as condições apresentadas
nos mapas “Esperança de vida” e “Desigualdade de renda” da página 26 do caderno
do aluno que tratam da expectativa de vida no mundo e índice de desigualdade
econômica respectivamente. Os países de padrão 1 estão bem em termos de
expectativa de vida e de distribuição da riqueza? E o contrário, é verdadeiro?
Falta pensar nas conseqüências sociais dos padrões populacionais. Até aqui se
investiu em mostrar que as condições sociais interferem nos padrões
populacionais. E como os padrões populacionais interferem nas condições
sociais? Tendo bem sedimentado o que é o padrão 1 (uma grande parcela de
população infantil em relação ao total), precisamos pensar a respeito das
tarefas sociais que devem ser executadas para se conseguir boas condições
sociais num “país jovem”). O mundo do padrão 1 é também aquele de pior
expectativa de vida, de muitas desigualdades sociais, países e regiões pobres.
Certas situações semelhantes são encontradas nos países de Padrão 2, como no
caso do Brasil. Vamos ler um texto na página 27 do caderno do aluno. O
envelhecimento da população também é, obviamente, uma conquista social, pois
está associado ao aumento da expectativa de vida. Mas coloca uma questão
importante num país como o Brasil: não sabemos conviver com esse novo fenômeno
e é preciso aprender. São vários os aspectos que devem ser notados:
- o Estado brasileiro está pouco
preparado, e a discussão a respeito não tem sido feita de forma realista e
criativa para arcar com as obrigações financeiras das aposentadorias;
- novas estruturas precisam ser
providenciadas no campo da saúde e da assistência ao idoso sem família. Elas
não são baratas, mas são indispensáveis;
- as cidades devem contemplar em suas
políticas urbanas uma série de serviços e meios para dar condições dignas de
vida aos idosos. O espaço geográfico das cidades deve ser preparado para a
plena locomoção do idoso e todos os cidadãos ganharão com isso. Eles não podem
ficar confinados em suas casas e abrigos. Não podem ficar apartados da vida
social e, na medida do possível, devem ter vida privada e individual;
- é preciso combater os preconceitos
sociais que vitimam os idosos, que tratam a velhice como doença, como um estado
de alienação e incapacidade.
Mas
nosso aprendizado já começou. Em 1º. de outubro de 2003, entrou em vigor a Lei
no. 10.741, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso. Somente a lei não basta, mas
ajuda muito. Vamos ler o trecho inicial dessa lei na página 28 do caderno do
aluno.
O impasse das migrações
internacionais
Entender
o povoamento de uma região implica conhecer algo muito importante na dinâmica
atual: os movimentos migratórios. O ser humano não nasce, vive e morre no mesmo
lugar, necessariamente. Se isso não era verdade para quase todo mundo no
passado, hoje a situação se inverteu. O ser humano vem se construindo como um
ser móvel (tem aumentado sua mobilidade) e, em função dessa nova condição e
outras mudanças sociais, sua vida se desenvolve com outras possibilidades
geográficas: ele pode nascer num lugar e viver em vários lugares diferentes: o
ser humano pode migrar. Os movimentos migratórios estão na origem e formação,
por exemplo, dos países das Américas. O século XX foi um período dos maiores
movimentos migratórios, com esses movimentos atingindo escala mundial, o que a
imigração japonesa para o Brasil exemplifica.
Atualmente, a
mobilidade humana atingiu potenciais inimagináveis: pode-se ir de um extremo a
outro da Terra com extrema velocidade, o que abrevia o tempo necessário para
percorrer as distâncias (24 horas de vôo). E de fato, mercadorias e informações
circulam em grande quantidade e cada vez mais livremente no planeta. Mas será
que o mesmo pode ser dito dos seres humanos, das migrações? Vamos ler duas
afirmações sobre na página 30 do caderno do aluno. A contradição fica maior se
levarmos em conta que atualmente, pelo menos tecnicamente, é mais fácil
imigrar, a mobilidade humana é maior, as distâncias não são mais
intransponíveis etc.
Vamos analisar
alguns sistemas migratórios contemporâneos na página 30 do caderno do aluno:
- o primeiro item do quadro diz
respeito a uma referência geral, diz respeito à escala mundial;
- é fácil perceber e concluir que as
migrações mencionadas têm uma direção social: dos países pobres para os países
ricos;
- no caso dos outros grupos, o fluxo
é regional (de escala regional);
- no fluxo América do Sul e Central
para os EUA, há sérios problemas, pois boa parte dessa imigração é ilegal, os
imigrantes correm grandes riscos para atravessar as fronteiras dos EUA e, se
bem-sucedidos, continuam correndo riscos na sua futura vida.
12. Populações e
cultura: mundo árabe e mundo islâmico
Os volumes
populacionais contêm internamente uma complexidade que as estatísticas nem
sempre apreendem. As características sociais dos grupos populacionais, assim
como as condições econômicas, as formas de organizar e operar a partir do
espaço geográfico e as práticas culturais, interferem na lógica de
funcionamento das populações, inclusive no seu crescimento e distribuição
geográfica. Nesta etapa vamos destacar um dos aspectos relevantes no
funcionamento das populações: suas práticas culturais. O caso que servirá de
ilustração refere-se ao mundo árabe e islâmico. As práticas culturais
constituem-se como elementos que produzem diversidade entre as populações e
diversidade nos comportamentos.
Por outro lado,
olhar a dinâmica das práticas culturais, suas influências, o modo como se
expandem, nos auxilia também a compreender a própria dinâmica de povoamento das
várias regiões do planeta e a dinâmica das relações contemporâneas entre os
povos.
Há uma série de
referências geográfico-culturais para a divisão regional do globo: Mundo
ocidental, Oriente Médio, Extremo Oriente, Mundo cristão, Mundo árabe e Mundo
islâmico (o Islã). A intenção é delimitar mundos à parte, mundos próprios,
mundos diferentes. Em geral, sobre os “outros mundos” criam-se muitas
fantasias. O que vocês entendem da definição “outros mundos”? Por exemplo: Qual
o tamanho do mundo cristão e como ele se construiu? Essa prática religiosa –
elemento central de nossa cultura – surge no Oriente Médio e sua configuração
geográfica atual é muito mais larga e expandida. Refletir sobre nossa própria
realidade é um bom estímulo para refletir sobre a realidade do outro, até para
perceber que o outro não é tão outro assim.
A lógica expansionista do islamismo
Observe
alguns dados relativos às práticas religiosas da população mundial, comuns
quando se discutem questões populacionais e alguns aspectos da lógica
geográfica: há no mundo atual cerca de 2 bilhões de adeptos do cristianismo, o
segmento religioso com o maior número de seguidores. Em segundo lugar, vamos
encontrar o islamismo (muçulmanos ou maometanos), com 1,3 bilhões de adeptos.
Depois aparecem: o hinduísmo (900 milhões), a religião tradicional chinesa (394
milhões) e o Budismo (394 milhões). Essas são as principais, mas existem muitas
outras.
Que
populações praticam essas principais religiões? De que países elas são? As duas
maiores religiões são multinacionais (cristianismo e islamismo). São praticadas
em vários países; as outras religiões são mais circunscritas a um único país
(hinduísmo na Índia; tradicional chinesa na China).
É
costume referir-ser ao mundo cristão e ao mundo islâmico (o Islã). Mundo é mais
que país. Quer dizer: nessa realidade e nessa forma de se expressar, está
embutida a idéia que o cristianismo e o islamismo são religiões expansionistas.
Afinal de contas, China e Índia possuem as maiores populações e seria de se
esperar que as religiões que essas populações praticam fossem as maiores do
mundo. Mas não são. Perdem para aquelas religiões que são praticadas em vários
países ao mesmo tempo. Seria interessante agora ver qual a distribuição
geográfica do islamismo. Será que ele está bem distribuído no planeta? Os
países com maiores populações islâmicas são Indonésia, Índia, Paquistão,
Bangladesh, Egito, Turquia, Irã e Nigéria. Uma pequena lista dos países que
possuem as maiores populações muçulmanas (página 34 do caderno do aluno), com
dados divulgados pela CIA (norte-americana), pode começar a responder esta
questão. Observe esta lista tendo como apoio de um atlas, para situar geograficamente
os países citados.
Numa
comparação com o número total de islâmicos no mundo (1,3 bilhões) nota-se que
nesses oito países encontram-se aproximadamente 68% dos muçulmanos do mundo.
Islâmicos e muçulmanos são designações a respeito de uma prática religiosa
associada aos árabes porque a origem do islamismo ocorreu entre os povos
árabes. Seu profeta foi o árabe Maomé. E foram os povos árabes que difundiram e
expandiram as áreas onde se pratica o islamismo. O território habitado pelos
povos árabes é o que se chama de península arábica. Esses povos, em função de
sua história ao longo do tempo, construíram vários países (Arábia Saudita, Omã,
Emirados Árabes Unidos, Kwait, Egito, Síria, Territórios Palestinos etc.).
Houve também uma expansão dos próprios árabes para o norte da África,
abrangendo o Iêmen do Sul e do Norte, Líbia, Marrocos, Tunísia. Enfim, todos
são árabes, não apenas os da Arábia Saudita. Na lista dos oito países que têm
mais população islâmica, apenas o Egito é um país árabe mais populoso. Os
países árabes terminam não sendo muito populosos, entre outras razões, pela
condição de seus territórios dominados por um grande deserto. Os árabes, na
verdade, representam apenas 1/5 dos muçulmanos do mundo. Mas, o islamismo, que
é criação árabe (e que em si já possui muitos elementos da cultura árabe
propriamente dita), é o principal fenômeno de identidade cultural de uma vasta
região que inclui o Paquistão, o Afeganistão, Bangladesh, Irã, que constituem
uma espécie de Oriente Médio expandido. Isso, mais imediatamente, mas como os
dados mostram, essa influência chegou ao oeste da África e ao leste asiático
(Filipinas e Indonésia).
Nos
territórios árabes não se encontra a maioria da população islâmica, apenas 1/5.
Será então que a civilização árabe ficou menos importante no mundo islâmico? A
resposta é não, muito pelo contrário. Nem tudo que é ligado aos grupos
populacionais humanos depende da quantidade. O centro do Islã é ainda a
civilização árabe. O território árabe e a cidade de Meca (página 36 do caderno
do aluno) são as conexões geográficas para onde ainda todos vão e de onde tudo
partiu. Leia o texto “Como se expandiu o islamismo” na página 38 do caderno do
aluno.
No mundo católico cristão também não é assim? O Brasil é o país católico
mais populoso, mas não é aqui o centro principal dessa prática religiosa. O
centro principal está na Itália (Vaticano).
4º BIMESTRE
13.
Espaços relacionais, espaços de conexão
Quais
os significados e os efeitos sociais da configuração espacial que é a cidade?
As cidades são espaços relacionais por excelência, nas quais se produziu e se
produz o fundamental dos elementos estruturadores do mundo moderno, incluindo
o campo da cultura, em seu sentido mais amplo. Não são apenas espaços que
promovem relações no seu interior, mas que conectam seus habitantes a redes
sociais de outra escala geográfica, com outras cidades, com outras culturas,
com o mundo.
Nas
cidades, os seres humanos aglomeram-se e diminuem as distâncias entre si, mas,
ao mesmo tempo, conectam-se e associam-se a espaços distantes. Elas são,
portanto, a antítese do isolamento geográfico. Vamos estudar as
características essenciais das cidades, em especial as das grandes cidades.
O
que é uma cidade? É comum encontrarmos dificuldade para discursar a
respeito. Sobre cidade, vive-se o mesmo impasse que o filósofo católico Santo
Agostinho (354-430) mencionava quando o tema era o tempo. Dizia ele
algo assim: "O tempo... se não me perguntam sei o que é, mas se me perguntam...
já não sei mais".
Normalmente,
esse tipo de situação ocorre quando estamos diante de fenômenos que, de tão
presentes em nossas vidas, não são mais alvo de nossa atenção, porque
evidentemente já o conhecemos. Isso ocorre com o tempo, com o espaço, com o
rural, com o urbano e com a cidade, por exemplo. Mas o que sabemos?
E por que isso é importante? Porque, apesar de imersos nessa configuração
espacial que é a cidade, muito dos seus sentidos e de sua força em nossa vida
escapa de nossas consciências. É provável que pensam palavras e expressões
como: concentração, aglomeração, muita gente junta, lugar que tem muitas
coisas, lugar que tem confusão etc. Na
maioria delas, há um componente espacial: concentração, muita gente e
objetos em direção a um centro, a um único ponto do
espaço; aglomeração tem o mesmo sentido; muita gente junta,
lugar que tem muitas coisas são formas comuns de se referir a aglomeração
e a concentração; lugar que tem confusão já é uma afirmação que avalia
o ajuntamento no espaço como algo difícil de ordenar, logo, a bagunça.
Concentração, aglomeração e ajuntamento são formas espaciais, maneiras
de se construir espaços, que diminuem a distância entre as pessoas e os
objetos, e são conceitos opostos à expansão, à dispersão e ao espalhamento,
que são ocorrências espaciais que aumentam as distâncias entre as pessoas e os
objetos. Uma questão pode ficar para reflexão dos estudantes:Não será essa
forma espacial, a concentração, a essência da cidade? Como a Geografia é
uma disciplina que volta sua atenção às lógicas espaciais que percorrem
nossas sociedades, ela tem a responsabilidade de trazer à luz do dia o que
essas lógicas escondem.
Abrindo a
caixa-preta das cidades
Observe
o mapa “Estado de São Paulo: cidades mais importantes”, na página 4 do caderno
do aluno, com suas principais cidades assinaladas. As várias bolinhas
pretasrepresentam o conjunto das cidades. A única diferente é a cidade de São
Paulo, que recebe destaque ao ser representada por uma bolinha preta com um
círculo em volta. Amaior concentração dessas bolinhas acontece nas
proximidades da capital e elas se dispersam em direção ao interior.
A
Geografia não mapeava os espaços internos das cidades, reduzia-os a bolinhas
pretas em mapas de outra escala, como o do Estado de São Paulo. Os mapas da
Geografia são dominantemente de escala geográfica regional, nacional ou
mundial, quer dizer, são mapas em que a maior parte da representação diz
respeito aos vazios demográficos, já que nessas escalas as cidades viram
bolinhas. Raramente se vê numa aula de Geografia, em atlas geográficos
escolares e nos livros didáticos mapas dos espaços internos das cidades. Os
espaços humanos mais complexos - centros geradores e comandantes da economia e
da cultura modernas e espaços de moradia da maioria da população - são
negligenciados pela Geografia e pela Cartografia. Assim, nega-se o acesso
direto às realidades geográficas que lhes são mais imediatas.
Agora,
observe os mapas das duas áreas metropolitanas mais
importantes do Estado: “São Paulo: região metropolitana”, na página 8 e 9 do
caderno do aluno, que está entre as maiores aglomerações do mundo de escala
local, e “Campinas: região metropolitana”, na página 10 e 11 do caderno do
aluno.
No
mapa de São Paulo, as manchas assinaladas em rosa, que incluem o município de
São Paulo, compõem a área urbana, cuja população, em 2007, era de cerca de 18,8
milhões de habitantes. O número de edificações, de infraestruturas urbanas, de
negócios diversos e de recursos culturais é imenso nessa grande metrópole que
é, em si, um mundo. Ser um mundo em si significa que, em sua relativa
pequena extensão espacial, há um máximo de concentração de população e de
objetos geográficos construídos pelos seres humanos.
Trata-se
de um mundo isolado geograficamente, ou ao contrário: seria vocação dessa
impressionante aglomeração humana a abertura e o relacionamento com os mundos
externos?
Essa
questão revela o potencial relacional de uma grande cidade e como esse gênero
de configuração espacial é decisivo para a compreensão da geografia do mundo
que vivemos, pois, para além do seu espaço interno, uma grande cidade estende
seus tentáculos - a metrópole de São Paulo, que soma vários municípios -, cria
imensas redes sociais, que, por vezes, alcançam a escala global.
Provavelmente,
ninguém entende uma grande cidade como um espaço isolado geograficamente, mas
certamente é necessário examinar com detalhes todos os elementos de uma grande
cidade, que comprovam sua articulação com regiões bem mais amplas.
Alguém,
em sã consciência, poderia entender que uma grande cidade teria uma população
composta apenas por pessoas nascidas em seu território? Como se poderia reunir
num espaço concentrado, de distâncias reduzidas, cerca de 18,8 milhões de
pessoas, como no caso de São Paulo (dados de 2007)? Ainda mais considerando
que, há 50 anos, essa população não ultrapassava 4 milhões de habitantes. O que
explica essa multiplicação acelerada da população? A migração de pessoas de
outras partes do Estado de São Paulo, do Brasil e do mundo é a principal fonte
do povoamento de uma grande cidade. Antes de tudo, toda grande cidade é uma
concentração de migrantes e imigrantes que, em geral, não perdem o vínculo com
suas localidades de origem (no mínimo se correspondem). Isso, por si só, já significa
ligações da cidade com outras sociedades e outros espaços. Já significa a
formação de redes sociais, inerentes a qualquer grande cidade.
No
quadro “Até onde vão as redes sociais e geográficas das grandes cidades”, na
página 12 e 13 do caderno do aluno, são apresentados algumas características de
uma grande cidade, por exemplo, São Paulo. Esses são 15 pontos que ajudam a
abrir um pouco a caixa-preta das cidades, em especial das grandes
cidades. Podem-se acrescentar vários outros ou organizá-los de diversas formas.
Eles servem de exemplo dos elementos geográficos de uma grande cidade que
exercem seu papel muito além do espaço local, da escala local.
Esse
quadro pode ser enriquecido com fatos concretos, usando diretamente uma cidade
real, como por exemplo São Paulo. Vejamos dois exemplos:
- Atividades
artísticas: a cidade pode sediar uma mostra internacional de cinema anual de
muito prestígio e festivais de música de vários géneros; tem uma estrutura
razoável de salas de cinema e de espetáculos e recebe espetáculos e artistas
do Brasil e do mundo rotineiramente; tem museus e exposições bem visitados,
inclusive recebe público que viaja com esse objetivo etc.;
- Poder
político: a cidade não é a capital do Brasil, mas é a maior e a mais influente
cidade do país. Alguns dos principais partidos que atuam na política nacional
têm origem na metrópole paulista, assim como algumas das principais lideranças
saíram dessa cidade (que vai além do município de São Paulo). Os interesses
formados nessa cidade costumam ter força política no quadro nacional.
Não
faz sentido afirmar que as cidades, em especial as maiores, são espaços
relacionais por excelência?
Cidades:
plataformas para a transição das escalas geográficas
O mesmo
quadro pode agora ser utilizado para avaliar outras
cidades. Se a cidade for média ou pequena, pode ocorrer algo semelhante aos
dois exemplos seguintes:
- Atividades
educacionais I ↔ Cidade média (+ 70 mil habitantes) = por escassez de demanda,
é bem provável que alguns níveis de ensino não existam, por não haver público
suficiente, nem interesses estabelecidos para que existam esses cursos, por
exemplo. Os interessados dessa cidade em frequentar cursos superiores deverão
procurar vagas em outras cidades maiores.
- Infraestrutura
de transportes ↔ Cidade média (+ 100 mil habitantes) = boa malha rodoviária
em sua direção; bom número de linhas de ônibus para cidades da região e para a
capital, mas para outras localidades do país é preciso ir para outra cidade
maior onde se pega outro ônibus; para uma viagem aérea, deve-se ir para a
capital ou para outra cidade maior do Estado que possui aeroporto.
Qual
o objetivo dessa comparação? O que está sendo medido é a força da cidade de
extrapolar seus próprios limites; de alimentar redes sociais de outras
escalas; de atrair mais moradores, negócios e eventos. É evidente que uma
cidade média perderá, por comparação, para uma cidade grande, que tem mais
recursos para saltar para outras escalas geográficas de relações. Porém, nem
sempre o tamanho é inteiramente decisivo. Uma cidade como Londres, em 2007,
contava com uma população de cerca de 8,6 milhões de habitantes, ou seja, bem
menor que São Paulo, mas ela levaria vantagem em vários itens do inventário
construído, se comparada à capital paulista.
Com
o objetivo de caracterizar a condição das cidades quanto à sua capacidade de
influenciar e se articular com outros espaços e outras sociedades, os
estudiosos do fenômeno urbano têm procurado classificá-las. Nesse esforço,
vários termos vêm sendo empregados: metrópoles;
megalópoles (megapólis e gigapólis); cidades mundiais ou
globais; arquipélago megalopolitano mundial; entre outros.
Todos
esses termos referem-se a cidades ou reunião de cidades (espaços urbanos) que
têm a capacidade de se inserir em escalas mais elevadas e, no limite, na escala
mundial. A definição mais comum de metrópole diz
respeito à sua capacidade de comandar territórios, sociedades e negócios
para além de seu próprio território.
São
Paulo corresponderia a essa situação? São Paulo é, sem dúvida nenhuma, uma
grande metrópole. Se fosse Campinas, certamente seriam encontradas
características para catalogá-la como uma metrópole, embora menor e menos
influente que São Paulo. Outros centros urbanos do Estado não chegam a essa
condição, mas poderá se notar a presença de alguns elementos metropolitanos em
algumas delas: São José dos Campos, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, por
exemplo.
E
olhando para o mundo? Vamos lembrar uma expressão que está sendo muito
utilizada desde os anos 1990: cidades globais (ou mundiais). Como o próprio
nome diz, são aquelas cujas influências têm escala mundial de fato. Mais até:
seriam os lugares mais estratégicos da globalização, os principais lugares da
rede de relações econômicas que forjam a globalização. Nos anos 1990,
admitia-se que apenas três metrópoles chegavam a tanto: Tóquio, Nova Iorque e
Londres. Hoje, já se admite que há outras que podem ser consideradas cidades
mundiais. E São Paulo? Ainda, segundo esse modo de classificar as cidades, não
teria alcance global, mas teria forte alcance regional ou zonal.
Mas
essa forma de classificar isoladamente cidades é bem discutível. Talvez o ideal
fosse apenas verificar se a cidade propicia o acesso cotidiano de sua população
e de suas relações à escala mundial. E isso São Paulo proporciona de forma
evidente. Nesse caso, seria uma cidade global. Não somente porque influencia,
mas porque recebe a influência e pertence à rede geográfica da globalização.
São
Paulo é uma cidade global enão é uma cidade global. Mas qual é a realidade? É
ou não é? A realidade existe, mas ela somente chega até nós conforme a
olhamos. E, no caso, mencionamos duas formas de interpretar essa realidade:
1. Conforme
o critério de capacidade isolada de influência, São Paulo tem força para
influenciar muito pouco na escala mundial, logo não é uma cidade global (uma
metrópole global).
2. Segundo
o critério de pertencimento a redes sociais e econômicas de relações que
caracterizam a globalização, São Paulo é plenamente uma metrópole global.
Qual
dos dois critérios mencionados revela melhor a realidade que vivemos?Essa
discussão é mais importante do que simplesmente discutir se São Paulo é ou não
uma cidade global.
Algo
mais pode ser acrescentado à questão das cidades e às suas relações que se
estendem a outras escalas: certas regiões do mundo reúnem em espaços de
pequenas extensões mais de uma metrópole, que articulam de tal modo as relações
entre si que é justo se falar num espaço urbano de outra escala, a escala
regional. Esse espaço urbano que articula intensamente mais de uma
metrópole é comumente designado como megalópole. Numa megalópole,
encontram-se mais claramente os elementos de integração na escala global.
No
quadro “Arquipélago Megalopolitano Mundial (ou Global)”, na página 18 do
caderno do aluno, estão mencionados e localizados os principais centros
urbanos, que, como grandes ilhas em conjunto, formam uma espécie de
arquipélago: Arquipélago Megalopolitano Mundial. Essa seria, como alguns
autores dizem, a estrutura espacial básica da globalização. E São Paulo faz
parte dessa estrutura. Em cada um dos conjuntos, seus núcleos são bem
articulados.
Até
onde vão e de onde vêm os bens materiais (mercadorias) e imateriais
(informações, influências) que cercam nossas vidas no Estado de São Paulo.
Afinal, é justo incluir São Paulo como uma metrópole integrada na realidade da
escala global?
14.
As cidades: criação e irradiação do consumo
As
configurações urbanas reúnem, em uma distância mínima, um número máximo de pessoas
e recursos. Além da imensa massa de relações que se estabelecem entre os
habitantes e os recursos de um espaço urbano, a vida na cidade permite
relações em outras escalas geográficas, com outros espaços e sociedades. É por
isso que uma cidade chega à condição de metrópole.
Não
é por acaso que o fundamental da vida humana, no mundo moderno, se orienta por
criações que têm origem nas cidades. Esses são os casos da criação econômica e
seu comando, das ciências, das diversas faces da cultura, da política. Entre
as práticas modernas, uma que tem um peso importante em nossas vidas e uma
complexidade de múltiplos significados é o consumo. O local fundamental do
consumo é a cidade. Não somente o ato em si, mas também no que diz respeito à
sua invenção, e à invenção das necessidades nas cidades e a sua
irrigação para o mundo a partir das cidades que participam das redes sociais de
escala global.
Quais
as relações entre consumo e cidade? Como é o consumo em suas vidas?
Vamos
ler o texto “A Revolução Industrial e o consumo” na página 22 do caderno do
aluno. O que a transferência desses contingentes populacionais para as cidades,
que a nova industrialização estimulou ou mesmo obrigou, impôs a essas pessoas?
Um novo estilo de vida. Elas não puderam mais produzir os bens para sua
sobrevivência e passaram a ter que comprá-los. A vida urbana, nesse sentido,
criou o consumo como meio necessário de sustentação material dos novos
habitantes. A vida urbana estava criando um mercado que, antes, não existia.
Logo, o consumo, para começo de conversa, é resultado de um modo de vida num
espaço no qual os alimentos são produzidos em outras áreas. O consumo de nossos
meios de vida não é, portanto, algo natural. É uma construção social fortemente
vinculada às cidades.
O
que os habitantes do meio urbano precisam comprar em razão de viverem nesse
tipo de espaço, de praticarem um modo de vida específico? Vivendo em áreas
rurais, e assim tendo outro modo de vida, as necessidades de consumo seriam as
mesmas?
Os
espaços geográficos sociais têm modos de vida e uma prática específica, no
caso, o consumo.
Essa
reflexão é um passo importante para o enriquecimento do olhar
sobre as realidades:
a desnaturalização de ocorrências, que na verdade, são construções
sociais e históricas.
Os novos modelos de consumo e
as metrópoles
Qual a relação
entre o elemento espacial e as necessidades do consumo? A ideia agora é
verificar alguns aspectos desta relação (cidade ↔ consumo) numa
situação contemporânea e real: na metrópole global que é São Paulo. O primeiro
passo é a leitura do texto “O consumo e o espaço interno das metrópoles: o caso
de São Paulo”, na página 22 do caderno do aluno”.
A
reflexão se inicia com a grande cidade que é São Paulo. É importante saber
raciocinar a partir de informações indiretas, porque esta é, aliás, uma prática
comum no mundo do conhecimento. A ampliação das redes de supermercado e
hipermercado nas grandes cidades prejudica o pequeno comércio de rua. Os
grandes supermercados são concorrentes poderosos demais para os pequenos negócios
distribuídos nas ruas dos bairros, mais próximos das residências. Os pequenos
comerciantes não podem competir em preços e na diversidade de produtos e
perdem para a força cultural associada ao consumo das grandes redes de
supermercado. Com isso, esse tipo de comércio entra em decadência, juntamente
com a vida econômica das ruas.
Os
grandes supermercados são os principais centros de abastecimento nas grandes
cidades. No entanto, não existe um a cada esquina e, na maioria dos casos, as
pessoas têm de realizar deslocamentos longos para chegar até eles. Assim, é
difícil fazer compras usando transporte coletivo. O automóvel praticamente se
impõe nessa forma de abastecimento, o que o torna mais dispendioso, aumenta o
gasto de tempo e sobrecarrega o sistema viário da cidade.
As
práticas em São Paulo terminam sendo transpostas para outras cidades
menores, tal é a influência do seu modo de vida e de suas práticas cotidianas.
Vamos tratar de outro exemplo: em São Paulo, a moradia em condomínio
fechado é um bem econômico muitíssimo valorizado. O setor imobiliário é o mais
poderoso e lucrativo segmento da economia urbana. A onda de condomínios
fechados é justificada pelo problema de segurança, e isso justificaria as
famílias se enclausurarem em ambientes protegidos. Pois bem, em cidades
menores do Estado, nas quais não existem problemas sérios de segurança, esse
modelo de moradia também está sendo adotado. É moderno, é da capital, com toda
sua capacidade de influenciar os hábitos de consumo.
O
consumo e seus novos modelos de espacialização são suficientemente fortes para
interferir na estruturação de uma cidade mundial, como São Paulo, por exemplo.
Além disso, outras cidades terminam sendo influenciadas pelas formas e pelos
hábitos de consumo das grandes cidades. Essa lógica é cada vez mais acentuada
na medida em que as conexões entre as cidades intensificam-se formando redes
geográficas urbanas de caráter cada vez mais mundial. As corporações
transnacionais do consumo encontram, nessa estrutura geográfica que elas
ajudaram a criar, um terreno propício para expandir seus negócios. Essa nova
situação geográfica sedimenta uma nova estrutura urbana mundial. As formas de
consumo surgidas no interior das cidades terminaram se expandindo em escala
mundial.
Na
experiência cotidiana da vida urbana moderna, não somente nas grandes cidades,
mas também nas cidades médias, o consumo apresenta-se muitas vezes organizado
em redes. Aliás, essa é a forma popular de os consumidores se referirem a
certos tipos de negócios. Essas redes estão nos ramos de alimentos
(lanchonetes fast-food, pizzarias, restaurantes); de roupas e
calçados; de equipamentos esportivos; de cosméticos; e de vários outros. Muitas
dessas redes não se restringem à escala do Brasil, pois são, na verdade, redes
que se estruturam na escala mundial, instalando-se, no mínimo, em capitais de
diversos países.
Faz
parte da lógica desses negócios procurar fortalecer sua imagem, realçando o
tempo todo seu caráter mundial, o que pode ser expresso com slogans
publicitários tal como: "...finalmente, chegou ao Brasil o produto X,
que já era objeto de consumo das principais cidades do mundo (ou das sociedades
mais modernas.)". O fato de ser mundial, de ser objeto de consumo de
outras cidades, acrescenta desejo de consumir nas populações de cidades que
ainda não têm acesso ao bem de consumo, e as redes mundiais desses negócios
sabem como se promover e despertar grande interesse. Não é incomum aglomerações
e filas para experimentar, por exemplo, um alimento
fast-food"mundialmente conhecido", recém-introduzido numa cidade.
Essas
redes de negócios em escala global são as primeiras a querer informar sobre sua
força mundial e, por esta razão, mantêm sites que oferecem boa parte
das suas informações e também por meio de outros materiais.
Isso
quer dizer também que, além das próprias empresas, muitos estudiosos, muitas
publicações (inclusive livros didáticos) organizam dados sobre essas empresas.
Nas próprias lojas, haverá quem forneça material ou informe os caminhos para
se obter as informações.
A representação
cartográfica
É
insuperável o valor da visualização cartográfica para que se possa vislumbrar a
dimensão global de um bem de consumo urbano e detectar a irradiação dos hábitos
de consumo por intermédio de redes, utilizando informações
relacionadas à localização geográfica das unidades da rede e também em relação
ao volume de unidades. O mapa permite uma visualização do fenômeno sob vários
pontos de vista. Além da configuração da rede (articulação, pontos mais
densos, áreas mais antigas, áreas mais novas, velocidade de expansão da rede),
algumas outras observações podem ser feitas sobre a força de irradiação do
consumo que certas cidades (e certas redes) possuem.
A
expansão de uma rede, segundo o seu tipo de produto, pode ou não acontecer por
uma questão cultural. Essa é uma dimensão da força das redes que vale a pena
destacar. Por exemplo: como uma rede de fast-food que vende
hambúrguer, consegue se instalar em países que restringem culturalmente o
hábito do consumo de carnes? Ou, então: como uma rede de roupas jeans consegue
penetrar em áreas cujos vestuários masculino e feminino são bastante diferentes
desse tipo de vestimenta? Nesses casos, não é possível falar em transformação
cultural produzida pela irradiação do consumo?
A cidade,
de acordo com seu consumo, pode ser inserida no grupo das cidades mundiais
(rede de cidades), que interferem na expansão de modelo de consumo e nas
transformações culturais.
15.
As redes turísticas: o consumo dos espaços urbanos
Em
um mundo em que aumenta a mobilidade humana, em que as conexões entre os
lugares se intensificam (fato que se nota especialmente nas cidades),
potencializa-se uma atividade humana que está em crescimento: o turismo.
Para
a atividade turística, os lugares do mundo são mais acessíveis em razão das
novas tecnologias de transporte, da queda no custo das viagens, da ampliação do
tempo livre das pessoas e da melhoria da capacidade de recepção ao turista nos
lugares de destino. Num mundo assim, o ser humano seria inevitavelmente um
turista.
Em torno dessa atividade,
formam-se redes geográficas e econômicas. Desse modo, cresce o pertencimento
dos viajantes-turistas aos lugares do mundo, e eles podem agora consumir os
diversos lugares atrativos com mais frequência e regularidade.
O
fenômeno turístico é muito conhecido no mundo contemporâneo, em especial em
certas áreas do Brasil. Seguramente, percebemos o turismo, se não de forma
direta, ao menos de forma indireta, pois a prática turística é bem presente nos
meios de comunicação, por exemplo.
Imagine,
numa grande cidade, uma localidade muito conhecida, onde se encontra um
monumento (uma igreja muito antiga, uma grande torre, uma estátua importante,
um museu etc.) ou então uma localidade que é muito conhecida por ter sido
palco de um grande acontecimento (um ponto onde se declarou a independência de
um país, por exemplo). Áreas assim são atrações e, por isso, recebem muitos
visitantes, que nelas exploram todos os detalhes, tiram fotografias etc.
Esses
visitantes podem ser todos caracterizados como turistas? Todos estão
praticando o turismo?
Alguns
visitantes podem ser moradores da cidade ou de suas cercanias e estão apenas
visitando aquele ponto porque também o apreciam. A cidade é muito grande, não
é sempre que seus moradores conseguem ir até ali, a não ser em momentos
especiais, no seu tempo livre, nas festas. Ali, como visitantes, vão se
comportar do mesmo modo que qualquer outro visitante.
Como distinguir
os turistas em meio a uma realidade mais ampla, a de todos os visitantes de
locais turísticos? Nesse esforço de distinguir os visitantes do lugar atrativo,
a palavra-chave é viagem. Essa palavra é um divisor de águas entre o visitante
comum de um lugar e o visitante-turista. O conceito de turismo pode ser
construído baseado nesta condição.
Segundo
a Organização Mundial do Turismo (2001), compreende-se por turismo as
atividades (de lazer, de negócios etc.) que as pessoas realizam quando viajam
por mais de um dia consecutivo para lugares diferentes do seu entorno habitual.
O visitante que viajou está
fora do seu cotidiano, está em outro lugar, não mora ali, está hospedado. Ele
está viajando. Já o visitante da própria cidade não está fora do seu cotidiano,
mora ali, não está hospedado, logo, não está viajando. São dois personagens
diferentes e em situações distintas.
O turismo: um
fenômeno que constrói espaços
Aqueles
visitantes que não eram turistas, que moravam no lugar, estavam praticando
lazer. Todos visitavam a atração da cidade, mas alguns praticavam o turismo e
outros praticavam o lazer.
Um
elemento que compõe o cotidiano de qualquer pessoa é o lugar, o lugar
geográfico. Lugar é o quadro geográfico de vida, no qual a distância não impede
que as relações do dia a dia (moradia, trabalho, escola, lazer, relações
pessoais) se realizem. O que não podemos realizar no dia a dia, porque é muito
longe para nós, está fora de nosso lugar. Uma frase resume essa conceituacão: o
lugar é o tamanho geográfico de nosso cotidiano. Ele representa a escala local.
Assim,
pode-se utilizar a contextualização da Organização Mundial do Turismo (2001)
para complementar a caracterização:
- Turismo:
viagem de mais de 24 horas para fora do lugar;
- Excursão:
viagem de menos de 24 horas para fora do lugar;
- Lazer: visita
a um ponto turístico ou de lazer feita por um morador do lugar.
Essa
caracterização estabelece um vínculo entre o lazer e a atividade turística,
mas o conceito de lazer possui uma amplitude maior: considera todo o tempo
disponível, excluindo-se as horas de trabalho, que pode ser dedicado às
atividades que dão prazer às pessoas. Esse tempo poderá servir para visitar
algum ponto atrativo local.
Todas
as viagens podem ser caracterizadas como turismo? Se, por exemplo, alguém vai a
uma festa de casamento de um parente, não foi fazer turismo. Mas há práticas
que envolvem viagens que estão sendo chamadas de turismo, e o melhor exemplo é
o chamado turismo de negócios. Faz sentido dizer que pessoas que viajam a
negócios praticam algo que possa ser chamado de turismo?
O
turismo de negócios também é um tema polêmico na própria área, com defesas
favoráveis e contrárias a essa categoria turística. Alguns pesquisadores, como
Cunha (2001), conciliam a questão dos negócios com a atividade turística, ao
afirmar que o turismo de negócios comporta as atividades de visitação que
decorrem de viagens com a finalidade de realizar negócios ou outras atividades
profissionais. Reforçando essa posição, o Ministério do Turismo (2008) afirma
que as atividades turísticas decorrentes de viagens de negócios (participação
em feiras e convenções, reuniões comerciais etc.) caracterizam-se como turismo
de negócios e eventos.
As
motivações para o turismo são variadas e os lugares procurados também, especialmente
onde há mais tempo e as pessoas se organizam para a prática do turismo. No
passado, as atrações turísticas eram outras e novas motivações foram
acrescentadas a elas. Alguns exemplos:
- Hidroterapia,
climatismo, alpinismo, esportes de inverno, esportes de verão: referem-se às
diferentes práticas do passado, algumas ainda são muito procuradas, como os
esportes de inverno nos países temperados;
- "Turismo
cultural", "turismo balneário ou litorâneo", "turismo de
montanha", "turismo verde" (ecoturismo e "turismo
rural"): são termos referentes a certas realidades espaciais e sociais
(grupos sociais tidos como exóticos, praias, montanhas, santuários ecológicos,
área rural);
- O descanso, o
divertimento, a procura de outras experiências e a realização de uma
necessidade existencial são referências às finalidades buscadas pelos turistas.
Como
se dá a organização espacial do turismo e de suas redes?
Em função da sua
capacidade de recepção, população local e funções urbanas diversificadas, os
espaços turísticos são classificados em sítio turístico, infraestrutura
turística, estações turísticas e cidade turística, como observamos no quadro
“Distinção de diferentes espaços turísticos”, na página 32 do caderno do aluno.
Os lugares turísticos funcionam articuladamente.
Vale a pena defini-los rapidamente:
- Sítio
turístico: É a atração turística propriamente. Uma área destacada no interior
de outros espaços e que possui a função turística pura. Esse é o caso das pirâmides
do Egito (e de outras ruínas daquela civilização antiga); das pirâmides maias
na América Central; de formações naturais (quedas d'água, picos de montanhas,
por exemplo). Nos sítios turísticos não se hospeda e não mora ninguém. Os turistas
dirigem-se até eles, visitam-nos e retiram-se.
- Infraestrutura
turística: Lugar pouco conhecido em nosso território, mas muito comum em países
turísticos. Por exemplo, nas escaladas e trilhas em regiões montanhosas existem
lugares que apoiam o turismo, até com serviços de hospedagem. Não mora ninguém
nesses lugares, não são eles a atração, mas foram construídos como parte
necessária das redes espaciais do turismo. Aeroportos em lugares afastados por
vezes cumprem esse papel. São portas de entrada para áreas exploradas por
certas práticas turísticas.
- Estação
turística: Esse gênero de lugar turístico já é mais familiar. Estrutura-se em
áreas povoadas, pequenas cidades em geral, com grande capacidade de hospedagem
para o período da estação turística. Suas atrações vinculam-se às estações do
ano. Esse é o exemplo dos pequenos povoados em regiões montanhosas que lotam de
turistas na estação do inverno, ou, então, das pequenas cidades litorâneas que
se transformam no verão. Sem o turismo, são áreas urbanas sem a diversidade de
atividades e recursos de uma grande cidade. Um exemplo bem conhecido de São
Paulo: Campos do Jordão, estação turística de inverno.
- Cidade
turística: São as cidades que recebem muitos turistas, mas têm uma vida ampla e
diversificada para além dessa atividade. São centros urbanos plenos, que
exercem todas as funções das áreas metropolitanas e são visitadas inclusive por
isso. Entre eles, estão os principais destinos dos turistas do mundo e exemplos
não faltam: Paris (França), Londres (Inglaterra), Nova Iorque (EUA), Rio de
Janeiro, Salvador, Sydney (Austrália), Barcelona (Espanha) e muitas outras
cidades.
Qualquer
lugar turístico se encaixa em uma dessas quatro categorias. Elas compõem a rede
espacial do turismo e sua escala de abrangência pode ir do local até o global.
As
reações, as conseqüências e os efeitos do turismo no mundo, um fenômeno novo
(na proporção atual) na história da humanidade, não estão ainda absorvidos.
A escala do
fenômeno turístico: o apoio na rede de cidades
O
turismo tem uma dimensão econômica importante que contribui para a criação de
riqueza em diferentes escalas. Na escala mundial, com mais de 700 milhões de
deslocamentos, o turismo contribui com cerca de 10% da riqueza mundial. Em
países em desenvolvimento, uma porcentagem ainda maior de sua riqueza provém
do turismo; porém, países ricos, como a França ou a Espanha, arrecadam perto
de 10% de suas riquezas dessa atividade.
O que
significam as práticas turísticas no mundo contemporâneo? Observe a representação
cartográfica “Destinações do turismo internacional, 2005” apresentada
na página 36 e 37 do caderno do aluno
Podemos
utilizar esse mapa também para trabalhar sua linguagem visual. Ele foi
elaborado pelo Ateliê de Cartografia de Sciences Po (instituição de pesquisa
francesa na área de Ciências Políticas), de acordo com os preceitos definidos
por Jacques Bertin, em sua obra Semiologia gráfica. Para esse autor,
que elaborou teorias de tratamento da informação, a imagem gráfica (no caso, o
mapa) bem trabalhada favorece o aprendizado, ajuda a construir um pensamento
lógico com base em uma forma visual de interpretação.
Por
que uma coleção de mapas? Na representação dos fluxos turísticos, os
autores criaram mapas separados para cada continente. Em cada um deles,
encontra-se a origem dos fluxos que partem em direção aos outros continentes.
Com isso, criaram uma coleção de mapas para representar um único fenômeno. A
decisão foi tomada porque, se os fluxos todos fossem representados num único
mapa-múndi, haveria sobreposição, e isso dificultaria a interpretação do mapa.
Olhando a coleção de mapas, pode-se responder de imediato à pergunta: onde
estão os maiores fluxos de turistas no mundo? E esse olhar de conjunto somente
é possível porque os mapas são comparáveis. São mapas do mesmo tema e feitos
com a mesma linguagem (mesma legenda, mesmos símbolos, e, no caso, a largura
das setas têm a mesma proporcionalidade em todos os mapas).
O
que mostra a coleção de mapas? Representa quantidades em forma de setas
que indicam direções (de um continente a outro), formando fluxos quantitativos.
Representa também quantidades internas a um único continente, por meio de
círculos sobre os continentes ou regiões. A largura das setas mostra a
quantidade de turistas viajando de um continente a outro; o tamanho dos
círculos mostra o volume de turismo no interior do continente.
O fluxo quantitativamente
mais significativo de turismo intercontinental (entre continentes) é o da
Europa para a América do Norte (em laranja), representado no mapa que
centraliza a Europa pela seta proporcionalmente mais larga dos quatro mapas. Já
o maior volume de turismo intra-regional (dentro do mesmo continente) está na
Europa (em laranja) e está representado pelo maior dos círculos dos quatro mapas,
indicando também o domínio do turismo de distâncias menores. A Europa é a área
do mundo que mais recebe turistas intercontinentais vindos principalmente das
Américas e da Ásia. É também o continente que mais envia turistas para os
outros continentes, inclusive a África. Além de tudo isso, tem o maior turismo
intra-continental. Isto é, ao mesmo tempo, sintoma de riqueza econômica; boa
qualidade de vida de seus habitantes que conquistaram parcelas de tempo livre;
presença de localidades atrativas e de estruturas para atrair o turista e
facilitar o turismo para o exterior. Em menor escala, essa situação se repete
na América do Norte e no Japão.
A
Europa é uma região bastante urbanizada. Os turistas que vão à Europa buscam as
atrações urbanas, em suas grandes e muito conhecidas cidades. Paris é a cidade
mais visitada do mundo; em 2008, recebeu cerca de 28 milhões de turistas,
sendo 9 milhões de estrangeiros. A única concorrência que as cidades européias
sofrem vem das praias, no verão. As praias da Espanha e da Grécia, por exemplo,
são muito procuradas, em especial pelos europeus dos países mais frios. Em
busca de sol e praia, muitos europeus vão também para a África.
A
América do Norte, que é um destino de muitos turistas europeus, asiáticos e sul-americanos,
tem várias atrações turísticas, mas as principais também são suas cidades e
suas instalações urbanas, com destaque para Nova Iorque e os parques temáticos
localizados em Orlando e em Los Angeles, por exemplo.
Algumas
cidades atraem mais turistas que as outras localidades, que também têm atrações
turísticas, por conta da riqueza de seus monumentos históricos ou
arquitetônicos, paisagens populares ou românticas e seus grandiosos recursos
culturais. A esses fatores tradicionais, exposições, congressos, eventos culturais
e desportivos alcançam uma grande difusão internacional As cidades têm várias
situações estratégicas para atrair os turistas: infraestruturas de comunicação
e de transporte, que partem e se dirigem para as cidades; concentração de
recursos de hospedagem, de comércio, mercados populares e "étnicos",
parques de lazer etc.
Apoiado
nas redes de cidades, o turismo intercontinental movimenta mais de 100 milhões
de pessoas anualmente. Isso, adicionado ao turismo dentro dos continentes
(cerca de 600 milhões), demonstra quanto no mundo contemporâneo as relações
humanas estão se estreitando e quanto os espaços estão se transformando em
espaços de todos. Por enquanto, os números da movimentação turística
representam 10% da população mundial, mas todas as tendências indicam que esse
processo de "consumo dos espaços" mal se iniciou.
16.
Um mundo mais fluido: os caminhos geográficos das redes ilegais
Num
mundo mais interconectado, que estrutura seus principais núcleos urbanos em redes
e por onde circula um volume imenso de turistas, de novos bens e hábitos de
consumo, circulam também pessoas, bens e informações fora do controle das leis
vigentes.
Ao
contrabando de mercadorias, à circulação de imigrantes clandestinos, ao
tráfico de drogas e de armas, às redes de ilegalidade tradicionais (embora
atualmente mais profissionais e mais sofisticadas), juntam-se: as novas
formas de organização dos agrupamentos terroristas; os novos meios de fuga de
recursos financeiros em "paraísos fiscais" (que não cobram impostos
sobre determinadas operações financeiras); a "lavagem" e o
"esquentamento" de dinheiro sujo; e o comércio de produtos e de bens
culturais com marcas famosas falsificadas: a pirataria.
A
rigor, as redes de ilegalidade se fortalecem porque é possível fazer circular
bens em escala global, há demanda para eles, e os controles que são feitos
pelos Estados nacionais (países) não estão bem preparados para reprimir as
organizações ilegais mundiais, bem mais poderosas e engenhosas do que eram
antes.
Algumas
atividades ilegais, em nosso país, estão muito presentes em nosso cotidiano,
direta ou indiretamente, pelos meios de comunicação, por exemplo:contrabando,
pirataria, falsificação, "laranjas", tráfico de drogas ou de armas,
muambas, sacoleiros, lavagem de dinheiro, dinheiro sujo, etc.
Os
piratas são personagens históricos, navegadores que viviam de saquear navios
que transportavam mercadorias das regiões colonizadas pelos europeus. A pirataria
clássica, de rapto e saque de navios, parece ter retornado, a partir da
Somália, país que vive uma guerra civil desde 1990. Desde 1997, há relatos de
roubos de navios nas proximidades desse país. Hoje, quando se fala em produtos
piratas e pirataria, são produtos falsificados, copiados de outros produtos
famosos. A pirataria é um negócio ilegal, apoiado por redes e organizações
poderosas, que vivem de copiar, de falsificar, de usar a identidade alheia.
Produtos piratas são mais baratos: não pagam impostos e geralmente usam
materiais de baixa qualidade.
Um mundo interligado: as redes
da ilegalidade se fortalecendo
Os
negócios legais ou as redes de ilegalidade operam em escala global,
aproveitando diferentes oportunidades no mundo desigual e de controles e
necessidades variadas.
O
enfraquecimento do controle dos Estados nacionais favorecem a circulação de
bens ilegais, e, depois, "purificam" seus resultados, dando condição
legal ao dinheiro obtido.
Muitas
vezes inexistem controles às redes de ilegalidade. Um exemplo é o próprio
Brasil e sua maior cidade (São Paulo), cuja paisagem urbana atual está marcada
por locais que concentram abertamente a comercialização de "produtos
pirateados". Nesse comércio, mobiliza-se um volume muito grande de mão de
obra e de compradores, que de outro modo não teriam emprego ou condição de
comprar certos produtos. Mesmo quem poderia comprar produtos mais caros,
termina se beneficiando desse comércio. Aí, a ilegalidade se mistura com
problemas sociais e econômicos do país. Esse é um aspecto da complexidade do
problema. Outro aspecto são os malefícios que esse comércio ilegal produz sobre
várias atividades legais que vão sofrer com perda de mercado, o que vai
ocasionar desemprego, por exemplo. Além disso, muitos outros riscos - de saúde,
de segurança etc. - estão implicados no comércio ilegal.
O mapa “Os paraísos
fiscais”, na página 44 do caderno do aluno, mostra a localização dos paraísos
fiscais, mas não mostra a importância deles por meio de uma relação visual de
ordenação ou de quantidade e não há representação das movimentações financeiras
de cada um deles, que certamente são diferenciadas.
No
paraíso fiscal, as operações são secretas. Se não houvesse sigilo e todos
soubessem para onde vai o dinheiro dos traficantes, quais negócios legais foram
abertos com esse dinheiro, enfraqueceria os paraísos fiscais e as organizações
criminosas em suas operações no mundo. As transações ilícitas seriam
reveladas e a expulsão do "paraíso", mais eminente.
No
mapa, pode-se ver a distribuição geográfica desses lugares. Por que ocorre a
concentração dos paraísos fiscais na região da América Central, no mar do
Caribe? Os Estados nacionais identificados como paraísos fiscais são quase
todos ilhas, quase todos de pequena extensão territorial e, seguramente, com
poucos recursos econômicos próprios. Sua vida econômica depende do turismo
(que neles é bem forte) e espaço livre de controles aos capitais.
A
segunda maior concentração de paraísos fiscais, que o mapa nos mostra, é na
Europa. São áreas de pequena extensão, espécies de recortes que ficaram fora da
divisão territorial dos principais países europeus. Encontram-se num continente
rico e servem de algum modo para que muitos milionários europeus, por
exemplo, mudem para esses paraísos para fugir de impostos nos seus países de
origem. São paraísos fiscais tanto quanto os outros e também mais
ou menos fora do controle das leis internacionais. Logo, servem de apoio às
redes de ilegalidade.