sexta-feira, 19 de julho de 2013

ILHAS OCEÂNICAS


De olhos bem abertos para a biodiversidade do arquipélago de Abrolhos, no Sul da Bahia
Fernanda Dutra (fernanda.dutra@oglobo.com.br)
CARAVELAS - Entre tantos nomes de origem indígena, os descobridores tiveram a chance de batizar um lugar especial: o arquipélago de Abrolhos, a 70 quilômetros do litoral. Os primeiros registros históricos da região com maior biodiversidade do Atlântico Sul datam de 1503, quando o navegador Américo Vespúcio teria alertado ao perigo de naufrágio diante de tantos recifes: "abram os olhos" - contam os guias. É quase por aí, exceto que Vespúcio só usou uma palavra já conhecida. Abrolhos são recifes ou baixios perigosos para as embarcações.

Os riscos são mínimos hoje em dia. A bordo de um catamarã, o trajeto entre o arquipélago e o porto mais próximo, na cidade de Caravelas, dura em média três horas. Entre julho e novembro, o tempo passa voando. É a temporada de reprodução das baleias jubarte, que vêm da Antártica se acasalar nas águas de temperatura amena da região ao Sul da Bahia e Norte do Espírito Santo. De uma população em média de 9 mil baleias, o Instituto Jubarte estima que 80% esteja na região de Abrolhos. Desde 1986, quando a caça às baleias foi oficialmente proibida, a população das jubartes tem crescido exponencialmente, em média 7% por ano. A observação de baleias é uma atividade monitorada pelo instituto, que envia representantes na maior parte das viagens. Até avistar o primeiro jato d'água, a ansiedade é grande. Mas depois são tantos jatos, nadadeiras e caudas por todos os lados... Às vezes, até em dezembro se avista alguma jubarte atrasada para voltar às águas frias da Antártica.
Se estiver por lá no auge do verão, não se desanime. Os golfinhos estarão ansiosos por voltar à cena.
O farol da ilha de Santa Bárbara é o primeiro sinal do arquipélago, composto por outras quatro ilhas: Siriba, Redonda, Sueste e Guarita. Santa Bárbara, onde existe um farol instalado desde 1861, está sob jurisdição da Marinha. As demais fazem parte do Parque Nacional Marinho de Abrolhos.

Jornal O Globo
Clique no titulo para acessar as informações

Na estação científica e no farol de São Pedro e São Paulo, os enviados especiais do "Estado" mostram a rotina dos pesquisadores no pequeno arquipélago, só acessível de barco.





Jornal O Estadão

Abra os olhos nessas águas

A advertência que deu nome aos recifes do litoral baiano hoje se volta para os projetos econômicos, como os viveiros de camarões, que podem prejudicar o maior banco de corais do Atlântico Sul

Texto: Sérgio Adeodato

"Quando estava a caminho de Abrolhos pela primeira vez, tinha apenas uma vaga idéia do que me esperava. Minha experiência, como mergulhador e biólogo marinho, limitava-se até então aos costões rochosos do Sudeste do Brasil. No primeiro mergulho naquelas águas do litoral baiano, compreendi o significado da alta diversidade de vida que existe nos ambientes de corais. Meu objetivo como pesquisador era estudar o comportamento dos peixes limpadores, aqueles que se alimentam de parasitas que ocorrem na superfície corporal de outros peixes. A variedade de organismos, principalmente os que recobriamo fundo do mar, me deixou fascinado. Corais, algas, esponjas e diversos outros seres vivos formavam um mosaico de cores e formas como um tapete multicolorido. Em um espaço de 20 centímetros quadrados podiam ser vistas até sete espécies diferentes de corais! Naquela viagem inicial, mergulhei pela primeira vez com tubarões, que circundavam recifes gigantes, conhecidos como "chapeirões", com fendas e cavernas nas quais se abrigavam muitos cardumes. Foi um período maravilhoso de vivência e aprendizado que mudaria minha vida para sempre. Saí do arquipélago coma impressão de que aquela experiência representava apenas o início de uma grande viagem."

Ronaldo Francini-Filho

Cinco ilhas compõem o arquipélago de Abrolhos. A maior é Santa Bárbara, com formato alongado. Ao lado estão Redonda e Siriba. Há ainda as pequenas Guarita e Sudeste

O relato do biólogo paulista Ronaldo Francini-Filho, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), hoje à frente de pesquisas destinadas a conhecer e proteger o Arquipélago de Abrolhos, não é apenas uma visão emocionada. Retrata a riqueza de uma das regiões de maior diversidade marinha do Oceano Atlântico, onde a quantidade de espécies endêmicas, aquelas só encontradas ali, é quatro vezes maior do que nas águas cristalinas do Caribe. "Palavras não bastam para descrever tamanha beleza cênica”, afirma o biólogo, que há nove anos estuda os recifes de corais de Abrolhos em parceria com outros pesquisadores, um trabalho que envolve uma logística complexa, muitos dias de mar e quase quinhentos mergulhos por ano.

Nesse pedaço do litoral brasileiro se localizam os maiores e mais belos bancos de corais do País e do Atlântico Sul. A região é um alargamento da plataforma continental, formando um platô de águas rasas com aproximadamente 56 mil quilômetros quadrados entre a foz do rio Jequitinhonha, no município de Belmonte (BA), e a foz do rio Doce, em Linhares (ES). Trata-se de um complexo de ecossistemas costeiros e oceânicos ricos em nutrientes, que compõe um grande refúgio marinho.


Em Abrolhos, o atobá-marrom pode ser encontrado em todas as ilhas do arquipélago. Nidifica no solo ou sobre as pedras
A natureza esculpiu em Abrolhos cenários submarinos que servem de abrigo à fauna marinha, com destaque para o coral-cérebro, que tem formato de cogumelo gigante e atinge até 25 metros de altura e 50 metros de diâmetro. O lugar atrai peixes em grande quantidade: garoupas, badejos, vermelhos e muitos outros. Em busca de alimento farto, as baleias jubarte freqüentam suas águas entre julho e novembro, para dar à luz e amamentar os filhotes. Os peixes também servem de banquete para as aves - atobás brancos e marrons, fragatas, grazinas e algumas espécies migratórias. Ao lado das tartarugas marinhas que ali desovam, as baleias são um espetáculo à parte, um cenário só observado nas cinco ilhas de origem vulcânica que compõem o arquipélago.

O aviso do nome
No século 16, essa estrutura submarina era um perigoso obstáculo para as antigas caravelas que cruzavam o Atlântico rumo ao Novo Mundo. Tanto que o alerta dos navegadores para "abrir os olhos” naquelas paragens acabou inspirando o nome do arquipélago - Abrolhos. Diversos naufrágios ocorridos no passado são prova disso. Hoje, no entanto, o sinal de advertência que há séculos ronda os recifes de Abrolhos está dirigido para uma questão bem diferente: a conservação ecológica. O foco das atenções de pesquisadores, ambientalistas e autoridades são projetos econômicos potencialmente capazes de prejudicar o delicado equilíbrio dos bancos de corais e dos ecossistemas relacionados.

O alerta foi disparado depois que um megaprojeto de carcinocultura (criação de camarão em cativeiro) começou a ser instalado, há pouco mais de um ano, pela Cooperativa dos Produtores de Camarão do Extremo-Sul da Bahia (Coopex) na borda dos manguezais de Caravelas, uma das portas de entrada para os recifes. Na região, distante 70 quilômetros da costa, fica o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, o primeiro do gênero criado no País, em 1983, onde a vida aquática, incluindo os corais, estão protegidos por lei. "Os manguezais funcionam como berçários para a maioria dos peixes que habitam os recifes em meio ao oceano”, observa o biólogo Guilherme Dutra, pesquisador da Conservação Internacional, entidade ambientalista que apóia diversas pesquisas na região.

Pesquisadores coletam pedaço de pele para fazer exame de DNA de baleia nos Abrolhos
O problema é que, para abastecer os tanques onde os camarões são criados, é necessário fazer a dragagem do manguezal. "Esse processo retira da natureza a água cheia de organismos nos primeiros estágios de vida, devolvendo para o ambiente descargas de matéria orgânica em decomposição e resíduos de produtos químicos utilizados na criação dos crustáceos em cativeiro”, afirma o pesquisador. O projeto, segundo ele, prevê a extração de 880 mil metros cúbicos por dia de água, reduzindo nos mangues a quantidade de larvas que iriam se transformar em peixes herbívoros. Sem eles, aumenta a quantidade de algas que competem por espaço no fundo do mar com os corais, elevando os riscos de doenças e mortalidade desses organismos.

"O estuário de Caravelas é o mais importante para a alimentação do complexo de Abrolhos e qualquer impacto que resulte no seu empobrecimento biológico pode ser fatal”, afirma Dutra. Com investimento de R$ 60 milhões, os tanques estão previstos para ocupar 1,5 mil hectares dentro de uma área que já tinha sido submetida a estudo para criação de uma zona de proteção ambiental - a Reserva Extrativista do Cassurubá. Com cerca de 30 mil hectares, o lugar guarda um dos mais importantes manguezais da costa brasileira, explorado por 350 famílias de catadores de mariscos e crustáceos.

O perigo dos camarões

Entre as possíveis conseqüências, estão os prejuízos à pesca artesanal, hoje meio de sustento de 20 mil pessoas na região, e também ao turismo, que emprega 80 mil trabalhadores. O assunto foi tema das audiências públicas organizadas para debater a obra, das quais participaram lideranças contra e a favor do projeto. Uma parte da população acredita que a criação de camarão pode trazer emprego e desenvolvimento para a região.

Cassarubá vai abrigar uma reserva extrativista. Em seus manguezais se reproduzem peixes dos recifes de corais
A engenheira de pesca Luciana Queiroz, da organização não governamental Terramar, de assistência a projetos de pescadores cearenses, não recomenda a experiência. "No Ceará, onde a criação de camarão existe há mais tempo, a atividade teve impacto muito negativo para o ambiente”, afirma.

O Ceará é um dos maiores produtores nacionais de camarão, importante item de exportações do País. Em 2005, segundo as últimas estatísticas publicadas pela Associação Brasileira de Criadores de Camarão, o Brasil exportou mais de 33 mil toneladas, ao valor de US$129 milhões.

Em Abrolhos, o alerta é contra a degradação dos corais que, em todo o mundo, estão ameaçados pelo desenvolvimento acelerado e sem controle das zonas costeiras. Independentemente da polêmica econômica, os cientistas temem o impacto que qualquer alteração possa trazer ao ambiente. Para prevenir esses impactos, a região é palco de inúmeras pesquisas.

"Conhecer é essencial para preservar”, ressalta o geólogo Ruy Kikuchi, coordenador de um estudo que faz parte do Programa Institutos do Milênio, do governo federal, para monitorar a saúde dos corais. Analisando imagens de satélite, a equipe de Kikuchi avalia se os recifes da região já sofrem os impactos das mudanças climáticas globais. Um dos efeitos é o branqueamento dos corais, um problema causado, entre outros fatores, pela elevação da temperatura do oceano. Essa alteração reduz a quantidade de algas que fornecem alimento aos corais e permitem a fixação do carbonato de cálcio.

O estudo é importante porque a fartura de espécies que buscam alimento e abrigo nos recifes é a base da atividade pesqueira no extremo-sul da Bahia. Recente levantamento, realizado pela Conservação Internacional, mostrou que, das 293 espécies de moluscos encontradas na região dos recifes, 19 são novas para a ciência. O mesmo ocorreu com oito espécies de peixes. Os pesquisadores querem agora estudar o grau de dependência dos peixes do arquipélago em relação aos ambientes costeiros, como os manguezais, ameaçados de destruição.


Comunidades ribeirinhas subsistem da pesca artesanal e da coleta de mariscos e crustáceos
Uma frente de seis senadores do Espírito Santo e da Bahia, ligados à Coopex, responsável pelo projeto, chegou a propor um decreto legislativo para acabar com a zona de amortecimento, mas a idéia não foi adiante devido a oposição da bancada ambientalista. Hoje há seis processos na Justiça contra a área de proteção no entorno do parque. Além disso, o governo da Bahia, que perdeu as últimas eleições, entrou em dezembro de 2006 com pedido de liminar na Justiça Federal para abrir a região a esses projetos econômicos.

"A tendência é esse processo ser revertido, porque apoiamos a zona de amortecimento”, afirma o atual secretário de Meio Ambiente da Bahia, Juliano Matos, que tomou posse em janeiro de 2007 com o novo governo. Para ele, "a região de Abrolhos não precisa de projetos de carcinocultura, porque já tem na beleza natural e na biodiversidade um importante ativo econômico para gerar renda, como ocorre com o turismo”

Os desafios do parque

Com 91 mil hectares, o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos protege apenas um pequeno pedaço dos bancos de corais da região. No total, os recifes se estendem por uma gigantesca área de 9 milhões de hectares, equivalente aos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo juntos. Estudos científicos são atualmente desenvolvidos para sustentar a revisão do plano de manejo do parque com novas regras para a sua exploração e manutenção. Entre as prioridades, está a fiscalização contra a pesca predatória. Hoje, o Ibama tem apenas dois funcionários de nível superior e um fiscal para combater a captura ilegal de espécies marinhas em toda a área. Ações de repressão são realizadas apenas em campanhas periódicas com apoio da Polícia Federal. Com o projeto Redes de Unidades de Conservação Costeiras e Marinhas, do Ibama, Abrolhos deverá receber uma parte dos R$ 7 milhões repassados pela Shell como compensação ambiental pelas atividades que desenvolve na região. O dinheiro será aplicado na compra de lanchas e na contratação de uma equipe de fiscais.

Pretende-se também um controle maior do turismo. Recente estudo avaliou que Abrolhos tem capacidade de receber no máximo 225 pessoas por dia sem riscos de degradação ambiental. Há dois anos, com recursos de compensação ambiental da Aracruz Celulose, um centro de visitantes foi instalado em Caravelas, de onde zarpam os barcos com visitantes para o arquipélago. Para evitar degradação, foram mapeados os lugares onde o mergulho é permitido - pontos alcançados após três horas de viagem de barco desde a costa. O desembarque para percorrer trilhas e observar aves é autorizado apenas na Ilha Siriba, uma das cinco que compõem o arquipélago

Revista Horizonte Geográfico

Atol das Rocas

Restos de corais se
transformam em “terra firme”
e formam paraísos ecológicos
no meio do oceano

... Navegamos assim muito tempo, entre tormentos sucessivos, até cerca de duzentas léguas do continente. Avistamos então uma ilha deserta (...) Costeando-a pela esquerda observamos que era verdejante de vegetação, embora em pleno mês de janeiro, e dela saiu uma multidão de aves, muitas das quais vinham pousar nas mestras e cordejos do navio, deixando-se apanhar com a mão, e de longe parecia esta ilha um pombal.
(Jean de Léry, janeiro de 1558)

Já no século 16, o viajante francês Jean de Léry, que descrevia as paisagens da costa brasileira, chamava a atenção do leitor para as belezas naturais do atol das Rocas. Com 7,5 km2, é a primeira unidade de conservação marinha do Brasil, estabelecida em 1978. É um dos menores atóis do mundo, mas trata-se do único do Atlântico sul ocidental. Formado no topo de uma ilha vulcânica, encoberta pelo mar, é constituído por um platô de recife de corais e algas calcárias do qual emergem as ilhas do Farol e a do Cemitério. Esse recife oval está situado no Rio Grande do Norte, a 260 km a leste de Natal e a 145 km a oeste do arquipélago de Fernando de Noronha.

O atol das Rocas foi descoberto em 1503, depois de a embarcação portuguesa comandada por Gonçalo Coelho ter naufragado. Mas as rochas aflorando durante as marés baixas lhe atribuem até hoje, entre os navegantes, um ar traiçoeiro.

Pirâmide de fósseis
A formação de um atol começa com a erupção de um vulcão submarino que se eleva acima da superfície dos quentes mares tropicais. As larvas microscópicas de animais marinhos simples que nadam livremente, chamados corais, se agrupam nas águas rasas e bem iluminadas dessa nova encosta.

Cada larva cresce e secreta uma carapaça de calcário ao seu redor. A parte mole do animal adulto, o pólipo, passará o resto da vida nesse esqueleto externo. Para reproduzirse, o pólipo projeta “pequenos botões” que se transformam em novos pólipos, os quais também formarão sua carapaça, e assim por diante. Além dos corais, principais arquitetos dos recifes, algas marinhas, como as coralinas, contribuem para cimentar os diversos corais com compostos de cálcio.

Segundo o oceanógrafo francês Jacques-Yves Cousteau (1910-1997), um único atol representa “um volume de construção milhares de vezes superior à maior das pirâmides construídas pelos faraós. Os pequenos pólipos utilizaram quantidades espantosas de dois ingredientes: carbonato de cálcio, extraído do mar, e tempo, medido em milhões de anos. E certamente, sepultados centenas de metros abaixo das cidades de coral, encontram-se os fósseis dos antigos ancestrais de todos os recifes, datando cerca de 2 bilhões de anos – quase a metade da vida do planeta!”

Para se tornarem construtores, os corais precisam de águas quentes. A temperatura afeta a combinação de cálcio dissolvido com o carbono do dióxido de carbono, formando o carbonato de cálcio. Além disso, emáguas quentes, o carbonato de cálcio se cristaliza para soldar todos os componentes do recife.

A colônia cresce quatro centímetros por ano, sobre os esqueletos dos corais mortos. Após milhares de anos de “construção”, o que se vê é um belo anel coralino envolvendo uma laguna central. Praias de areia e uma vegetação rasteira com algumas poucas árvores altas transformam o recife numa ilha. Nasce assim um atol.
Impacto ambiental
O santuário ecológico brasileiro abriga milhares de aves marinhas migratórias e residentes, que utilizam o atol para descanso, alimentação e acasalamento. São trinta-réis, andorinhas-do-mar, atobás, mergulhões e fragatas, que todo ano agitam a ilha.

Assim como em Fernando de Noronha, o atol das Rocas também é berçário de duas espécies de tartarugas. Entretanto, a maior biodiversidade e o equilíbrio ecológico do atol estão no mar.

Os recifes de corais são os pontos de maior concentração de vida nos oceanos. Mais de 5 mil espécies de peixes, 10 mil de moluscos – além de uma quantidade incontável de algas e crustáceos– vivem e se reproduzem em torno das estruturas delicadas e coloridas, poucos metros abaixo da superfície. Só é possível compará-los, em termos de biodiversidade, às florestas tropicais.

E, assim como as florestas, esse ecossistema está em perigo. Estima-se que, se a ação predatória do homem continuar, os corais podem desaparecer em menos de 100 anos. Atualmente, a cada três recifes de corais, um está em mau estado. Há dez anos, essa proporção era de um para dez.

Essa triste constatação numérica revela que aproximadamente 60% das áreas de corais existentes no mundo já estão ameaçadas, sendo que desse percentual, aproximadamente 16,7% estão irremediavelmente destruídas e 33% seriamente comprometidas.

Além da pesca predatória de peixes e moluscos, que rompe a delicada cadeia alimentar do ecossistema – e mata os corais –, a poluição costeira, a contaminação por pesticidas carregados das lavouras pelas chuvas e o turismo descontrolado também contribuem para essa destruição.

No oceano Pacífico, pescadores despejam cianeto nos recifes para facilitar a captura de peixes ornamentais; porém, não consideram que a técnica também mata os corais. No Brasil, os corais sofrem com a água sanitária lançada neles para a captura de polvos, e recentemente o atol tem sido alvo de intensa atividade pesqueira predatória de lagosta.

Outra ameaça é o branqueamento dos corais. Tal fenômeno tem origem no aquecimento global, que provoca elevação da temperatura da água (acima de 28 ºC), aumento da fotossíntese e da liberação de toxinas (veja quadro “O Branqueamento”). Em 1998, Ano Internacional dos Oceanos, uma colossal onda de branqueamento matou 16% dos corais do planeta. O fenômeno se repetiu na Austrália entre 2001 e 2002, com resultados desastrosos. É possível que esse acontecimento seja cíclico, só que agora ocorre num momento em que a pressão humana sobre os corais se tornou mais crítica.

Uma possível solução aponta para a criação de zonas de proteção internacional onde haja um rígido controle do acesso humano. Até o momento, parece que a tentativa de convivência harmoniosa entre o homem e os corais tem fracassado.

Fabiana Zuliani é mestre em Geografia e professora do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo.
André Roberto de Arruda Corrêa é biólogo, mestre em Gestão Ambiental e coordenador do curso de Ciências do Colégio Visconde de Porto Seguro.
O BRANQUEAMENTO
A vida no coral depende principalmente da estreita relação (simbiose) entre esses celenterados e algas microscópicas, que vivem dentro deles, chamadas zooxantelas. Os corais também podem se alimentar capturando o alimento com seus tentáculos, mas é a energia extra provida por essas algas – por meio da fotossíntese – que faz os recifes manterem seu metabolismo acelerado, necessário para a produção do esqueleto de carbonato de cálcio.

Quando essas algas deixam o tecido coralino, ocorre o branqueamento. Se a perda de clorofila (pigmento fotossintético) atingir 60%, dizemos que o coral branqueou. Na realidade, o tecido vivo fica transparente e é possível enxergar o esqueleto de carbonato de cálcio, por isso a cor esbranquiçada.

Se o agente causador de estresse não for muito severo e diminuir com o tempo, o coral poderá se recompor após algumas semanas ou meses. Mas se o estresse for muito prolongado poderá matar colônias inteiras de uma só vez.

Não é só poluição, no entanto, que provoca esse fenômeno. Vários fatores, sozinhos ou combinados, podem provocá-lo: • Temperatura – os corais vivem dentro de uma margem muito pequena de variação térmica e morrem com quedas súbitas na temperatura do mar, associadas a eventos de ressurgência, ou aquecimento abrupto – devido tanto ao efeito estufa quanto ao El Niño.

• Radiação solar – normalmente, ocorre um branqueamento no topo das colônias no verão, principalmente em regiões onde a camada de ozônio está mais degradada.
• Diminuição da salinidade – já foram observados branqueamentos em ocasiões de fortes tempestades sobres recifes rasos e próximos à foz de rios.

Revista Discutindo Geografia

Nenhum comentário:

Postar um comentário