quarta-feira, 17 de julho de 2013

BIODIVERSIDADE

Biopirataria na Amazônia



O termo ?biopirataria foi lançado em 1993, para alertar sobre o fato que recursos biológicos e conhecimento indígena estavam sendo apanhados e patenteados por empresas multinacionais e instituições cientificas e que as comunidades que durante séculos usam estes recursos e geraram estes conhecimentos, não estão participando nos lucros. ·De modo geral, biopirataria significa a apropriação de conhecimento e de recursos genéticos de comunidades de agricultores e comunidades indígenas por indivíduos ou por instituições que procuram o controle exclusivo do monopólio sobre estes recursos e conhecimentos. ·Por enquanto, ainda não existe uma definição padrão sobre o termo biopirataria?.
A biopirataria desafia o Brasil a cuidar da Amazônia,com cinco milhões de hectares correspondentes à metade de todo o território nacional ,e uma bacia hidrográfica que concentra um terço de toda água doce existente no planeta, a Amazônia brasileira tem sido alvo de uma escalada crescente por seus recursos natural, devido á  ação dos biopiratas,em sua maioria turistas e pesquisadores estrangeiros que fazem contrabando de riquezas da fauna e da flora amazônica.Apesar de tão rica e por isso exaltada no mundo inteiro,a Biodiversidade Amazônica continua a ser um desafio para todos que por ela se interessam.Os pesquisadores que se dedicam a estudar a diversidade da região, se ressentem de que agora somente 1%de todo o potencial Amazônico seja conhecido e que,por falta de fundos de amparo á pesquisa,o Brasil,tenha que comprar de fora uma tecnológica desenvolvida á partir de uma amostra furtada da sua Amazônia.No entanto o Brasil precisa assumir o comando e definir as regras para o intercâmbio,para que se possa combater a biopirataria é preciso que se compreenda cada um dos fatores que contribuem para a sua existência,ou seja as possibilidades oferecidas pela vida na Amazônia: a inexistência de uma política nacional estratégica para ciência e tecnologia,o interesse crescente pelos conhecimentos tradicionais, que reduzem os custos e o tempo das pesquisas:a defasagem brasileira em pesquisa,desenvolvimento e produção:a falta de uma legislação que regule a exploração dos recursos naturais e, ainda,a exclusão social.
A questão é tão atraente que não se pode descartar o interesse internacional pela Amazônia, que esta na maioria das vezes associadas á realidade social do País e a total inexistência de uma política nacional estratégica para atividades de ciência e tecnologia,voltada para biomassa brasileira incluindo não só a Amazônia, mas também a mata atlântica, serrado e alagados tornam-se fatais para estimular a biopirataria e as industrias que os patrocinam,sobretudo consideram que eles são muito melhores do que os brasileiros quando se tratam de pesquisa,desenvolvimento e produção.Portanto enquanto o Brasil não adotar uma estratégia de relacionamento internacional em relação à Biodiversidade Amazônica, a biopirataria vai continuar a existir,a despeito de todas as ações punitivas que se queria adotar,ate porque com os avanços tecnológicos as amostras que interessam aos grandes laboratórios podem ser enviadas por meios virtuais e livres de qualquer tipo de fiscalização.
A biopirataria passa por um ciclo de fatores que interagem entre si,como destacou, e que ao invés de se debater contra uma realidade irrefutável, o Brasil precisa aumentar sua competência como detentor das riquezas,ditar regras e assumir o comando de um amplo e intercambio internacional para fins de preservação e da exploração responsável da Amazônia.Conceituação de biopirataria conforme o Instituto Brasileiro de Direito do Comércio Internacional,da tecnologia da informação de Desenvolvimento-CIITED: 
Biopirataria consiste no ato de aceder a ou transferir recurso genético (animal ou vegetal) ou conhecimento tradicional associado à biodiversidade,sem a expressa autorização do Estado de onde fora extraído o recurso ou da comunidade tradicional que desenvolveu e manteve determinado conhecimento ao longo dos tempos (prática esta que infringe as disposições vinculantes da Convenção das Organizações das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica).A biopirataria envolve ainda a não repartição justa e eqüitativa entre Estados,corporações e comunidades tradicionais dos recursos advindos da exploração comercial ou não dos recursos e conhecimentos transferidos.

Se eu fosse uma capivara... como seria?

LUISA MASSARANI
Ilustrações Mariana Massarani

Se eu fosse uma capivara...
Embora a capivara seja terrestre, água é tudo de bom para este bicho! Excelente nadadora, adora dar um mergulho e pode ficar debaixo d´água por vários minutos. Até dormir na água consegue, deixando só o focinho para fora!

Não é à toa que a capivara vive perto de rios e lagos, na América do Sul e Central.

Seu prato predileto é capim e ervas. Tem poucos --mas grandes-- inimigos, como anacondas, pumas, onças e alguns jacarés maiores. E os seres humanos, que gostam de comer sua carne e usar seu couro para fazer sapatos e bolsas.

Existem muitas capivaras que conseguem se virar mesmo em ambientes alterados pelos seres humanos. Até em cidades grandes e poluídas como São Paulo ou Rio de Janeiro, é possível dar de cara um destes bichos que, aliás, são bem dóceis.

As capivaras gostam de viver em grupos grandes, de uns 20 indivíduos. Pode chegar a 100 animais vivendo juntos. Em geral, no grupo há de um a quatro machos dominantes, fêmeas e filhotes.

O olfato é um sentido muito importante para estes bichos: o macho tem uma glândula na cabeça da qual sai uma substância que deixa um cheiro, indicando que ali é o território dele.

Para achar seu namorado ou sua namorada, a capivara assovia. Será que as pessoas que fazem "fiu, fiu" na rua tem um "quê" de capivara?

Uma fêmea tem seus bebês pelo menos duas vezes ao ano. Pode nascer de uma a oito 'capivarinhas'.

A mãe fica grávida por uns cinco meses e ela organiza creches para cuidar de seus filhotes. Já pensou, que fofo, um monte de 'capivarinhas' juntas?

Os filhotes nascem com 1,5 quilos (equivalente a um pacote e meio de açúcar). Em seis meses, podem pesar 20 quilos, ou seja, 20 pacotes de açúcar. Quando adulto, pode chegar até uns 80 quilos, o peso de um homem adulto.
Folha de São Paulo
Ruanda é o 3º país a ratificar Protocolo de Nagoya



Ruanda se tornou nesta semana o terceiro país a ratificar o Protocolo de Nagoya, acordo internacional assinado no Japão em 2010, que trata do acesso aos recursos genéticos da biodiversidade e da repartição de benefícios oriundos da exploração econômica desses recursos. O protocolo precisa ser ratificado por pelo menos 50 países para entrar em vigor. Gabão e Jordânia também já aderiram.

O Brasil, que foi um dos principais articuladores do acordo em Nagoya e um dos primeiros a assiná-lo, ainda não enviou o protocolo para ratificação no Congresso. O atraso deve-se ao mau momento político criado pelas discussões do Código Florestal, segundo o ex-secretário de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Braulio Dias, que este ano assumiu a secretaria executiva da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações Unidas.

"Foi uma decisão de governo de não encaminhar o projeto para evitar barganhas políticas e contaminação da discussão", disse Dias ao Estado em janeiro, quando foi anunciada sua nomeação para secretário executivo da CDB. A expectativa dele era de que em um ano seria possível obter as 50 ratificações.
Jornal O Estado de S.Paulo

Não existe planeta como o nosso

Plantas são responsáveis pelas geleiras e rios que criaram a paisagem característica da Terra
Mark Fischetti©Mikhail Markovskiy/Shutterstock
Os astrônomos estão descobrindo muitos exoplanetas que orbitam estrelas como o Sol, incrementando substancialmente as chances de encontrarmos um mundo semelhante. Mas se isso acontecer, a chance de a superfície desse planeta ter um aspecto semelhante à do nosso é muito pequena, graças a um “culpado” improvável: as plantas.

Todos nós sabemos como a paisagem da Terra emergiu, certo? Oceanos e massas de terra se formaram, montanhas ergueram-se e a precipitação pluviométrica varreu sua superfície; rios desgastaram as rochas nuas, criando o solo, e as plantas se enraizaram. Bem, uma nova pesquisa indica que a última fase desse roteiro não está correta. Plantas vasculares — aquelas com estruturas como xilema e floema, que podem conduzir água, entre outras substâncias — são o que criou os rios e lamaçais que construíram os solos que produziram florestas e terras cultiváveis.

A evidência de que as plantas vasculares foram uma das principais forças que moldaram a superfície da Terra é apresentada em uma edição especial da Nature Geoscience, publicada on-line. No artigo, Timothy Lenton, um cientista especializado em sistemas da Terra na Universidade de Exeter, na Inglaterra, apresenta dados do registro biogeoquímico mostrando que a evolução de plantas vasculares em torno de 450 milhões de anos atrás é o que realmente começou a absorver dióxido de carbono da atmosfera, mais do que os organismos nos oceanos. Em consequência, as temperaturas da Terra caíram, iniciando um ciclo de glaciação e derretimento generalizados que, ao longo de outros milhões de anos, provocaram uma abrasão substancial na superfície da Terra.

Talvez ainda mais surpreendente, plantas vasculares formaram os tipos de rios vemos hoje ao nosso redor, segundo outro artigo, de Martin Gibling, da Universidade Dalhousie, em Nova Scotia, e Neil Davies, da Universidade de Ghent, na Bélgica, que analisaram a deposição de sedimentos remontando a centenas de milhões de anos. Antes da era das plantas, a água lavava as massas terrestres da Terra em amplas extensões, sem cursos definidos. Somente quando suficiente vegetação cresceu, a ponto de desagregar as rochas em minerais e lama, e então manter essa lama fixa em seu local, é que se formaram as margens dos rios, que começaram a canalizar a água. Essa canalização resultou em inundações periódicas que depositaram sedimentos sobre grandes áreas, criando solos ricos. O solo, por sua vez, permitiu que árvores se enraizassem. Seus detritos lenhosos tombaram nos rios, criando “engarrafamentos” dessas substâncias que rapidamente criaram novos canais e causaram ainda mais enchentes, estabelecendo um ciclo realimentador que terminou por dar sustentação a florestas e planícies férteis.

"As rochas sedimentares, antes das plantas, quase não continham lama", explica Gibling, professor de ciências da Terra na Dalhousie. "Depois que as plantas se desenvolveram, o conteúdo de lama aumentou enormemente. Paisagens lamacentas expandiram-se bastante. Foi criado um novo tipo de ecoespaço antes inexistente.”

Isso nos leva às consequências cósmicas. "As plantas não são passageiros passivos no sistema da superfície do planeta", diz Gibling. "Elas criam o sistema da superfície. Organismos moldam o ambiente: a atmosfera, as paisagens, os oceanos, todos se desenvolveram com incrível complexidade depois que a vida vegetal se desenvolveu." Assim, conforme dizem os editores da Nature Geoscience em editorial para sua edição especial, mesmo que haja alguns planetas que possam suportar placas tectônicas, água corrente e os ciclos químicos que são essenciais à vida como a conhecemos, parece improvável que qualquer um desses planetas seja parecido com a Terra. Porque mesmo que plantas brotem, elas evoluirão de forma diversa, moldando uma superfície distinta sobre o orbe que denominam lar.
Scientific American Brasil

Notícias Geografia Hoje


De olhos bem abertos para a biodiversidade do arquipélago de Abrolhos, no Sul da Bahia
Fernanda Dutra (fernanda.dutra@oglobo.com.br)
CARAVELAS - Entre tantos nomes de origem indígena, os descobridores tiveram a chance de batizar um lugar especial: o arquipélago de Abrolhos, a 70 quilômetros do litoral. Os primeiros registros históricos da região com maior biodiversidade do Atlântico Sul datam de 1503, quando o navegador Américo Vespúcio teria alertado ao perigo de naufrágio diante de tantos recifes: "abram os olhos" - contam os guias. É quase por aí, exceto que Vespúcio só usou uma palavra já conhecida. Abrolhos são recifes ou baixios perigosos para as embarcações.

Os riscos são mínimos hoje em dia. A bordo de um catamarã, o trajeto entre o arquipélago e o porto mais próximo, na cidade de Caravelas, dura em média três horas. Entre julho e novembro, o tempo passa voando. É a temporada de reprodução das baleias jubarte, que vêm da Antártica se acasalar nas águas de temperatura amena da região ao Sul da Bahia e Norte do Espírito Santo. De uma população em média de 9 mil baleias, o Instituto Jubarte estima que 80% esteja na região de Abrolhos. Desde 1986, quando a caça às baleias foi oficialmente proibida, a população das jubartes tem crescido exponencialmente, em média 7% por ano. A observação de baleias é uma atividade monitorada pelo instituto, que envia representantes na maior parte das viagens. Até avistar o primeiro jato d'água, a ansiedade é grande. Mas depois são tantos jatos, nadadeiras e caudas por todos os lados... Às vezes, até em dezembro se avista alguma jubarte atrasada para voltar às águas frias da Antártica.
Se estiver por lá no auge do verão, não se desanime. Os golfinhos estarão ansiosos por voltar à cena.
O farol da ilha de Santa Bárbara é o primeiro sinal do arquipélago, composto por outras quatro ilhas: Siriba, Redonda, Sueste e Guarita. Santa Bárbara, onde existe um farol instalado desde 1861, está sob jurisdição da Marinha. As demais fazem parte do Parque Nacional Marinho de Abrolhos.

Jornal O Globo

11% das espécies serão extintas até 2100


Por Jeremy Hance, do Mongabay*
Há décadas cientistas preveem que as mudanças climáticas podem ter um impacto grave sobre a vida na Terra, que já está enfrentando diversas ameaças como a perda de habitats, super-exploração, poluição, espécies invasoras e outros.

Entretanto, é difícil obter provas empíricas das extinções, e até mesmo da ameaça, causadas pelas mudanças no clima. Um novo estudo publicado no periódico Proceeding of the National Academy of Science revelou que em torno do ano 2100 as mudanças climáticas podem ter colocado em extinção mais de 11% das espécies do mundo.

“Muitos cientistas defendem que estamos entrando na sexta grande extinção em massa e que a mudança climática antropogênica é uma das maiores ameaças a biodiversidade global”, declararam os pesquisadores.

Classificando estudos recentes, Ilya Maclean e Robert Wilson do Centro para Ecologia e Conservação da Universidade de Exeter, descobriram evidencias generalizadas de mais cem maneiras nas quais a mudança do clima já está impactando espécies, incluindo o aumento das temperaturas, mudança na precipitação e redução do gelo marinho. Eles também notaram uma série de eventos previstos, mas ainda não observados, que poderão impactar as espécies, segundo cientistas.

“As respostas incluem mudanças documentadas no risco de extinção, tamanho de populações e distribuição geográfica para 305 taxa de todos os principais grupos de organismos, abrangendo uma porção alta da superfície terrestre e marinha global”, escreveram os cientistas completando que as espécies de vertebrados parecem mais ameaçadas pelas mudanças do clima do que as plantas ou invertebrados.

Porém, os estudiosos admitem que há grandes brechas nas pesquisas realizadas até agora.

“Mais estudos sobre os efeitos, como as modificações nos padrões de circulação oceânica e na acidez dos organismos marinhos melhorariam as estimativas de risco de extinção”, ponderam.

As espécies dos trópicos, como a vida selvagem das florestas tropicais e insetos em geral, também são negligenciados em termos de impacto das mudanças do clima.

“Existem vários (fatores) desconhecidos na projeção do declínio da biodiversidade, então estes valores devem ser interpretados com precaução”, dizem os cientistas. Porém, eles relembram que os seus dados levaram em conta diversas possibilidades de distorções.

Dado que as mudanças do clima impactarão espécies já sob pressão por uma série de outras ameaças de grande escala, os pesquisadores dizem que suas estimativas são acima de tudo conservadoras.

Todavia, se o modelo for preciso, as mudanças climáticas causadas pelo homem podem ser responsáveis pelo desaparecimento de milhares ou até milhões de espécies.

Atualmente, cerca de 2 milhões de espécies foram descritas por cientistas desde o século XVIII, porém ninguém sabe quantas existem no planeta. Estimativas giram em torno de 5 milhões a 100 milhões. Descobertas recentes de comunidades de micróbios abundantes nos oceanos podem levar as estimativas ainda mais alto, possivelmente para um bilhão de espécies.

Matéria originalmente publicada na agência Envolverde

Carta Verde

Biodiversidade, água, energia. Quando cuidaremos das nossas torres?



Washington Novaes
Na manhã de 11 de setembro de 2001 o autor destas linhas estava em Tefé, no Amazonas, preparando-se para embarcar no porto rumo à Reserva de Mamirauá, lá pelas bandas dos Rios Japurá e Solimões, onde seriam gravadas cenas para um documentário da TV Cultura de São Paulo chamado Biodiversidade: Primeiro Mundo é Aqui. Sentado na calçada em frente a um hotel, olhava enquanto a equipe carregava numa van os equipamentos de gravação. Até que o porteiro do hotel, correndo e batendo uma mão na outra, veio dizer, esbaforido: “Um avião derrubou o maior prédio de Nova York. Está lá, na televisão”. De fato, estava, deixando-nos todos perplexos. Mas era preciso partir. As “voadeiras” que nos levariam pararam, entretanto, num posto flutuante de combustíveis e lá havia uma televisão que mostrava um segundo avião derrubando uma segunda torre. Porém não tínhamos como esperar uma explicação, seguimos adiante. Nos cinco dias seguintes, como em Mamirauá não havia televisão nem telefone, ficamos, todos a circundar a reserva, a ver só água e florestas, sem nenhuma notícia, imaginando: será a terceira guerra mundial? Só no fim do quinto dia, num posto flutuante do Ibama, pudemos ver um noticiário de TV e entender o que acontecera.

Já se sabia, nesse 2011, que o Brasil detinha entre 15% e 20% da biodiversidade mundial e que essa é a maior riqueza real, concreta, do planeta (medicamentos, alimentos, materiais). Já se lutava, em várias frentes, por uma política de conservação efetiva para o bioma. Passados dez anos, o cálculo que se faz é de que 18% da floresta já tenha desaparecido e que se chegar a 20% pode haver “uma inflexão”, como tem advertido o conceituado biólogo Thomas Lovejoy (Folha de S.Paulo, 14/8): poderá haver mudanças fortes no regime de chuvas, afetando também Mato Grosso, o sul do País, até a Argentina. Experiente, Lovejoy diz que não nos devemos preocupar com ameaças do exterior, porque o mais grave já está aqui: “A pior forma de biopirataria é a destruição da floresta”.

Muitas vozes se somam à dele. O professor Paulo Moutinho, da Universidade Federal do Pará, lembra que “as florestas tropicais são o ar-condicionado do planeta” (Eco 21, julho 2011). O Instituto Internacional de Estudos Estratégicos alerta que “a miséria está transformando a Amazônia numa das principais rotas do tráfico internacional de armas e drogas” (Estado, 1.º/9). O próprio secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, se diz “muito preocupado” com o desmatamento, que “diz respeito a todos os países, é uma questão global”, até porque responde por 20% das emissões de gases que intensificam mudanças climáticas. E espera que esse seja um dos temas centrais da Rio+20 (Estado, 18/6). Só que o desmatamento voltou a crescer: 1.435 quilômetros quadrados de agosto de 2010 a maio de 2011 (mais 24%) e 6.081 km2 de florestas degradadas no mesmo período (mais 363%) – principalmente ao longo das principais rodovias, 65% em áreas privadas, 24% em assentamentos. Uma progressão que leva o prudente Financial Times (31/8) a dizer que “a Amazônia é um teste político para a presidente Dilma”.

Resta saber em que termos. A própria presidente autorizou a redução da área de parques e reservas para permitir discutíveis obras de hidrelétricas na região – que nem sequer terão como principal mercado os Estados do bioma: só 3,2% da energia de Belo Monte será consumida pelos paraenses e 4,1% pela Amazônia; 70% ficará para concessionárias de São Paulo e Minas, 14% para a Bahia (Diário do Pará, 31/8). Isto é, irá para linhões de transmissão, uma rede que já perde 17% e, segundo o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, precisaria ser praticamente toda trocada; foi implantada para resistir a ventos de até 80 quilômetros por hora e hoje enfrenta o dobro (Geodireito, 2/9).

E não é só. As pastagens respondem pela ocupação de 62% das áreas de desmatamento medidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Estado, 3/9). Mas o novo relatório sobre o Código Florestal, em discussão no Congresso Nacional, continua a abrir o facilitário para desmatadores, inclusive de reservas legais obrigatórias e áreas de proteção permanente – além de transferir para governos estaduais poder para legislar na área, facilitando as pressões locais de agropecuaristas e políticos.

E tudo isso vai agravar a situação da Amazônia. Exatamente na hora em que novo estudo sobre a biodiversidade mundial aponta que ela tem mais que o dobro das espécies até agora apontadas (8,7 milhões, pelo menos, quando se contabilizavam 3,1 milhões). Se a Amazônia tem um terço da biodiversidade brasileira e esta corresponde a pelo menos 15% da biodiversidade planetária, a Amazônia terá quase 500 mil espécies. Quanto vale isso, lembrando, segundo Lovejoy, que só o comércio mundial de medicamentos derivados de plantas movimenta pelo menos US$ 250 bilhões anuais – e o Brasil nem sequer participa dele, porque não destina verbas suficientes para pesquisas, como recomenda a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência?

Não bastasse, num momento em que o mundo agoniza com a chamada crise da água, cientistas descobrem a quatro quilômetros de profundidade, sob o Rio Amazonas, outro rio, que corre de oeste para leste em 6 mil quilômetros e desemboca perto da foz do grande rio (Estado, 25/8). Seu fluxo, de 3 mil metros cúbicos por segundo, é maior que o do Rio São Francisco. Em pouco mais de 20 minutos poderia abastecer com 350 litros (consumo diário) cada um dos 11,4 milhões de paulistanos. E isso num país que já tem quase 13% de toda a água superficial do planeta, fora a dos aquíferos subterrâneos.

Biodiversidade, água, energia. Quando passaremos a dar prioridade em nosso pensamento político e na estratégia a fatores como esses, principalmente quando as sucessivas crises financeiras mundiais indicam que o mundo terá de valorizar recursos concretos, em lugar de papéis?

Washington Novaes é jornalista.

Artigo originalmente publicado em O Estado de S. Paulo.

EcoDebate, 12/09/2011

Biodiversidade

Um assunto que lhe diz respeito
No Ano Internacional da Biodiversidade os pesquisadores se mobilizam na busca de soluções para a preservação das espécies – uma questão cuja importância vem sendo reconhecida cada vez mais. A diversidade biológica é crucial para a qualidade de vida da humanidade e, além de tudo, tem um enorme valor monetário
Texto: Natália Martino e Roberto Amado
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Este é um assunto de seu completo interesse. Talvez a palavra “biodiversidade” soe um tanto distante para aqueles que estão mergulhados nos desafios diários da vida moderna. Diversidade biológica, ou o grande número de espécies que existem em áreas específicas, pode parecer, para alguns, um detalhe de pouca repercussão nas questões mais fundamentais da nossa vida, como, por exemplo, a economia, a saúde ou as soluções sociais.

Mas não é. Cada vez mais, pesquisadores e entidades voltadas para o estudo da nossa diversidade biológica encontram relações diretas entre a quantidade de espécies vegetais e animais e o dia a dia dos seres humanos. No Ano Internacional da Biodiversidade, essa questão – a biodiversidade em nossa vida – tem sido abordada de maneira prática e objetiva. Para ser mais exato, tem sido contabilizada em valores financeiros – até como forma de sensibilizar a sociedade para a preservação das espécies do planeta.

Segundo o documento A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade, produzido pelo Programa Ambiental das Nações Unidas (Pnuma), os desmatamentos na Amazônia, por exemplo, são responsáveis por um prejuízo de até US$ 44 trilhões ao ano. Esse valor é atribuído aos “serviços” ambientais que a floresta fornece – como a purificação do ar e da água, o fornecimento de água doce e de madeira, a regulação climática, a proteção a desastres naturais, o controle da erosão e até a recreação. De acordo com a ONU, mais de 60% desses serviços estão sendo consumidos mais depressa do que podem ser recuperados. Embutida nessa conta está a diminuição da biodiversidade e, em outras palavras, a extinção de espécies. Seguindo esse raciocínio, o próprio Pnuma criou parcerias com 200 instituições financeiras, como bancos, seguradoras e fundos de pensão, para entender os impactos dos aspectos ambientais e sociais no desempenho financeiro – uma iniciativa batizada de Pnuma FI (Iniciativa Financeira).

O valor da biodiversidade, porém, não é contabilizado apenas pelos seus serviços. Há ainda uma enorme gama de produtos gerados pela diversidade biológica que também oferecem valores inestimáveis à espécie humana. São medicamentos, materiais para uso industrial, soluções de design e arquitetura e muitas outras aplicações práticas produzidas ou inspiradas pela natureza. A biodiversidade vem oferecendo soluções ao ser humano desde os tempos mais remotos, ainda que nem sempre esse valor tenha sido reconhecido.

Mas agora isso mudou. O tom que vem predominando ultimamente nas Conferências das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, cuja décima edição ocorreu em Nagoya (Japão) em 2010, é contábil: quanto vale a biodiversidade, qual é o prejuízo que representa sua diminuição e que investimentos são necessários para mantê-la.

E se a diversidade biológica tem grande valor, o Brasil possui um tesouro: juntamente com outros 16 países compõe o grupo dos megadiversificados, do qual é o primeiro colocado.
Por outro lado, esses mesmos países são aqueles que mais “desperdiçam” seu patrimônio: boa parte das 100 espécies que entram em processo de extinção diariamente é originária desse distinto clube. Um prejuízo provocado basicamente pela ação do homem ao invadir florestas, mangues e campos sem utilizar critérios preservacionistas e sem ter consciência dos danos que está causando, principalmente no longo prazo. É verdade, o patrimônio é farto, mas não é infinito. “Hoje, conhecemos cerca de 2 milhões de espécies. Mas a estimativa é que sejam de 15 a 30 milhões”, diz Luiz Eduardo Corrêa Lima, professor titular de biologia da Faculdades Integradas Tereza d’Ávila, de Lorena (SP).

Segundo ele, a importância da diversidade biológica está além do que ela pode nos oferecer como “serviços” – afinal, “é o registro genético de tudo o que aconteceu na evolução das espécies, um histórico biológico e evolutivo”. Assim, os motivos pelos quais a biodiversidade é um assunto que diz respeito a toda espécie humana – do individual ao coletivo – podem sensibilizar os mais diferentes setores da nossa sociedade – humanistas, ideólogos, ambientalistas e também, claro, e principalmente, homens de negócio com visão de futuro.

A diversidade pragmática

Novas áreas de pesquisa estabelecem relação direta entre
a biodiversidade e soluções práticas para o ser humano


Uma improvável campanha do tipo “salvem os carrapatos” soaria, no mínimo, estranha. Carrapatos não têm o charme e a atenção que as baleias e os pandas despertam – mas são tão importantes quanto. Assim como os mamíferos, as árvores ou qualquer forma de vida, esses parasitas exercem funções fundamentais em nosso ambiente e podem fornecer recursos inestimáveis para o conhecimento. Quem sabe disso, aposta: Ana Marisa Tavassi, pesquisadora do Instituto Butantan, em São Paulo, tem dedicado anos de estudo ao carrapato-estrela com o objetivo de desenvolver um remédio eficiente para o tratamento de vários tipos de câncer – e sua equipe já sabe que uma proteína da saliva dessa espécie mata células tumorais.

Esse é apenas um exemplo de como características físicas e químicas da flora e da fauna podem contribuir com soluções para as questões humanas. São remédios, alimentos, substâncias e insumos para a indústria que já foram desenvolvidos ou estão sendo testados. Ou, ainda, que não foram nem imaginados – um precioso tesouro guardado em segredo em tantas espécies desconhecidas que compõem a biodiversidade do planeta. Algumas delas não podem mais nos ajudar.

Um exemplo claro: em 1973 foi descoberta, na floresta tropical australiana, a rã conhecida como gastric-brooding frog, cuja tradução livre seria “rã de incubação gástrica”. Essa espécie guardava no estômago os ovos fertilizados e era lá que os girinos cresciam. Quando eram expelidos pela boca da mãe, já estavam completamente formados. Durante esse período de desenvolvimento do embrião, a produção de suco digestivo interrompia-se. Pesquisadores acreditam que o estudo dessa espécie poderia produzir medicamentos eficientes contra úlceras, por exemplo. Poderia, não pode mais. A rã está considerada extinta desde 1981.

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Em regiões da Amazônia 90% da vegetação dependem de abelhas para polinização
Atualmente, os motivos pelos quais as espécies se extinguem passam quase sempre pelo homem. Nos ecossistemas complexos, pequenas alterações podem promover o fim de uma espécie ou até mesmo de um ecossistema. Há estudos que mostram, por exemplo, que até 90% de algumas regiões da Amazônia e da Mata Atlântica dependem de abelhas para a polinização e a frutificação. Mas as populações tradicionais utilizam o mel como remédio e alimento e, para isso, não hesitam em derrubar árvores em que estão instaladas as colmeias. A pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Gislene Almeida Carvalho, explica que seria interessante que essas comunidades criassem os animais em caixas apropriadas com práticas de manejo adequadas. Desmatamentos, queimadas e até aragens da terra são fatais para as colmeias naturais, que se estabelecem em troncos ou nos solos.

Não só fatais. São economicamente prejudiciais. Se antes a natureza era vista como mera provedora de matérias-primas, agora os pesquisadores da chamada economia dos ecossistemas estão buscando conferir preços à biodiversidade preservada. Assim, minhocas, por exemplo, prestam um enorme serviço ao homem quando arejam o solo e o tornam mais fértil. Alguns pesquisadores da Nova Zelândia deram um valor monetário a esse serviço: R$ 5,50 por hectare de terra.

Utilizando esse mesmo tipo de raciocínio, o relatório A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade, que acaba de ser lançado no Brasil, avalia a produtividade de um ecossistema e sua contribuição em termos de bens e serviços. “Calcular o preço do meio ambiente natural é difícil, mas possível. Se os morcegos ajudam a controlar as pragas de uma determinada região, a sua extinção vai custar, no mínimo, o preço dos fertilizantes que precisarão ser gastos pelos agricultores locais”, diz Carlos Eduardo Young, professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Ainda que morcegos na grande maioria das vezes não controlem pragas”, diz o professor Luiz Eduardo Corrêa Lima, “a extinção deles causaria outros problemas até maiores.”

Mas essa conta quase nunca é praticada – principalmente quando não interessa. A mentalidade de muitas empresas e de grande parte da sociedade é acreditar que a natureza pode ser utilizada indiscriminadamente. Por exemplo, o peixe tem um valor de mercado. Mas quem o pesca ou o consome, não paga a conta do prejuízo que representa a diminuição da oferta de peixe naquele rio. O objetivo do relatório de economia ecológica é justamente contabilizar esse prejuízo e até incorporar esses custos à atividade humana. Afinal, se o canto dos grilos e o cheiro das flores não forem suficientes para nos sensibilizar a respeito da preservação, talvez valores monetários sejam.

De pé vale mais
Segundo relatório produzido em 2006 pelo Banco Mundial, destruir um hectare de Floresta Amazônica para fazer pasto pode render US$ 300 por ano. Mas se a floresta for mantida, o mesmo hectare poderá render cerca de US$ 7.500 por ano no mercado europeu de carbono. Há várias questões envolvidas nessa situação, incluindo a necessidade de o fazendeiro ter resultados no curto prazo. Mas o potencial econômico da floresta é muito maior do que a ausência dela.

foto: Frans Lating/ Corbis (DC)/Latingstock
Florestas que valem milhões
Os estudos do relatório Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade estimaram valores dos serviços oferecidos pelas florestas tropicais de Madagascar. Só no que diz respeito ao potencial farmacêutico chegou-se a aproximadamente US$ 1,6 milhão, valor baseado em medicamentos produzidos a partir da flora local. De acordo com o relatório, uma das florestas, a de Masoala, poderia oferecer cerca de US$ 380 mil só em serviços de proteção ao solo. E o valor final dessa floresta, levando-se em conta sua importância para a alimentação, o tratamento de doenças e o fornecimento de materiais de construção para mais de oito mil famílias ao redor do Parque Nacional de Masoala, foi estimado em cerca de US$ 4,3 milhões.

Natureza inteligente

Imitar as formas da fauna e da flora e aprender com os processos naturais. Por meio desses princípios básicos, a biomimética tem oferecido soluções simples e eficientes para questões cotidianas 

A folha de lótus, que emerge limpa e seca nos lugares mais improváveis, está sempre imaculada e verdejante, mesmo em meio ao lamacento ambiente das florestas úmidas após uma chuva de verão. Não é à toa que ela é símbolo de pureza em algumas culturas asiáticas. Sua superfície é formada por microestruturas que minimizam a área de contato com a água e a sujeira e é, ainda, repelente às poucas gotas de água que insistirem em buscar alguma aderência. Intrigado com essa capacidade da folha de lótus, o botânico alemão Wilhelm Barthlott estudou o fenômeno e ajudou a desenvolver uma tinta com as mesmas características. Faça chuva ou faça sol, ela se mantém limpa.

O lançamento da tinta, em 1999, é um exemplo de um movimento maior que atinge todas as áreas do conhecimento humano: se inspirar na natureza para desenvolver soluções para o homem. A isso chamamos de biomimética.

A prática não é uma novidade. Povos primitivos já observavam e copiavam o que viam à sua volta, porém “a humanidade viveu uma espécie de hiato nesse sentido”, diz Janine Benyus, uma das fundadoras do Biomimicry Institute (veja quadro na página 41). “Quando o homem aprendeu a sintetizar o que precisava a partir de petroquímicos, passou a acreditar que não necessitava mais da natureza. E, agora, voltamos a perceber que as lições naturais podem ser importantes.”

Rápido e silencioso
O Shinkansen, trem-bala japonês, é o mais rápido do mundo. Mas produzia ruídos que incomodavam a população do entorno. Até que o engenheiro Eiji Nakatsu, um ávido observador de aves, inspirou-se no bico de um pássaro, conhecido como guarda-rios ou pica-peixe, para remodelar a frente do trem. Depois disso, o Shinkansen, além de mais silencioso, passou a gastar 15% menos eletricidade e ficou 10% mais veloz.

Bateria mais duradoura
As cores das asas das borboletas fascinam quem as observa. Agora, a forma com que essas asas refletem a luz é a mesma utilizada em displays de vários aparelhos eletrônicos, uma tecnologia que economiza energia e produz imagem perfeita.

Água para todos
O diabo-espinhoso, pequeno réptil australiano, consegue toda a água que precisa diretamente da chuva ou de solos úmidos sem nenhum gasto de energia e sem sistema de bombeamento. A água é levada à boca do animal pela capilaridade da sua pele. Esse sistema de coleta e distribuição pode ajudar a suprir um bilhão de pessoas que vivem hoje sem água e reduzir a energia consumida no transporte desse precioso bem.

foto: J. Brew. Cortesia Biomimicry Institute
Controle natural de temperatura
Um grupo de engenheiros e arquitetos de Zimbábue construiu um prédio sem ar-condicionado que mantém sua temperatura interna independentemente das externas. A inspiração foi o sistema de ventilação dos cupinzeiros e o resultado foi o Eastgate, um prédio que consome apenas 10% da energia de uma construção convencional do seu tamanho.

Preservação da fonte de ideias

A Biomimicry Institute (Instituto de Biomimética, em tradução livre) é uma organização não governamental americana que tem se tornado referência no tema no mundo todo. Sam Stier, um dos diretores do instituto, concedeu esta entrevista exclusiva.

Horizonte Geográfico: Existe alguma novidade na biomimética?
Sam Stier: Inventores têm olhado para o mundo natural como fonte de inspiração há muito tempo. Leonardo da Vinci, por exemplo, estudou o voo dos pássaros para desenvolver seus famosos conceitos de máquinas voadoras. O que tem acontecido nos últimos 15, 20 anos, entretanto, é novo. Designs inspirados na natureza estão sendo observados em uma ampla gama de áreas simultaneamente. Da medicina à arquitetura, da indústria têxtil ao planejamento de cidades. Ferramentas tecnológicas mais sofisticadas têm nos permitido explorar a biologia e descobrir como a vida funciona com mais profundidade. Esses novos designs têm influenciado os celulares que usamos, os carros que dirigimos e até os carpetes sobre os quais caminhamos.

HG: Como a biomimética pode ajudar na conservação
da biodiversidade?
SS: Aumentando o amor e o respeito dos homens pela natureza. Mais especificamente, encorajando as pessoas e as empresas a apoiar a proteção dessa biodiversidade. Nós gerenciamos um programa chamado Innovation for Conservation (Inovação para a Conservação), por exemplo, que incentiva empresas que lucram com o design inspirado na natureza a doar parte desses lucros para a preservação.

Para saber mais sobre o instituto: www.biomimicryinstitute.org

Em busca dos tesouros
Pesquisadores enfrentam situações adversas para levar
ao conhecimento do mundo o tamanho da nossa biodiversidade. E ainda há muito para ser descoberto


A vida de um pesquisador da biodiversidade não é nada fácil no Brasil. Para começar, é preciso ficar dias em áreas tão remotas quanto a Amazônia, onde ter acesso a um telefone para falar com a família é luxo. Além disso, depois de passar dias vivendo ao estilo Indiana Jones, é preciso identificar e classificar os exemplares coletados – e há pouco taxonomistas no Brasil capacitados para fazer esse trabalho. “São apenas dez desses profissionais para toda a flora da Floresta Amazônica”, diz Adalberto Luis Val, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), onde há mais de dois milhões de exemplares de insetos aguardando classificação, muitos dos quais podem ser espécies ainda não descritas pela ciência.

Mas se é uma vida dura, o pesquisador brasileiro tem vantagens únicas. Afinal, apesar de tudo, novas espécies são descritas o tempo todo, graças ao enorme potencial de nossos biomas. Para exemplificar, de acordo com uma pesquisa realizada pelo Departamento de Botânica da Universidade Federal de Minas Gerais, uma nova espécie de angiosperma foi descrita a cada dois dias entre os anos 1990 a 2006, totalizando 2.875 novas espécies em 16 anos.

A riqueza dos ambientes naturais é tão grande e tão desconhecida que novas espécies podem ser descobertas até mesmo em parques urbanos. Em 2002, por exemplo, uma nova centopeia foi encontrada no Central Park de Nova York.
De acordo com Luiz Paulo Pinto, diretor do Programa Mata Atlântica da Conservação Internacional (CI-Brasil), no Brasil é raro uma pesquisa de campo voltar sem pelo menos uma espécie que ainda não tenha sido catalogada. Mesmo em grupos de animais muito estudados. Em 1990, por exemplo, pesquisadores encontraram, pela primeira vez, o mico-leão caiçara. “Já conhecíamos três espécies de mico-leões e não dava para imaginar que ainda existia uma quarta espécie”, relembra.

Essa grande biodiversidade faz com que o Brasil abrigue dois hotspots, conceito que define áreas que tenham grande quantidade de espécies endêmicas, ou seja, espécies nativas, originárias de um determinado local e, ao mesmo tempo, um grande índice de destruição dos biomas (veja mapa na página 46). Uma delas é a Mata Atlântica, cuja destruição é resultado do intenso povoamento da área desde a chegada dos portugueses até hoje – mais de 60% da população do país vive na faixa originalmente ocupada por esse bioma. Outro hotspot brasileiro é o Cerrado, que hoje tem apenas 20% da sua cobertura vegetal. Marlon Zortea, pesquisador da Universidade Federal de Goiás e chefe do grupo de pesquisa sobre biodiversidade do Cerrado, diz que esse bioma foi muito negligenciado durante toda a história do país e que tem sofrido grandes pressões, principalmente a partir da construção de Brasília e da concessão de incentivos agrícolas oferecidos pelo governo desde a década de 1970. A negligência gera não só a destruição de grande parte do bioma, mas também o desconhecimento dele. “O número de pesquisas e de artigos sobre o Cerrado é muito menor do que o de outros biomas”, diz Zortea, apesar da contribuição decisiva de biólogos como Mario Guimarães Ferri, o maior especialista em Cerrado no país.

foto: Gustavo Sá/Agbphoto
E não é só sobre a terra que a flora e a fauna mostram sua exuberância e variedade. Nas águas continentais ou oceânicas, milhares de espécies compõem ecossistemas ricos. Em 2010, um projeto internacional possibilitou que fosse realizado o Censo da Vida Marinha. O estudo apontou a Austrália como o país com a costa mais rica em número de espécies de fauna e flora, quase 33 mil no total, em uma lista na qual o Brasil aparece em 13º lugar, com pouco mais de nove mil espécies. O zoólogo Fábio Lang da Silveira, presidente do comitê de gestores de um dos principais bancos de dados criados pelo projeto, o Ocean Biogeographic Information System (Obis), diz que o baixo número de espécies catalogadas é fruto do grande desconhecimento da biodiversidade de águas profundas. “A pesquisa oceanográfica sempre foi e permanece sendo dispendiosa graças aos custos dos equipamentos e à mão de obra altamente especializada necessária para o seu desenvolvimento”, afirma.

Conhecer melhor esses biomas pode ser o primeiro passo para que eles sejam protegidos. E, nesse sentido, os pesquisadores que se isolam em matas fechadas, desertos distantes ou barcos perdidos no mar são um elo essencial da cadeia que pode determinar sua salvação ou destruição. É deles que pode nascer, um dia, o remédio que vai salvar nossas vidas ou, quem sabe, o design do avião que vai revolucionar os transportes.

Áreas prioritárias para a conservação
Em 1988, o ambientalista Norman Myers cunhou o termo hotspot para definir áreas com altos níveis de endemismo de plantas e grandes taxas de destruição de habitats. Nessa ocasião, Myers identificou dez florestas tropicais do mundo como hotspots, mas não estabeleceu critérios quantitativos para a classificação. Anos depois, em parceria com a Conservação Internacional, o ambientalista introduziu patamares quantitativos para o conceito.

A partir de então, para qualificar-se como hotspots, a região deveria abrigar no mínimo 1.500 espécies de plantas endêmicas e possuir no máximo 30% da sua vegetação original. A partir dessa quantificação, foram estabelecidos, em 1999, 25 hotspots que abrigavam 44% das plantas endêmicas do planeta e 35% dos vertebrados terrestres. De uma área que originalmente cobria 11,8% da superfície terrestre, essas 25 regiões já haviam sido reduzidas a 1,4% do planeta.

Paralelamente ao estudo dos hotspots, foram reconhecidas as vantagens em se investir nas áreas com biomas preservados, que foram chamadas de Grandes Regiões Naturais. Apesar de estarem mais preservadas, essas regiões estão sob crescente ameaças. Detentoras de pelo menos 70% da sua área original e com uma densidade populacional de menos de cinco pessoas por quilômentro quadrado, as Grandes Regiões Naturais com vasta riqueza biológica começaram a atrair a atenção dos ambientalistas.

Desacordos internacionais
Exemplares da flora e da fauna brasileiras são o substrato de um enorme número de remédios e cosméticos ao redor do mundo. Muitas vezes, o impulso para as primeiras pesquisas foi o conhecimento das comunidades tradicionais – índios, caboclos, quilombolas – que há gerações se utilizam desses bens naturais em seu cotidiano. Na grande maioria dos casos, porém, essas comunidades em nada se beneficiam dos lucros milionários que seu conhecimento e a natureza da sua região renderam a laboratórios e pesquisadores.

A lei brasileira apresenta uma série de restrições para a coleta de exemplares da fauna e da flora com fins de pesquisa. Mas, muitas vezes, essas restrições não são respeitadas. É o que chamamos de biopirataria. Desde a Eco-92, as nações discutem e tentam entrar em acordo sobre como deve acontecer o uso sustentável da biodiversidade. As discussões se estendem até hoje – principalmente no que diz respeito à repartição dos benefícios. Países megadiversificados, como o Brasil, querem ampliar essa repartição e dificultar o acesso à sua biodiversidade. No outro extremo, encontram-se aqueles que consideram a biodiversidade uma propriedade do planeta – e, nesse caso, exigem que seja defendida dos maus usos que o país em que se encontra fizer dela. “Eu, particularmente, penso que deve existir um meio-termo entre os extremos que oriente e beneficie o proprietário, mas que não prejudique a todos os outros que também podem ser beneficiários dessa propriedade. Nem sempre a posse indica o melhor uso e nem sempre o melhor uso é caracterizado e definido pela posse”, diz o professor Luiz Eduardo Corrêa Lima.

A importância da preservação das Comunidades Clímax

Luiz Eduardo Corrêa Lima
Professor titular de biologia da Fatea/Lorena/SP


Estamos em pleno Ano Internacional da Biodiversidade e aqui no Brasil vivemos no país de maior biodiversidade do mundo. Essa é a maior riqueza que uma nação pode possuir e nós deveríamos ser, portanto, o país mais rico do planeta. Pena que ainda não nos demos conta da importância desse bem que possuímos.

Em ecologia existe um conceito interessante e muito importante: Comunidade Clímax, o maior grau possível de biodiversidade numa área geográfica definida pelas condições químicas e físicas que nela atuam, como pressão, umidade e acidez. São essas condições abióticas que definem e que propiciam a gama da diversidade biótica.

Ora, o Brasil tem vários biomas, nos quais estão inseridos inúmeros ecossistemas específicos. E a biodiversidade de cada um deles só existe porque primariamente já existiam diversidade física e química compatível com o suporte de organismos vivos no local. Nesses diferentes biomas, as Comunidades Clímax se estabeleceram por meio de processos evolutivos naturais ao longo do tempo.

Não há como mudar isso, embora artificialmente seja possível tentar controlar o processo natural em algumas áreas. Aliás, o homem tem feito isso muito bem, porém com resultados que, como já era de se esperar, não são aquilo que devemos chamar verdadeiramente bons.

A geografia e a geologia de uma determinada área resultam de processos evolutivos naturais que interagiram sob vários aspectos numa complexidade de tal ordem que é impossível imitar com perfeição. Ora, se os organismos vivos e a diversidade dependem dessa estrutura primária geomorfológica que não se consegue mudar satisfatoriamente, então é óbvio que não há como mudar a condição da Comunidade Clímax de uma área ou região aumentando sua biodiversidade. Quando muito podemos plantar ou criar algumas espécies, mas certamente perdemos muitas outras, em número sempre maior, com a nossa interferência.

Temos poucas áreas ainda com Comunidades Clímax bem estabelecidas em nossos principais ecossistemas naturais, principalmente em áreas de Cerrado e de Mata Atlântica, onde a destruição tem sido muito intensa. Precisamos garantir que elas se mantenham para perpetuar os bancos genéticos que permitiram os seus estabelecimentos. Se essas áreas forem mantidas e seus respectivos entornos protegidos, a tendência é que elas naturalmente se ampliem. Isto é, as Comunidades Clímax tendem a se expandir para as áreas adjacentes. Nas regiões onde a intervenção humana já se deu de forma significativa, não há mais como reverter a situação, a biodiversidade primitiva já foi perdida.

Em suma, a Comunidade Clímax alcançada pela sucessão ecológica de uma área ao longo do tempo por processos naturais deveria se constituir no principal interesse da biologia da preservação. Quer dizer, é preciso ampliar as Unidades de Conservação e preservar áreas naturais, mas é preciso, principalmente, preservar áreas naturais primitivas, que contenham suas Comunidades Clímax ainda estabelecidas e bem equilibradas, para que possamos garantir a manutenção integrada da informação que precisamos daquela região. O conhecimento dessas Comunidades Clímax pode nos trazer informações importantes da biodiversidade biológica, mas também da biodiversidade antrópica que se estabeleceu nessas áreas.

O Brasil certamente poderá ter um futuro melhor se conhecer o seu espaço e os organismos vivos que nele habitam. Preservar a biodiversidade é ter certeza de que estaremos projetando maior possibilidade para conseguirmos estudar e trabalhar os recursos naturais no interesse da nação.
Revista Horizonte

Amazônia - O tesouro escondido na selva

A Amazônia tem a maior biodiversidade do planeta,
mas apenas 10% dela é conhecida pela ciência.
A falta de pesquisas e as leis contra a biopirataria
impedem que o Brasil aproveite o potencial
de uso da flora e dos microrganismos na medicina
e na indústria



Leandro Beguoci, de Manaus
Araquem Alcântara
Rainha da floresta
Crianças brincam nas raízes de uma sumaúma, a maior árvore do Brasil, que chega
a 60 metros de altura: 25% das substâncias usadas hoje no tratamento de tumores
vêm de florestas tropicais


Em poucos quilômetros quadrados da Floresta Amazônica há mais espécies de plantas do que em toda a Europa. Há mais espécies de animais do que na América Central. Uma única árvore pode servir de lar a 1 700 tipos de invertebrados, que vão de formigas a aranhas, de abelhas a besouros. A Amazônia é a região de maior biodiversidade do mundo – mas nós, brasileiros, só temos uma pálida ideia dessa exuberância viva. Calcula-se que apenas 10% de todas as formas de vida que a Floresta Amazônica abriga já tenham sido estudadas e catalogadas. Essa falta de conhecimento científico sobre o bioma é uma das fragilidades amazônicas. O desconhecimento representa um obstáculo para a produção de riqueza a partir da floresta em pé. É impossível agregar valor ao que não se conhece. Estima-se que a flora, a fauna, as bactérias, os fungos e outros microrganismos da floresta guardem um enorme potencial para a produção de remédios e alimentos e para vários setores da indústria. A riqueza escondida, porém, não vale nada. É preciso mãos e cérebros para descobri-la – e é justamente isso que falta de forma crônica à Amazônia.
O câmpus da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto tem mais pesquisadores do que todo o estado do Amazonas. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul tem mais que o dobro do número de pesquisadores do Pará, o estado líder na região em matéria de cientistas qualificados. A Universidade de São Paulo tem o triplo de doutores de toda a Amazônia. A região é cenário de 18% das pesquisas em biodiversidade no Brasil, contra 36% da Mata Atlântica, embora essa última represente 2% da Amazônia. A falta de pesquisadores é agravada pela baixa qualidade dos cursos de formação de cientistas. Nenhum curso de mestrado ou doutorado de universidades amazônicas alcança a nota máxima, 7, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), instituição ligada ao Ministério da Educação. A maior parte leva 3, a nota mínima para não fechar as portas.
Um prédio erguido em meio às indústrias da Zona Franca de Manaus serve de símbolo do quadro desolador da pesquisa científica na Região Norte. A construção abriga o Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), inaugurado em 2002 e dotado de 25 laboratórios para explorar o potencial da floresta. Há bons motivos para criar um centro de excelência em biotecnologia na Amazônia. O Instituto Nacional do Câncer, nos Estados Unidos, estima que 25% de todas as substâncias usadas para tratamento de tumores no mundo, hoje, venham de florestas tropicais. Só que o CBA virou um elefante branco – ou, como zombam os amazonenses, uma anta branca. O centro já consumiu 67 milhões de reais e ainda não produziu resultado algum.
Após a inauguração do CBA, sua administração foi entregue provisoriamente à Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa). Desde então, os seis ministérios responsáveis pelo projeto se perdem em discussões burocráticas tentando definir qual deve ser seu modelo de gestão. A primeira opção seria uma empresa pública só de pesquisas, com fins lucrativos, nos moldes da Embrapa. A segunda, um instituto de pesquisa combinado a uma instituição de ensino superior, como o Inpa, com objetivos puramente científicos. Para a Suframa, o CBA é uma batata quente. O órgão não sabe o que fazer dele nem tem autonomia para decidir seus rumos. "O Brasil precisa aprender a transformar pesquisa em dinheiro e o CBA pode fazer isso, mas não é a vocação da Suframa comandar um instituto de biotecnologia", diz o economista Elilde Mota de Menezes, da Suframa. Enquanto isso, semiparalisado, o CBA se limita a fazer análises químicas para instituições de pesquisa e empresas particulares, subutilizando seus aparelhos modernos, avaliados em 20 milhões de reais. Um dos últimos trabalhos do órgão, acredite-se, foi avaliar a resistência ao clima de uma marca de bombons fabricados em Manaus.
Para tirar a Amazônia do limbo científico, é preciso também acabar com um mito tão arraigado quanto o do boto-cor-de-rosa – o mito da biopirataria. Segundo ele, ardilosos cientistas estrangeiros entram na floresta e roubam do país plantas, animais e microrganismos valiosos para a indústria farmacêutica, sem dar satisfação ao país. A partir de 2001, para se precaver contra a suposta biopirataria, um cipoal de decretos e normas burocratizou a produção científica e pôs uma série de obstáculos às pesquisas. "O mesmo governo que financia o pesquisador, com bolsas, desconfia dele e o trata como biopirata em potencial", desabafa o paulista Thomas Lewinsohn, professor da Unicamp e um dos maiores especialistas brasileiros em mapeamento da biodiversidade. Para coletar plantas da floresta legalmente, um pesquisador, brasileiro ou estrangeiro, precisa de uma licença do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), uma autarquia ligada ao Ministério do Meio Ambiente. Para transportar as plantas que encontrar pelo caminho ao laboratório, ele necessita de uma segunda licença do mesmo órgão. A licença pode demorar dois meses para sair. Caso o cientista deseje estudar os usos potenciais da planta que coletou, terá de pedir uma terceira licença a outro órgão, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (Cgen), formado por representantes de dezenove entidades – entre elas a Fundação Cultural Palmares e a Fundação Nacional do Índio. E quanto tempo demora essa licença? Só o cacique sabe. Não menos do que vários meses. Existem hoje 167 processos desse tipo parados no Cgen. Não é à toa que muitos cientistas desistem no meio do caminho, como o químico Lauro Barata, da Unicamp. "É impossível lidar com a burocracia federal na área de pesquisa", afirma. "Um único parágrafo das leis te enlouquece."
Fotos Cristiano Mariz
Pesquisa que vira dinheiro
Cientista da Embrapa, em Belém, analisa o tucumã em laboratório.
Estudos indicam que desse fruto pode ser extraído um azeite mais
nutritivo que o de oliva
O resultado da caça às bruxas da biopirataria é a debandada de pesquisadores estrangeiros do país. O Inpa, tradicional parceiro de organismos internacionais, firmou apenas dois acordos de pesquisa entre 2002 e 2007. A retomada só aconteceu em 2008, quando foram firmados seis acordos de cooperação com órgãos de outros países. Diz Ima Vieira, ex-diretora do Museu Paraense Emílio Goeldi: "Os pesquisadores estrangeiros sérios, que estudam biodiversidade, foram embora. Cientista que vem ao país amparado por instituições respeitadas não é biopirata. É mais fácil um turista levar algo ilegalmente da floresta do que um pesquisador". Muitos estrangeiros migraram para a Amazônia peruana ou para a Guiana Francesa, onde o cientista é tratado como parceiro, não como ameaça.
Boa parte do conhecimento que se tem sobre a Amazônia se deve aos estrangeiros. Um dos principais livros sobre a flora da região (e do Brasil) foi escrito no século XIX pelo botânico alemão Carl Friedrich Philipp von Martius, em que são descritas 22 700 espécies de plantas. A maior coleção de plantas amazônicas está no Jardim Botânico de Nova York. Para saber se uma espécie é nova ou não, é útil recorrer aos americanos. Os dois projetos de mapeamento de biodiversidade da Amazônia mais importantes, hoje, têm participação de cientistas e organizações de outros países. A ONG americana Conservação Internacional é a principal patrocinadora de um estudo que visa a mapear a biodiversidade nas áreas tropicais do mundo. Seu projeto de longo prazo é saber como as mudanças no clima do planeta afetam as espécies. Outro projeto é o Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, que pretende descobrir, enfim, quantas espécies existem na Amazônia e como elas se distribuem. Um de seus idealizadores é o biólogo australiano William Ernest Magnusson, de 57 anos, trinta dos quais atuando na Amazônia. "Nosso papel é dizer para o governo onde ele deve construir uma estrada e onde será mais vantajoso preservar a selva porque existem riquezas potenciais por ali", explica Magnusson. Conhecer o bioma amazônico a fundo é um passo importante para preservar a floresta.
Vida de cientista
A bióloga paulista Andressa Scabin, do Inpa, no Rio Negro, no município
de Novo Airão, a quatro horas de carro e barco de Manaus: 100 dias por
ano na floresta para pesquisar a biodiversidade de árvores de regiões alagadas

O governo incomoda mais que o mosquito
O entomólogo americano William Overal passou 33 dos seus 62 anos como funcionário do Museu Paraense Emílio Goeldi tentando entender por que a Amazônia tem a maior biodiversidade do mundo. Isso significa compreender por que há tantas espécies de abelhas, borboletas e formigas em trechos pequenos de mata e o que influencia sua distribuição. Seus artigos foram publicados nas principais revistas científicas do mundo. Em seu escritório repleto de animais invertebrados de cores e formas variadas, coletados em expedições que lhe custaram cinco malárias, Overal só perde a paciência quando comenta o tamanho da burocracia para fazer pesquisa no Brasil. "O governo precisa encontrar uma vocação melhor do que atormentar pesquisadores", diz ele. "Se o governo usar o que nós sabemos, em vez de criar empecilhos para a pesquisa, ainda dá tempo de salvar a floresta."

O multiplicador de espécies

Graças ao botânico Michael Hopkins, nascido no País de Gales, o número de espécies conhecidas na área mais estudada da Floresta Amazônica, a Reserva Ducke, dobrou. Formado em Oxford, Hopkins vive no Brasil há dezesseis anos. Ele ajudou a reorganizar os herbários de Manaus e de Belém e, durante a tarefa, descobriu que muitas das plantas estavam classificadas com nome errado. Ele também é autor de uma pesquisa sobre a localização das áreas da Amazônia menos exploradas pelos cientistas, o que os ajuda a organizar expedições em busca de plantas raras e desconhecidas. A partir de 2001, Hopkins viu seu projeto de mapeamento da flora amazônica ser abortado por causa da legislação contra a biopirataria.
O financiamento internacional para seu trabalho secou porque os investidores estrangeiros tiveram medo de ser criminalizados. "Há um vazio de vinte anos de pesquisas básicas sobre a flora", diz Hopkins.

Mundo árvore

Mundo árvore
Confira todo o ecossistema que pode viver em uma árvore.
por Texto Yuri Vanconcelos
Uma única árvore pode abrigar um ecossistema complexo - das dezenas de seres vivos que habitam a água acumulada nas bromélias aos tucanos que fazem do caule seu ninho de amor. Abaixo, selecionamos como morada uma espécie fictícia da mata Atlântica e apresentamos os animais e as plantas que dependem dela para sobreviver.

MOSCA ANASTREPHA FRATERCULUS
As larvas começam a vida nos frutos. Quando crescem, não mudam de bairro: voam sempre ao redor das árvores da vizinhança.

ABELHA-CACHORRO
Não morde ninguém: é desprovida de ferrão. Constrói na copa das árvores ninhos de barro e cera parecidos com cupinzeiros e se alimenta da seiva das plantas.

FORMIGA CAÇAREMA
Milhares de espécies de formigas vivem em árvores. A caçarema se alimenta de gotículas de néctar eliminadas pelos ramos. Em troca, protege a planta de pragas como pulgões e cochonilhas.

GATO-MARACAJÁ
O mais arborícola dos felinos gasta as manhãs dormindo nos galhos. À noite, vai tocar a vida: come passarinhos, roedores e acasala. Mas a vida pode trazer surpresas: há sempre o risco de um ataque dos temíveis sagüis.

CUÍCA
Parente do gamba, esse pequeno marsupial costuma ser encontrado na copa das árvores, onde caça os insetos que gosta de comer. Raramente desce ao chão.

SABIÁ-CICA
Costuma ser visto na parte superior da copa. Mas, na hora de fazer o ninho, prefere buracos no tronco. Lá encontra suas comidas prediletas: sementes, insetos e larvas

MORCEGO-DE-FRUTAS
A vida passa pelo intestino do morcego: ele come frutas, voa e defeca as sementes. Das fezes, nascerá uma nova árvore.

VESPA
Também chamada de marimbondo, poliniza as fl ores das orquídeas e usa os galhos para pendurar seu ninho.

PERERECA MARSUPIAL
A fêmea carrega os ovos nas costas até que os girinos estejam prestes a nascer. Então ela os transfere para a água nas bromélias. E fi ca por lá para comer: o lugar é ótimo para caçar insetos.

ARANHA ARANEUS

Faz belíssimas teias geométricas na folhagem. E se aproveita da diversidade que habita as árvores para capturar suas presas.

IGUANA-VERDE

Quando fi lhote, ela tira dos galhos os insetos que come. Adulta, torna-se vegetariana: passa a se alimentar apenas de folhas.

RÃ-BUGIO

Esta perereca esverdeada usa os galhos para acasalar. A fêmea coloca os ovos nas folhas, que depois são dobradas em forma de tubo para proteger os futuros fi lhotes.

BICHO-PREGUIÇADE-COLEIRA

As folhas alimentam e protegem: quando não estão na boca, ajudam a preguiça a se camufl ar de predadores como a harpia e o gavião.

COBRA-DE-VEADO

Também conhecida como suaçubóia, vive enrolada em galhos. Lagartos, aves e roedores que aparecem quando bate a fome são mortos por constrição.

TUCANO-DEPAPO-AMARELO

Os tucanos fazem do tronco seu ninho de amor. É lá que eles se encontram. Ali o macho oferece um fruto. Se a corte é aceita, eles realizam a cópula. Tudo dura alguns segundos.

SAGÜI-DA-SERRA

Na hora das refeições, raspa o tronco com os dentes para se alimentar da seiva. Costuma viver em grupos de 5 a 15 animais.

MICO-LEÃO-DECARA-DOURADA

Vive trepado nas árvores e se alimenta de insetos e frutos. À noite, para se manter protegido de seus predadores, procura abrigo em buracos dos troncos.

PICA-PAU-REI

Considerado o maior picapau do Brasil, com 36 cm e 200 g, faz seu ninho em ocos nos troncos. Na hora das refeições, martela o tronco com força, perfura a casca e captura insetos com a língua pegajosa de ponta afi ada.

MONO-CARVOEIRO

Também chamado de muriqui, é encontrado somente na mata Atlântica. Chega a 15 kg – é o maior primata do continente americano.

BESOURO

Com cerca de 6 cm, vive na mata e sobe nas árvores para se alimentar. Come a resina que escorre de cortes no tronco ou frutas em decomposição.

CIPÓS

Crescem no solo e se agarram às árvores ainda pequenas. Quando elas crescem, os cipós pegam carona. Lá do alto, ajudam animais a se locomover entre as copas.

ARANHACARANGUEJEIRA

As caranguejeiras do gênero Lasiodora são as mais comuns na mata Atlântica. Fazem seus ninhos no pé das árvores, sob folhas secas.

LACRAIA

Dá expediente na casca do tronco, onde caça pequenos insetos. Chega a medir 7 cm.

CUPINS 

Suas colônias abrigam milhares de indivíduos de paladar duvidoso: comem tanto a árvore viva quanto troncos mortos sobre o solo.

BORBOLETA
Tem asas tão verdes que se confundem com as folhas da mata. Frutas fermentadas servem como fonte de néctar que ela utiliza como alimento.

CIGARRAS 

Quando as ninfas nascem, fi cam enterradas no solo e se alimentam da seiva da raiz. Adultas, sobem na vida: costumam ser vistas na copa.

BROMÉLIA

É a comunidade hippie da árvore: na água entre as folhas se reúnem insetos, larvas e qualquer um que queira compartir a bebida.

MACACOPREGO-DE-PEITOAMARELO
Faz o tipo caseiro: raramente sai das árvores. Ele come, reproduz e descansa nos galhos. Só vai ao chão para beber.

MINHOCA
Seu deslocamento cria galerias que ajudam a drenagem do solo. Assim, a água penetra na terra e alimenta a raiz.

MUSGO
Um centro de gosmas: o tapete verde sobre o tronco serve de alimento e abrigo para sapos, lesmas e caracóis. Mas pelo menos o efeito visual é bonito.

Fontes: Adriano Paglia, Afrânio Augusto Guimarães, Carlos Brisola Marcondes, Carlos Campaner, Carlos Einicker Lamas, Dante Pavan, Eduardo Wienskoski , Eliana Marques Cancello, Felipe Toledo, Flávio Gandara, Helenice Mercier, Jaime Aparecido Bertolucci, Luís Fábio Silveira, Odair Correa Bueno, Osmar Malaspina , Raquel Lima da Silveira, Rogélio Dosouto, Rosângela Branchini, Sandra Regina Visnadi, Tasso Leo Krugner.

Revista Superinteressante

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