Chernobyl: o desastre soviético e a contaminação radioativa
Depois de um terremoto de intensidade jamais vista e de um tsunami de poder destrutivo avassalador, o Japão encara mais um pesadelo: o risco de uma catástrofe nuclear. A região atingida pelos tremores, no nordeste do território japonês, tem diversas usinas de energia atômica, e o abalo provocou rachaduras, vazamentos e explosões. De acordo com o governo, a situação ainda está sob controle, mas ninguém descarta a chance de novo acidente nas usinas. A situação trouxe de volta à lembrança das pessoas a tragédia mais famosa da história da energia nuclear: a explosão ocorrida há 25 anos em Chernobyl, na antiga União Soviética, atual Ucrânia. O desastre foi tema de uma reportagem de capa de VEJA em 1986.
O governo soviético admitiu: ocorreu um acidente num dos cinquenta reatores em operação no país – o da usina de Chernobyl, nas vizinhanças de Kiev, a terceira maior cidade da URSS. A partir daí a Europa começava a viver dias de medo ao mesmo tempo em que o mundo se dava conta, aos poucos, dos detalhes do maior acidente nuclear de todos os tempos. Em poucos dias, a nuvem radioativa estendeu-se por toda a Europa Central, atingindo a Suíça, o norte da Itália e batendo, na sexta-feira, sobre uma parte da Inglaterra. Carregada de iodo, césio e estrôncio radioativos, ela cobriu uma distância de 3.100 quilômetros, atingindo doze países, numa área equivalente à que vai de São Paulo ao Ceará. Enquanto isso, o governo soviético reconhecia o desastre em pílulas. Lacônico até mesmo diante das perguntas da Agência Internacional de Energia Atômica, à qual está filiado, ele só admitiu na noite de segunda-feira um desastre que ocorrera três dias antes. Desde o momento em que admitiram o desastre, fixou-se na versão de que o problema fora controlado, com a perda de duas vidas e a existência de 197 feridos. A estimativa dos serviços de espionagem americanos gira em tomo de 2.000 mortos, mas o governo soviético classifica todos esses cálculos como simples “boatos”. Era difícil saber o que sucedera em Chernobyl na noite de 25 de abril.
…
O que aconteceu depois
Quando as circunstâncias da tragédia ficaram claras, soube-se que trinta pessoas morreram imediatamente em razão do acidente e que a causa foi um experimento não autorizado que fugiu ao controle dos cientistas. Nos anos seguintes, mais de 5.000 mortes foram atribuídas à contaminação e pelo menos 5 milhões de pessoas sofreram problemas físicos ou psicológicos em razão da exposição à nuvem de poeira radioativa. Ainda hoje, pesquisadores avaliam o aumento dos casos de câncer e outras doenças em razão da tragédia em Chernobyl. O colapso da União Soviética e a miséria que imperou nas ex-repúblicas na década de 1990 ajudaram a piorar o cenário. A Ucrânia, onde está a usina, interrompeu ou passou a atrasar o pagamento de compensações e ajudas às vítimas e famílias das vítimas. Em meados dos anos 90, o presidente da vizinha Bielo-Rússia, Alexander Lukashenko, permitiu que moradores pobres voltassem a morar na região contaminada, numa medida que gerou muitos protestos. Os demais reatores de Chernobyl funcionaram até 2000, quando as autoridades cederam à pressão internacional e desativaram toda a usina.
Em abril de 2003, 17º aniversário da tragédia de Chernobyl, autoridades russas fizeram alertas sobre a possibilidade de colapso do escudo de concreto erguido, pouco após o acidente, ao redor do reator problemático, para minimizar o vazamento de material radioativo. “O sarcófago foi construído para durar cinco anos, mas já está instalado lá há dezessete. E ninguém investiga a sério as reações que acontecem dentro dele”, disse o ministro da Energia Atômica da Rússia, Alexander Rumyantsev. “Há buracos nele e o teto pode cair. Precisamos de um novo escudo ao redor do antigo”, acrescentou. O governo da Ucrânia negou a possibilidade de um novo acidente e garantiu que as medidas necessárias estão em execução e serão finalizadas a tempo se houver ajuda financeira do Ocidente. Técnicos da usina reconheceram os problemas e divulgaram um plano para estabilizar as condições do escudo antigo rapidamente e erguer um novo caixão de concreto em volta do atual. Em setembro de 2005, um relatório preparado pelo Fórum Chernobyl, que inclui oito agências da ONU, apresentou mais detalhes da tragédia. A investigação foi realizada por centenas de cientistas, economistas e médicos. Em abril de 2006, no vigésimo aniversário do acidente, a data foi marcada por protestos contra a criação de novas usinas nucleares pelo mundo.
Revista Veja
A energia nuclear é responsável por 16% da eletricidade consumida no mundo — e também por alguns dos piores pesadelos da humanidade. A concretização de um deles, o acidente na usina de Chernobyl, na Ucrânia, colocou o mundo em choque em 1986. Agora, o planeta novamente assiste com apreensão aos vazamentos nucleares no Japão, que tiveram início após o devastador terremoto que atingiu o país na última sexta-feira. As usinas nucleares são consideradas uma fonte de energia limpa porque emitem pouco carbono e, por isso, não contribuem para o aquecimento global – mas é impossível ignorar os riscos que elas representam aos países que as abrigam.
O acidente de Chernobyl, que se tornaria o maior desastre nuclear da história, ocorreu na madrugada do dia 26 de abril de 1986, durante um teste de rotina do reator número 4 da usina. Por um erro dos técnicos, o processo de reação nuclear em cadeia se descontrolou, aquecendo a água que deveria resfriar o reator. Seguiram-se uma explosão e um incêndio que durou dez dias, espalhando toneladas de material radioativo por uma área de 150.000 quilômetros quadrados.
O debate sobre a energia atômica é tão antigo quanto sua utilização. Em 1971, reportagem de VEJA relatava o debate sobre o tema nos Estados Unidos, país que recebeu sua primeira usina nuclear em 1957. O uso da tecnologia atômica em território americano ficava a cargo da Comissão de Energia Atômica (AEC), abolida em 1974. “Para os mais acesos de seus críticos, a AEC, que hoje planta instalações para gerar a energia, amanhã colherá crianças geneticamente doentes, cânceres e terra envenenada”, dizia o texto de VEJA. “Mas os defensores da energia nuclear veem os átomos por um lado diferente. ‘A chave para uma civilização avançada é um avançado padrão de vida’, diz Glenn F. Seaborg, presidente da AEC. ‘E a chave para isso é a energia’.”
As usinas nucleares chegaram ao Brasil na década de 70. A usina de Angra 1 fora comprada praticamente pronta, em 1969, da americana Westinghouse. O objetivo era que iniciasse o fornecimento comercial de energia elétrica em 1977, com um custo total de construção de 300 milhões de dólares. Porém, Angra 1 só entrou em funcionamento seis anos mais tarde, após ter consumido 1,8 bilhão de dólares. Em 2000, foi inaugurada a Angra 2, que levou mais de 20 anos para ser construída. Já a construção da usina nuclear Angra 3 sofre, há mais de trinta anos, de paralisia crônica. O Brasil perdeu muito dinheiro em Angra dos Reis. Com o capital gasto no projeto nuclear até aqui, seria possível construir cinco usinas nucleares, não apenas três.
A história recente do país evidencia o grau de amadorismo e fragilidade com que o Brasil trata um assunto tão delicado. Em 2004, uma fábrica de urânio em Resende, interior do Rio, vazou, atingiu quatro operadores – e tudo ficou na surdina. Mas o pior acidente nuclear em território brasileiro ocorreu em 1987, em Goiânia. Uma unidade de radioterapia abandonada nas ruínas do Instituto de Radioterapia, contendo uma cápsula de Césio, um poderoso elemento radioativo, foi destruída por catadores de papel. Quatro pessoas morreram vítimas da contaminação. E as autoridades brasileiras tentaram encobrir por todos os meios suas responsabilidades pela tragédia.
Como se nota na reação da comunidade internacional em relação à crise nuclear japonesa, acidentes em usinas fazem os países repensar o uso de energia atômica. Nos anos que se seguiram à tragédia de Chernobyl, a maior parte dos países desistiu ou abandonou seus projetos nucleares, principalmente em razão dos custos cada vez mais altos de construção ou da pressão dos ecologistas. Os Estados Unidos já haviam interrompido a construção de novos reatores desde 1979, quando ocorreu um superaquecimento do reator de Three Mile Island.
A tragédia no Japão ocorre justamente num momento de retomada dos investimentos em energia nuclear. Reportagem de VEJA de 2008 já mostrava como uma tecnologia vista até bem pouco tempo como sinistra passou a ser encarado, em muitos países, como uma esperança de energia limpa e barata. O renascimento da energia nuclear é explicado por uma conjunção de fatores. O primeiro é econômico. A disparada do preço do petróleo e do gás natural, que juntos respondem por 25% da eletricidade produzida no planeta, torna cada vez mais cara a energia obtida desses combustíveis fósseis. O segundo fator que impulsiona o renascimento da energia nuclear é o combate ao aquecimento global, uma causa que mobiliza governos e opinião pública.
A rigor, o único problema das usinas nucleares é o que fazer com o lixo atômico que produzem. Até agora não se tem uma solução prática para os rejeitos radioativos que não seja o armazenamento, o que ainda deixa boa parte da opinião pública desconfiada com a nova escalada na construção de reatores. Há esperança de que, no futuro, se descubra uma forma mais eficiente de descartar esse material ou reutilizá-lo. Novamente, porém, o futuro dos investimentos em energia nuclear volta a ficar incerto em boa parte do planeta.
Notícias Geografia Hoje
Japão confirma focos de radiação em Tóquio
Agência Brasil
Agência Brasil
A usina de Fukushima, após terremoto em 11 de março
Autoridades do Japão confirmaram que foram detectados pequenos focos de radiação na capital do país, Tóquio, e em áreas próximas à cidade.
Foram feitos testes para verificar como a contaminação decorrente dos acidentes radioativos de 11 de março de 2011 atingiram a região metropolitana. Em consequência do terremoto seguido por tsunami de março, houve vazamentos e explosões na Usina Nuclear de Fukushima Daiichi, no Nordeste do país.
A usina está localizada a mais de 200 quilômetros de Tóquio. Os níveis de radiação em uma das áreas ficou pouco abaixo do limite a partir do qual é recomendada a retirada dos moradores da região e mais alto em áreas dentro da zona de exclusão, em torno da usina.
O medo da radiação tornou-se uma das maiores preocupações dos japoneses, após o terremoto e o tsunami de março no Nordeste do país, que danificaram a usina de Fukushima e provocaram o vazamento de radiação.
Em decorrência dos acidentes radioativos, cidades inteiras ao redor da usina foram esvaziadas. As populações foram transferidas provisoriamente para abrigos mantidos pelo governo federal. As crianças estão sendo monitoradas para verificação do nível de radiação. Além disso, as autoridades japonesas proibiram o plantio, o consumo e a venda de produtos na região de Fukushima.
Japão pode ampliar área de segurança nuclear
A usina de Fukushima, após o terremoto em março
A Comissão de Segurança Nuclear do Japão elaborou um plano que propõe ampliar as medidas de prevenção e os cuidados nas áreas que estejam a 30 quilômetros de usinas de energia nuclear em todo o país. Atualmente essas orientações são seguidas para o perímetro de 10 quilômetros. A proposta de mudança foi provocada pelos acidentes radioativos ocorridos há sete meses.
Em 11 de março deste ano, na região de Fukushima, no Nordeste do país, o terremoto seguido por tsunami gerou vazamentos e explosões na Usina de Fukushima Daiichi. Os acidentes levaram ao esvaziamento de cidades inteiras, que permanecem assim.
Um grupo de trabalho, com peritos japoneses e o acompanhamento de estrangeiros, elabora o novo plano de segurança nuclear. Inicialmente, os especialistas recomendam que sejam designadas zonas de ação cautelar - as áreas em torno de 5 quilômetros em volta das usinas.
Os peritos sugerem também que em um raio de cerca de 50 quilômetros os moradores devem ser orientados a se precaver, por exemplo, tomando comprimidos de iodo. As propostas dos especialistas ainda poderão sofrer mudanças a partir de conversas com os representantes municipais.
A ideia é que o plano de segurança seja definido em parceria com representantes de 130 municípios. Atualmente pouco mais de 40 municípios estão envolvidos nas propostas de segurança nuclear no Japão. Porém, os acidentes de março geraram uma série de mudanças de comportamento. Para especialistas, foi o pior acidentes desde o de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986.
A era pós nuclear
Ilustração: Luciano Feijão
Fukushima marca, em matéria de energia atômica, o fim de uma ilusão e o começo da era pós-nuclear. Agora classificado como de nível sete, o mais alto na escala de acidentes nucleares, o desastre japonês já é comparável ao de Chernobyl, por seus “efeitos radioativos consideráveis na saúde das pessoas e no meio ambiente
por Ignacio Ramonet
O tremor de magnitude nove e o descomunal maremoto que castigaram o Noroeste do Japão com inaudita brutalidade no dia 11 de março deste ano não só originaram o desastre na central de Fukushima como dinamitaram todas as certezas dos partidários da energia nuclear civil.
A indústria nuclear, com a construção de dezenas de centrais atômicas prevista em inúmeros países, vivia curiosamente sua época mais idílica, essencialmente por duas razões. Primeiro, porque a perspectiva de “esgotamento do petróleo” antes do fim deste século e o crescimento exponencial da demanda energética por parte dos gigantes emergentes (China, Índia, Brasil) a convertiam em energia de substituição por excelência.1 Segundo, porque a tomada de consciência coletiva diante dos perigos das mudanças climáticas, causadas pelos gases do efeito estufa, conduzia paradoxalmente à opção por uma energia considerada “limpa”, não geradora de CO2.
A esses argumentos recentes, somavam-se os já conhecidos: o da soberania energética e menor dependência em relação aos países produtores de hidrocarbonetos; o baixo custo da eletricidade forjada nas usinas nucleares; e, por mais insólito que pareça no contexto atual, o da segurança, com o pretexto de que, das 441 centrais nucleares espalhadas pelo mundo (a metade na Europa ocidental), apenas três foram cenário de acidentes graves nos últimos cinquenta anos. Todos esses argumentos – não forçosamente absurdos – foram por água abaixo depois da descomunal dimensão do desastre de Fukushima. O novo pânico, de alcance mundial, fundamenta-se em várias constatações.
Em primeiro lugar, e contrariamente à catástrofe de Chernobyl – atribuída, em parte por razões ideológicas, ao descalabro de uma vilipendiada tecnologia soviética –, essa nova calamidade ocorreu no centro hipertecnológico do mundo e onde se supõe (pelo Japão ter sido, em 1945, o único país vítima do inferno atômico militar) que os técnicos tomaram todas as precauções possíveis para evitar um cataclismo nuclear civil. Logo, se os mais aptos não conseguiram evitar o desastre, seria razoável permitir que os demais sigam brincando com fogo atômico?
Em segundo lugar, as consequências temporais e espaciais do desastre de Fukushima são aterrorizantes. Em razão da elevada radioatividade, as áreas que circundam a central ficarão desabitadas por milênios. As zonas mais afastadas, por séculos. Milhões de pessoas serão definitivamente deslocadas em direção a territórios menos contaminados e terão de abandonar para sempre suas propriedades e explorações industriais, agrícolas ou pesqueiras. Para além da própria região mártir, os efeitos radioativos terão repercussão na saúde de dezenas de milhões de japoneses. E, sem dúvida, de numerosos vizinhos coreanos, russos e chineses. Sem mencionar outros habitantes do hemisfério boreal2 – o que confirma que um acidente nuclear nunca é local, mas sempre planetário.
Em terceiro lugar, Fukushima demonstrou que a questão da pretendida “soberania energética” é muito relativa, já que a produção de energia nuclear supõe uma nova sujeição: a “dependência tecnológica”. Apesar do enorme avanço técnico, o Japão precisou recorrer a especialistas estadunidenses, russos e franceses (além de especialistas da Agência Internacional da Energia Atômica) para controlar a situação. Por outro lado, os recursos do planeta ricos em urânio,3 combustível básico das centrais, são muito limitados. Calcula-se que, no ritmo atual de exploração, as reservas mundiais desse mineral se esgotarão em oitenta anos – ou seja, o mesmo tempo previsto para o desaparecimento do petróleo.
Por essas e outras razões, os defensores da opção nuclear devem admitir que Fukushima modificou radicalmente o enunciado do problema energético. Nesse cenário, quatro medidas urgentes impõem-se: parar de construir novas centrais; desmantelar as existentes no prazo máximo de trinta anos; ser extremamente econômico com o consumo de energia; e apostar a fundo em todas as energias renováveis. Só assim, talvez, salvaremos o planeta. E a humanidade.
Ignacio Ramonet é jornalista, sociólogo e diretor da versão espanhola de Le Monde Diplomatique.
1 Antes do acidente de Fukushima, estimava-se que o número de centrais nucleares no mundo aumentaria em 60% até 2030. A China, por exemplo, tem hoje treze centrais atômicas em atividade responsáveis pela produção de apenas 1,8% da eletricidade do país; em janeiro passado, decidiu-se construir, entre 2011 e 2015, 34 novas centrais, ou seja, uma a cada dois meses.
2 Partículas radioativas procedentes de Fukushima caíram sobre a Europa ocidental alguns dias depois da catástrofe. Apesar das autoridades terem declarado que “não constituíam uma ameaça à saúde”, vários especialistas ressaltaram que a radioatividade pode se acumular nas hortaliças, em particular nas folhas grandes, como as da alface, e o consumo desses alimentos apresenta riscos.
3 Um reator nuclear nada mais é do que um sistema de aquecer água. Para isso, utiliza a fissão do átomo de urânio 235 (U235), que, ao romper-se, ao fissionar-se mediante a denominada “desintegração nuclear”, produz uma enorme liberação de energia térmica. Vale lembrar que, para cada tonelada de mineral de urânio, é necessário explorar 156 toneladas de pedra. Dessa tonelada de mineral de urânio recolhida, faz-se apenas 1 quilo de urânio enriquecido. Desse quilo, apenas 0,7% é U235, o elemento usado nas centrais. Ou seja, para 7 gramas de U235, é preciso remover mil quilos de mineral e 156 toneladas de pedras! Ver Eduard Rodríguez Farré e Salvador López Arnal, Casi todo lo que usted desea saber sobre los efectos de la energía nuclear en la salud y en medio ambiente [Quase tudo o que você deseja saber sobre os efeitos da energia nuclear na saúde e no meio ambiente], El Viejo Topo, Barcelona, 2008. E também Paco Puche, “Adiós a la energía nuclear” [Adeus à energia nuclear], Rebelión (www.rebelion.org), 18 de abril de 2010.
Le Monde Diplomatique Brasil
Tipo de acidente ocorrido no Japão resulta de uma perda de corrente alternada fora da usina e de uma subsequente falha da energia de emergência do próprio local. Engenheiros trabalham para evitar a fusão do núcleo.
CORTESIA DA MARINHA DOS ESTADOS UNIDOS, ESPECIALISTA EM COMUNICAÇÃO DE MASSA MARINHEIRO STEVE WHITE
ÁGUA DO MAR: Destroços flutuam no Oceano Pacífico, ao largo da costa do Japão, depois que um terremoto de magnitude 9,0 e um subseqüente tsunami atingiram o país em 11 de março
Por Steve Mirsky
Scientific American Brasil
Primeiro veio o terremoto, com o epicentro ao largo da costa leste do Japão, perto da ilha de Honshu. O horror adicional do tsunami veio em seguida. Agora o mundo espera que não ocorra a fusão do núcleo no reator da estação Daichi de Fukushima.
Em 12 de Março, peritos americanos reuniram-se para oferecer um resumo da situação à mídia pelo sistema call-in. Vários participantes discutiram as ramificações para a política do setor provocadas pela crise; o físico Ken Bergeron forneceu a maior parte das informações relativas ao reator.
“Analistas gostam de caracterizar acidentes potenciais com reatores em grupos”, explicou Bergeron, que pesquisou simulações de acidentes com reatores nucleares no Laboratório Nacional de Sandia, no Novo México. “E o tipo de acidente que está ocorrendo no Japão é conhecido como station blackout (apagão de estação). Significa perda de energia por corrente alternada fora do local – as linhas de transmissão caem –, seguida de falha da energia de emergência no local. Isso é considerado extremamente improvável, mas o apagão da estação tem sido uma das maiores preocupações há décadas.
“A probabilidade de isso acontecer é difícil de calcular, principalmente devido à possibilidade do que se costuma chamar de “acidentes de causa comum”, nos quais a perda de energia fora do local e no próprio local é provocada pela mesma coisa. Nesse caso, a causa foi o terremoto. Então, estamos em território não mapeado, estamos em uma terra onde a probabilidade diz que não deveríamos estar. E temos esperança de que nem todas as barreiras para liberar a radiatividade funcionem.”
Bergeron abordou aspectos básicos do superaquecimento em uma usina por fissão nuclear. “As varetas de combustível são longas hastes de urânio cobertas com revestimento da liga de zircônio. Elas ficam dentro de uma estrutura cilíndrica toda coberta com água. Se a água desce abaixo do nível do combustível, então a temperatura começa a subir, e o revestimento se rompe, liberando parte dos produtos da fissão. Depois de algum tempo o núcleo começa a fundir. Algo muito semelhante a isso aconteceu na usina de Three Mile Island, na Pensilvânia, mas o vaso de pressão não falhou.”
Peter Bradford, ex-membro da Comissão Regulatória Nuclear dos Estados Unidos, acrescentou: “Outra coisa que acontece é que o revestimento, que está bem perto, no lado de fora do tubo, a alta temperatura, interage com a água. É essencialmente oxidação em alta velocidade, pela qual o zircônio se transforma em óxido de zircônio, e o hidrogênio é liberado. E hidrogênio em uma certa concentração na atmosfera é inflamável ou explosivo”.
“A combustão do hidrogênio não aconteceria necessariamente no prédio de confinamento”, detalha Bergeron, “que é inerte – não tem oxigênio algum –, mas eles tiveram de desafogar o confinamento, porque a pressão ganha força a partir de todo esse vapor. Assim, o hidrogênio está sendo desafogado com o vapor e está entrando em alguma área, algum prédio, onde há oxigênio, e é aí que a explosão aconteceu.”
Bergeron discutiu especificamente a usina nuclear em questão, a BWR Mark 1, projetada pela General Electric. “Trata-se de um reator de água fervente. Foi um dos primeiros projetados para reatores comerciais nesse país, e é amplamente usado também no Japão. Em comparação com outros reatores, se você examinar estudos da Comissão Regulatória Nuclear, de acordo com os cálculos, esse tem uma frequência de danos ao núcleo relativamente baixa. Em parte, isso acontece porque tem variedade maior de maneiras de fazer entrar água no núcleo. Assim, eles têm uma porção de opções – e estão recorrendo a elas agora mesmo – com o uso dessas turbinas a vapor, por exemplo. Não há necessidade de eletricidade para fazer funcionar essas turbinas a vapor. Mas elas ainda precisam de eletricidade de bateria para operar as válvulas e os controles.”
“Assim, há algumas vantagens oferecidas pela BWR em termos de acidentes graves. Mas uma das desvantagens é que a estrutura de confinamento é uma couraça de aço em forma de lâmpada que mede apenas 12 metros de lado a lado – feita de aço espesso, mas relativamente pequena, em comparação com confinamentos grandes e secos, como os de Three Mile Island. Ela não proporciona camada extra de defesa contra acidentes com reatores. Por isso, há uma grande dose de preocupação de que, se o núcleo fundir, o confinamento não será capaz de sobreviver. E, se o confinamento não sobreviver, teremos pior cenário possível.”
O que exatamente essa situação de pior cenário possível? “Estão desafogando, para impedir que o vaso de confinamento falhe. Mas, se um núcleo derreter, ele cairá bruscamente para o fundo do vaso do reator, provavelmente fundirá e passará através do vaso do reator para o piso de confinamento. É possível que ele se espalhe como uma poça em ponto de fusão – parecida com lava – até a borda da couraça de aço, derreta e atravesse-a. Isso resultaria numa falha de confinamento em questão de menos de 1 dia. Ainda bem que se trata de um sistema de confinamento melhor que o de Chernobyl, mas não é tão forte quanto o da maioria dos reatores dos Estados Unidos.”
Bergeron resumiu os eventos até agora: “Com base no que entendemos, o reator foi fechado, no sentido de que todas as varetas de controle foram inseridas – e isso significa que não há mais reação nuclear. Contudo, o que deve nos causar preocupação é o calor que ainda está no núcleo – isso vai durar por muitos dias”.
“Para impedir que esse calor faça o núcleo fundir, é preciso manter água nele. Além disso, as fontes convencionais de água e a eletricidade que fornece energia para as bombas falharam. Por isso, estão usando alguns métodos muito incomuns para fazer chegar água ao núcleo, estão usando turbinas a vapor – que operam com energia fornecida pelo próprio reator.”
“Mas até mesmo esse sistema necessita de eletricidade na forma de baterias. E as baterias não são projetadas para durar tanto assim, por isso elas acabaram falhando. Assim, não sabemos exatamente como estão fazendo chegar água ao núcleo ou se estão colocando água suficiente nele. Acreditamos, devido à liberação de césio, que o núcleo ficou exposto acima do nível da água, pelo menos durante algum tempo, e superaqueceu. O que realmente precisamos saber é por quanto tempo eles conseguirão manter aquele fluxo d´água. E isso precisa acontecer durante vários dias, para impedir a fusão do núcleo.”
“Acredito que o confinamento ainda esteja intacto. Porém, se o núcleo de fato fundir, a estrutura provavelmente não aguentará o dano, e o vaso de confinamento falhará. Tudo isso aconteceria em questão de dias. O crucial é restabelecer a energia por corrente alternada. Eles têm que devolver a energia por corrente alternada à usina para conseguir controlá-la. Tenho certeza de que estão trabalhando para isso.”
À medida que a situação na usina nuclear de Fukushima piora – quatro dos seis reatores em ponto de fervura foram danificados por explosões ou incêndios, e começou a vazar radiação para a atmosfera –, funcionários continuam a bombear água do mar nos reatores, tentativa desesperada de resfriar as varetas de combustível e evitar uma fusão completa. A iniciativa da Tokyo Electric Power Co. (Tepco), que opera a usina Daiichi, de usar água do mar misturada com boro (que absorve nêutrons) nos vasos de pressão dos reatores tem a contrapartida de que eles nunca mais vão funcionar adequadamente, danificando permanentemente uma das 25 maiores usinas nucleares do mundo.
Tais medidas extremas foram necessárias porque os sistemas de resfriamento normal e auxiliar, que fazem circular água purificada para evitar a fusão das varetas de combustível, falharam. O tsunami não só cortou o fornecimento de energia elétrica normal à Daiichi como também inundou e desativou os geradores a diesel de reserva. Três dos seis reatores da usina estavam desligados para manutenção quando o tsunami induzido pelo terremoto aconteceu. A falta de água suficiente para cobrir essas varetas levou a explosões de três reatores em operação, provavelmente devido a um acúmulo de gás hidrogênio.
O quarto reator, um dos que tinham sido desligados antes de 11 de março, houve um incêndio que ameaçou evaporar a água num tanque de armazenamento de combustível nuclear irradiado.
A perspectiva de arruinar meia dúzia de reatores nucleares não é nada em comparação com a alternativa: a fusão completa, que contaminaria o solo abaixo do complexo com material radiativo e depois seria espalhado pelo vento, chuva e águas subterrâneas, com potencial para causar doenças provocadas por radiação em milhares de pessoas.
Scientific American falou com Pavel Tsvetkov, professor assistente de engenharia nuclear na Texas A&M University, para saber por que a água do mar é o último recurso para resfriar reatores nucleares comprometidos, e quais as opções da TEPCO para as próximas etapas.
Por que uma instalação nuclear normalmente usa água purificada para resfriar seus reatores? Até que ponto ela é purificada?
Vou lhe dar um exemplo. Se você tem uma panela fervendo e a sua água tem minerais em excesso, então haverá condensação dentro dessa panela. Quando isso acontece num reator, interrompe as propriedades dos elementos do combustível. Empresas energéticas não querem pôr em risco o desempenho dos materiais de seu reator, por isso usam água purificada, normalmente de uma instalação especial de purificação no local.
Em que circunstâncias uma usina usaria água do mar para resfriar seus reatores?
Usar água não purificada não é prática normal – aliás, nunca se fez isso. Usinas não pegam água de rio ou mar para suplementar sua própria água interna, que fica em sistemas de circuito completamente fechado. É claro que elas colocam uma quantidade de água nova periodicamente para compensar a evaporação e outras perdas parecidas, mas essa água passa por purificação antes de ser usada.
Os reatores da Tepco ficaram abaixo da condição normal de operação devido a falta de água, por isso tiveram de colocar água adicional para o resfriamento. A água salgada obviamente contém uma porção de minerais e, se for tirada diretamente do mar, também tem todo tipo de materiais flutuando nela. Mesmo que tudo seja filtrado, a química da água salgada não é realmente compatível com o que normalmente circula no reator. Ela é corrosiva demais para os elementos do combustível. Acho que, depois que essa água foi introduzida nos núcleos do reator, eles ficaram completamente inutilizáveis. Isso acontece porque qualquer material na água vai “colar” na superfície das varetas de combustível e fazer com que a transferência de calor se torne imprevisível.
Que papel desempenha o boro na água do mar?
O boro pode ser injetado em sistemas de refrigeração por água para controlar a atividade do núcleo do reator porque ele é um forte absorvedor de nêutrons, especialmente de nêutrons térmicos. Mas o boro não é usado habitualmente em reatores de água fervente, como os da estação Daiichi em Fukushima, porque o boro também exerce efeito corrosivo sobre os elementos do combustível. Em casos de emergência, no entanto, boro e água do mar podem ser usados para suprimir as reações em cadeia por fissão nos elementos do combustível.
Então, o uso de água do mar e boro é um último recurso para resfriar um reator?
Provavelmente, se tivessem mais tempo, eles teriam tentado restaurar os geradores diesel, que acionavam o sistema de resfriamento substituto, e assim fariam circular a água que já estava lá. Porém, com a água no núcleo evaporando devido a altas temperaturas, eles precisaram acrescentar cada vez mais água para poder suprimir rapidamente as condições de fervura.
Dado que a construção de um novo reator custaria vários bilhões de dólares, não há maneira alguma pela qual eles poderiam limpar os elementos do combustível?
Uma alternativa seria tentar explorar se dá para restaurar o reator, porque é um investimento significativo. Mas não tenho lembrança de alguém usar água do mar por período de tempo prolongado em seus reatores como eles estão fazendo agora.
Scientific American Brasil
Fukushima marca, em matéria de energia atômica, o fim de uma ilusão e o começo da era pós-nuclear. Agora classificado como de nível sete, o mais alto na escala de acidentes nucleares, o desastre japonês já é comparável ao de Chernobyl, por seus “efeitos radioativos consideráveis na saúde das pessoas e no meio ambiente
por Ignacio Ramonet
O tremor de magnitude nove e o descomunal maremoto que castigaram o Noroeste do Japão com inaudita brutalidade no dia 11 de março deste ano não só originaram o desastre na central de Fukushima como dinamitaram todas as certezas dos partidários da energia nuclear civil.
A indústria nuclear, com a construção de dezenas de centrais atômicas prevista em inúmeros países, vivia curiosamente sua época mais idílica, essencialmente por duas razões. Primeiro, porque a perspectiva de “esgotamento do petróleo” antes do fim deste século e o crescimento exponencial da demanda energética por parte dos gigantes emergentes (China, Índia, Brasil) a convertiam em energia de substituição por excelência.1 Segundo, porque a tomada de consciência coletiva diante dos perigos das mudanças climáticas, causadas pelos gases do efeito estufa, conduzia paradoxalmente à opção por uma energia considerada “limpa”, não geradora de CO2.
A esses argumentos recentes, somavam-se os já conhecidos: o da soberania energética e menor dependência em relação aos países produtores de hidrocarbonetos; o baixo custo da eletricidade forjada nas usinas nucleares; e, por mais insólito que pareça no contexto atual, o da segurança, com o pretexto de que, das 441 centrais nucleares espalhadas pelo mundo (a metade na Europa ocidental), apenas três foram cenário de acidentes graves nos últimos cinquenta anos. Todos esses argumentos – não forçosamente absurdos – foram por água abaixo depois da descomunal dimensão do desastre de Fukushima. O novo pânico, de alcance mundial, fundamenta-se em várias constatações.
Em primeiro lugar, e contrariamente à catástrofe de Chernobyl – atribuída, em parte por razões ideológicas, ao descalabro de uma vilipendiada tecnologia soviética –, essa nova calamidade ocorreu no centro hipertecnológico do mundo e onde se supõe (pelo Japão ter sido, em 1945, o único país vítima do inferno atômico militar) que os técnicos tomaram todas as precauções possíveis para evitar um cataclismo nuclear civil. Logo, se os mais aptos não conseguiram evitar o desastre, seria razoável permitir que os demais sigam brincando com fogo atômico?
Em segundo lugar, as consequências temporais e espaciais do desastre de Fukushima são aterrorizantes. Em razão da elevada radioatividade, as áreas que circundam a central ficarão desabitadas por milênios. As zonas mais afastadas, por séculos. Milhões de pessoas serão definitivamente deslocadas em direção a territórios menos contaminados e terão de abandonar para sempre suas propriedades e explorações industriais, agrícolas ou pesqueiras. Para além da própria região mártir, os efeitos radioativos terão repercussão na saúde de dezenas de milhões de japoneses. E, sem dúvida, de numerosos vizinhos coreanos, russos e chineses. Sem mencionar outros habitantes do hemisfério boreal2 – o que confirma que um acidente nuclear nunca é local, mas sempre planetário.
Em terceiro lugar, Fukushima demonstrou que a questão da pretendida “soberania energética” é muito relativa, já que a produção de energia nuclear supõe uma nova sujeição: a “dependência tecnológica”. Apesar do enorme avanço técnico, o Japão precisou recorrer a especialistas estadunidenses, russos e franceses (além de especialistas da Agência Internacional da Energia Atômica) para controlar a situação. Por outro lado, os recursos do planeta ricos em urânio,3 combustível básico das centrais, são muito limitados. Calcula-se que, no ritmo atual de exploração, as reservas mundiais desse mineral se esgotarão em oitenta anos – ou seja, o mesmo tempo previsto para o desaparecimento do petróleo.
Por essas e outras razões, os defensores da opção nuclear devem admitir que Fukushima modificou radicalmente o enunciado do problema energético. Nesse cenário, quatro medidas urgentes impõem-se: parar de construir novas centrais; desmantelar as existentes no prazo máximo de trinta anos; ser extremamente econômico com o consumo de energia; e apostar a fundo em todas as energias renováveis. Só assim, talvez, salvaremos o planeta. E a humanidade.
Ignacio Ramonet
é jornalista, sociólogo e diretor da versão espanhola de Le Monde Diplomatique.
Ilustração: Luciano Feijão
1 Antes do acidente de Fukushima, estimava-se que o número de centrais nucleares no mundo aumentaria em 60% até 2030. A China, por exemplo, tem hoje treze centrais atômicas em atividade responsáveis pela produção de apenas 1,8% da eletricidade do país; em janeiro passado, decidiu-se construir, entre 2011 e 2015, 34 novas centrais, ou seja, uma a cada dois meses.
2 Partículas radioativas procedentes de Fukushima caíram sobre a Europa ocidental alguns dias depois da catástrofe. Apesar das autoridades terem declarado que “não constituíam uma ameaça à saúde”, vários especialistas ressaltaram que a radioatividade pode se acumular nas hortaliças, em particular nas folhas grandes, como as da alface, e o consumo desses alimentos apresenta riscos.
3 Um reator nuclear nada mais é do que um sistema de aquecer água. Para isso, utiliza a fissão do átomo de urânio 235 (U235), que, ao romper-se, ao fissionar-se mediante a denominada “desintegração nuclear”, produz uma enorme liberação de energia térmica. Vale lembrar que, para cada tonelada de mineral de urânio, é necessário explorar 156 toneladas de pedra. Dessa tonelada de mineral de urânio recolhida, faz-se apenas 1 quilo de urânio enriquecido. Desse quilo, apenas 0,7% é U235, o elemento usado nas centrais. Ou seja, para 7 gramas de U235, é preciso remover mil quilos de mineral e 156 toneladas de pedras! Ver Eduard Rodríguez Farré e Salvador López Arnal, Casi todo lo que usted desea saber sobre los efectos de la energía nuclear en la salud y en medio ambiente [Quase tudo o que você deseja saber sobre os efeitos da energia nuclear na saúde e no meio ambiente], El Viejo Topo, Barcelona, 2008. E também Paco Puche, “Adiós a la energía nuclear” [Adeus à energia nuclear], Rebelión (www.rebelion.org), 18 de abril de 2010.
Le Monde Diplomatique Brasil
daveeza/ Creative Commons
O vazamento em Fukushima liberou uma radiação oito vezes maior que a exposição máxima sofrida pelos trabalhadores da usina em um ano todo!
Depois de desocupar a área, é preciso resfriar o reator até que se possa fazer um "remendo" na estrutura afetada. Caso contrário, ele funcionaria como uma panela de pressão lacrada, que acabaria explodindo
Natália Daumas
Revista Mundo Estranho - 05/2011
Foram essas as medidas adotadas pelos japoneses para lidar com o vazamento na usina de Fukushima, a 250 km de Tóquio. O drama ocupou manchetes no mundo todo desde que o terremoto de 11 de março afetou a edificação e permitiu a liberação de material radioativo na atmosfera, ameaçando a população do Japão e de nações próximas.
OPERAÇÃO TAPA-BURACO
Principal obstáculo ao conserto é o aquecimento descontrolado do reator
1. Em uma usina nuclear, usa-se o potencial energético do urânio, plutônio, césio, tório ou cobalto. Quando os átomos do elemento químico se separam, num processo conhecido como fissão nuclear, a energia aquece a água ao seu redor no reator. Isso gera vapor, que faz as turbinas se moverem. E o giro das turbinas é convertido em energia pelos geradores
2. O terremoto japonês afetou os reservatórios de água, que ajudam a controlar o aquecimento provocado pelo urânio. A temperatura subiu intensamente, derretendo as barras metálicas que concentram os elementos radioativos. Esse calor prejudicou as camadas de blindagem da usina, que servem justamente para evitar um vazamento
3. Em casos como este, a primeira medida é desocupar a área contaminada. O tamanho dessa área depende da quantidade de material lançado no ar e das condições climática de cada país - como a velocidade e a direção do vento. No Japão, a evacuação começou com um raio de 3 km e depois subiu para 20 km
4. As usinas contam com equipes preparadas para atuar em situações de emergência. Seu equipamento inclui máscaras para a filtração do ar e roupas impermeáveis, que evitam a contaminação de pele. Além disso, o tempo de exposição à radiação deve ser controlado em turnos de, no máximo, cinco horas diárias
5. A primeira providência efetiva para conter o vazamento é resfriar o reator. A temperatura da água em contato com o urânio precisa ficar abaixo dos 100 oC para interromper o processo de ebulição. É por isso que se joga mais água no reator. No Japão, foram usados caminhões-pipas, bombas de pressão e até helicópteros
6. Enquanto a temperatura não for controlada, é impossível "remendar" as fissuras na blindagem do reator. O conserto é feito com aço e concreto. Mas, mesmo assim, a usina jamais poderá funcionar novamente, devido ao risco de novos acidentes. O material radioativo também não pode ser passado para outra usina
• Parte da água usada para resfriar Fukushima foi bombeada para áreas de contenção. Mas uma grande parcela ainda contaminada voltou ao mar
• Parte da água usada para resfriar Fukushima foi bombeada para áreas de contenção. Mas uma grande parcela ainda contaminada voltou ao mar
• Nas proximidades de Fukushima, uma hora sem proteção poderia causar náuseas e mudanças nas células sanguíneas dos agentes
• A radiação também reduz o número de anticorpos em até 50%, o que aumenta o risco de infecções
MAL INVISÍVEL
Radioatividade provoca mutações celulares graves
Os elementos radioativos liberados na atmosfera se misturam no ar, na água e na terra e são absorvidos pelo homem sem serem notados. Eles podem alterar a estrutura das células, destruindo seu núcleo e causando doenças graves. Confira algumas delas abaixo. Há alguns tratamentos de emergência. Comprimidos de iodeto saturam a glândula tireoide com iodo natural, evitando que as partículas se fixem ali e provoquem um câncer. E o remédio conhecido como azul da prússia absorve o elemento radioativo, fazendo-o ser eliminado nas fezes e na urina
RADIOATIVIDADE DO BEM
Em doses controladas, ela pode ser útil na medicina e na indústria
Em quantidades muito menores do que a liberada em acidentes nucleares, a radiação pode ser uma aliada da nossa saúde. Ela é empregada pela radioterapia, por exemplo, para destruir células de um tumor cancerígeno. Nas radiografias, os ossos absorvem a radiação e permitem que os médicos descubram possíveis fraturas. E, nas indústrias, ela pode ser usada para medir a vazão de líquidos e a espessura de materiais
FONTES Matias Puga Sanches, supervisor de proteção radiológica do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen); Luís Antônio Albiac Terremoto, pesquisador do Ipen; Agência Internacional de Energia Atômica; Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN); Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD)
À medida que aumentam as preocupações quanto aos vazamentos de radiação em Fukushima, é possível saber quais serão as sequelas desse desastre? | ||||||
A crise na usina nuclear Daiichi despertou preocupações sobre os efeitos para a saúde da exposição à radiação. O que é um nível “perigoso” de radiação? Como a radiação prejudica a saúde? Quais são as consequências de radiação aguda e em baixa dosagem? “Não estamos nem perto dos níveis que as pessoas deveriam se preocupar”, esclarece Susan M. Langhorst, física e encarregada de segurança de radiação na Washington University, em Saint Louis. De acordo com Abel Gonzalez, vice-presidente da Comissão Internacional de Proteção Radiológica que estudou o desastre de 1986 em Chernobyl, na melhor das hipóteses as informações atuais vindas do Japão sobre níves de vazamento de radiação são incompletas. Níveis de radiação: Em média, as pessoas são expostas a um nível de 2 a 3 millisieverts de radiação por ano, proveniente de uma combinação de radiação cósmica, emissões de materiais de construção e substâncias radiativas naturais no ambiente.
A Comissão Regulatória Nuclear dos Estados Unidos recomenda que o público em geral limite sua exposição a menos de 1 millisievert adicional por ano. Para pacientes submetidos à radiação médica não há limite rígido de exposição – é responsabilidade de profissionais médicos pesar riscos e benefícios da radiação usada em diagnósticos e tratamentos. Por exemplo, uma única sessão de tomografia computadorizada pode expor o paciente a mais de 1 millisievert.
A doença da radiação (ou síndrome aguda de radiação) manifesta-se depois de uma dose de 3 sieverts – 3 mil vezes a dose recomendada para o público em geral por ano. Os primeiros sintomas são: náuseas, vômitos e diarréia. Esses sintomas começam a aparecer num prazo de minutos ou dias, informam os Centros para Controle de Doenças dos Estados Unidos. Um período de enfermidade séria, que inclui perda de apetite, fadiga, febre, problemas gastrintestinais e, possivelmente, convulsões ou coma, pode vir em seguida e durar de horas a meses.
Tipos de radiação:
O que é preocupante na situação atual é a radiação por ionização, produzida por isótopos pesados em decaimento espontâneo, tais como iodo 131 e césio 137. Esse tipo de radiação tem energia suficiente para ionizar átomos (criando carga positiva ao suprimir elétrons), o que lhes dá o potencial químico para reagir de forma deletéria com átomos e moléculas de tecidos vivos.
A radiação por ionização pode ter diferentes formas: nas radiações por raios gama e raios-X, átomos liberam partículas energéticas leves com potência suficiente para penetrar o corpo. As radiações por partículas alfa e beta têm energia mais baixa e podem ser bloqueadas por uma simples folha de papel. Se o material radiativo entra no corpo por ingestão ou inalação, no entanto, são precisamente as radiações alfa e beta com energia mais baixa que tornam-se mais perigosas. Isso porque uma grande porção de radiação por raios gama e X vai passar diretamente através do corpo sem interagir com o tecido, já radiações alfa e beta, incapazes de penetrar tecido, gastarão toda sua energia ao colidir com átomos do corpo e provavelmente causarão maior estrago.
Na situação de Fukushima, os isótopos radiativos detectados, iodo 131 e césio 137, emitem radiação tanto gama quanto beta. Esses elementos são subprodutos da reação por fissão que gera eletricidade nas usinas nucleares.
O governo japonês retirou 180 mil pessoas dentro de um raio de 20 km do complexo Daiichi. Porta-vozes do governo apelam para que as pessoas num raio de 30 km da usina fiquem dentro de casa, fechem todas as janelas, troquem de roupa e lavem a pele exposta após sair nas ruas.
Tempo de exposição:
Uma dose muito alta de radiação recebida em minutos pode ser mais nociva que a mesma dosagem acumulada durante algum tempo. De acordo com a Associação Nuclear Mundial, uma dose única de 1 sievert provavelmente causará doença da radiação temporária e contagem mais baixa de células brancas, mas não seria fatal. Uma dose de 5 sieverts provavelmente mataria metade das pessoas expostas durante 1 mês. No nível de 10 sieverts, a morte ocorre em algumas semanas.
Lições de Chernobyl:
De acordo com Gonzalez, alguns dos trabalhadores de Chernobyl receberam vários sieverts de radiação, e muitos estavam trabalhando “basicamente nus” devido ao calor, o que permitiu a absorção de pó contaminado através da pele. Já os trabalhadores japoneses estão muito bem equipados e protegidos contra doses diretas.
A Tokyo Electric Power Co. (Tepco), proprietária da usina, retirou a maioria de seus funcionários, mas 50 permanecem no local para bombear água do mar a fim de resfriar os reatores e prevenir mais explosões. Provavelmente esses trabalhadores estão se expondo a altos níveis de radiação e correndo sérios riscos à saúde. “Como medida de precaução, limitaria a exposição dos trabalhadores a 0,1 sievert, e faria rodízio entre eles”, diz Gonzalez. Os trabalhadores teriam de usar detectores pessoais que calculariam tanto o nível quanto a dose total de radiação, e eles disparariam alarmes quando as doses máximas fossem atingidas. “Se a dosagem dos trabalhadores começar a se aproximar de 1 sievert, então a situação se torna séria”, completa.
Milhares de crianças que ficaram doentes após o desastre de Chernobyl não foram atingidas por radiação direta, mas sim por beber leite contaminado com iodo 131. O isótopo, liberado pela explosão de Chernobyl, tinha contaminado a grama em que o gado pastava, e a substância radiativa ficou acumulada no leite das vacas. Pais, sem saber do perigo, serviram leite contaminado às crianças. “Certamente isso não acontecerá no Japão”, afirma Gonzalez.
Quando se trata de exposição à radiação, profissionais que frequentemente trabalham com materiais radiativos, seja em hospitais ou em usinas nucleares, seguem o princípio de “nível razoavelmente atingível”. Os limites de exposição à radiação são estabelecidos bem abaixo dos níveis sabidamente capazes de induzir a doença da radiação.
Scientific American Brasil |
Uma energia tão importante para alguns países vale os riscos que oferece para o mundo todo?.
Por Daniel Pavani
No mês de março de 2011, o que mais se ouviu falar nos noticiários foram os problemas nos reatores da usina nuclear de Fukushima Daiichi, no Japão, decorrentes do terremoto do dia 11. Mas o que nem todos sabem é como funciona uma usina deste tipo, de que forma combustíveis radioativos são utilizados para a produção de energia elétrica e quais os riscos para os seres humanos e o meio ambiente.
O processo de obtenção de energia elétrica nas usinas nucleares é feito por meio de reações nucleares controladas, que ocorrem dentro de um reator. Este tipo de obtenção de energia é utilizado em países que não possuem outros meios mais fáceis tão abundantes, como a energia hidrelétrica no Brasil. Além disso, reatores nucleares também estão presentes em submarinos, já que este tipo de energia é mais limpa e os combustíveis ocupam muito menos espaço – algo essencial em um submarino. (Este termo "mais limpa" será explicado mais adiante). A página do How Stuff Works, por exemplo, afirma que a energia nuclear "está na fronteira entre as maiores esperanças da humanidade e seus maiores medos com relação ao futuro".
Segundo dados de março de 2011 da Associação Mundial Nuclear, o mundo possui 443 reatores em operação e um total de quase 70 mil toneladas de Urânio. Entre os principais países que utilizam a energia nuclear estão os EUA (104 reatores ativos), França (58 reatores ativos), Japão (55 reatores ativos) e Rússia (32 reatores ativos). Um país que merece destaque é a China que, apesar de possui apenas 13 reatores atualmente em atividade, tem planos de construção de 50 e proposta para mais 110.
De acordo com números do Instituto de Energia Nuclear, somente em 2009, usinas nucleares foram responsáveis por 14% da produção de energia elétrica mundial. Os países que mais utilizam este tipo de energia foram a Lituânia (76,2%) e França (75,2%), seguidos por Eslováquia (53,5%), Bélgica (51,7%) e Ucrânia (48,6%). No Brasil, a energia elétrica produzida pelas usinas Angra I e Angra II representou apenas 3% do total nacional.
Como reações nucleares produzem eletricidade
Tudo bem, já deu pra entender como é importante a energia nuclear para alguns países do mundo, principalmente aqueles que não possuem um grande potencial hídrico – como o Brasil – ou que pensam na substituição de fontes poluidoras da atmosfera, como as usinas termoelétricas, que queimam carvão ou combustíveis fósseis para a produção de energia elétrica. Mas como funcionam as usinas e reatores nucleares?
Basicamente, o processo de obtenção de energia elétrica nas usinas nucleares está dividido em duas etapas: a reação nuclear controlada e a movimentação de turbinas e geradores elétricos. De forma geral, os reatores nucleares fervem água para que o vapor mova uma turbina, a qual acionará um gerador e produzirá a energia elétrica.
A reação nuclear ocorre, claro, dentro dos reatores. Existem dois processos possíveis para a obtenção de energia: a fusão nuclear, em que dois mais núcleos se unem, ou a fissão, em que um núcleo maior se divide em dois ou mais núcleos. Ambos os processos liberam uma grande quantidade de energia, mas a fissão – e especificamente do isótopo urânio-235 – é a mais utilizada nas usinas do mundo. A reação é iniciada quando o U-235 é atingido por um nêutron, transformando-se momentaneamente em U-236. Por sua instabilidade, este isótopo sofre a fissão, gerando produtos (outros elementos radioativos) e energia. O processo é caracterizado por uma reação em cadeia, já que a fissão gera também mais nêutrons livres que, por sua vez, atingem outros átomos de U-235, dando continuidade exponencial à reação.
O site da Eletronuclear, a agência do governo que controla a energia nuclear no Brasil, apresenta uma concisa, mas clara, explicação sobre o funcionamento do reator nuclear. Dentro do reator, ocorrem dois processos: a reação nuclear e a geração de vapor. Varetas de combustível radioativo são imergidas em água, onde ocorre a reação de fissão nuclear. Esta reação libera muita energia na forma de calor, o que serve para esquentar a água a grandes temperaturas, sem fervê-la, já que o sistema funciona sob uma pressão cerca de 157 vezes maior do que a atmosférica.
Em um circuito de água chamado de secundário, a água aquecida no reator troca calor com outra água, que não tem contato com as varetas de combustível. E é esta água que ferve e gera vapor. Depois disso, o vapor aciona uma turbina que, por sua vez, faz funcionar um gerador elétrico em um processo já comum de geração de energia elétrica. Esta separação entre os sistemas é muito importante, já que impede que a água em contato com o combustível não seja a mesma que sai do reator para mover a turbina, isolando a região radioativa.
O vapor não é perdido e passa por um condensador, resfriado com água do mar circulante. Quando se entende isso, fica mais fácil de compreender o motivo de muitos problemas atuais, como o fato das instalações de usinas nucleares tão próximas à costa, como as usinas de Angra dos Reis, no Brasil, ou em regiões muitas vezes sujeitas a terremotos, como no caso do Japão. Isso é feito estrategicamente, para que a água do mar possa ser utilizada para este resfriamento.
É necessário também controlar as reações nucleares e, para isso, são utilizadas barras de controle. Estas barras são feitas, em geral, de cádmio, um elemento químico que tem a capacidade de absorver nêutrons. Fazendo isso, é cada vez menor a quantidade de nêutrons disponíveis para dar seqüencia, caso necessário.
Outra etapa muito importante para o funcionamento da usina nuclear é o enriquecimento do urânio. Este elemento possui alguns isótopos, mas o que interessa para a produção de energia é o Urânio-235, ou seja, um átomo que possui 92 prótons (partículas de carga positiva e que o classifica como elemento Urânio) e 143 nêutrons, totalizando uma massa de 235. Entretanto, o urânio que é extraido das jazidas naturais como um dióxido (UO2) – possui uma quantidade predominante de outro isótopo (elementos de mesmo número de prótons, mas massas diferentes), o U-238, que representa mais de 99% em massa.
Assim, uma vez que o U-235 é o único isótopo fissável, ele deve ser isolado, o que é feito em um processo de centrifugação e que o Brasil já consegue fazer. Este processo é também fonte de grandes discussões, já que um tênue limite separa o enriquecimento para a produção de energia em reatores e para a produção de bombas de nêutrons, ou, mais popularmente, bombas atômicas.
Energia nuclear como energia limpa
O grandes defensores da energia nuclear se baseiam principalmente no fato de que ela pode ser considerada mais limpa que aquelas que utilizam a queima de combustíveis fôsseis, como as termoelétricas, por exemplo, e por não dependerem de regimes de chuva, como a energia produzida nas hidrelétricas. No entanto, diversos outros problemas podem ser apontados, sendo que o principal deles é o destino dos resíduos radioativos, produtos gerados nas reações nucleares.
Os resíduos radioativos devem ser armazenados em locais seguros a fim de que o decaimento radioativo possa agir. Este processo é inerente aos elementos radioativos e diminui a atividade dos elementos de forma exponencial, de acordo com sua meia-vida. A meia-vida de um elemento radioativo é o tempo necessário para que sua atividade seja diminuída em 50% da original. É aceito que cerca de 10 meias-vidas, tempo que varia muito de acordo com cada isótopo, são suficientes para que a atividade não ofereça mais riscos.
A página da World Nuclear Association indica alguns destinos para estes resíduos, como sua fixação em matrizes fixas e inertes, como concreto, por exemplo; armazenamento em containers inoxidáveis; e também colocação destes recipientes no fundo do oceano ou em rochas e estruturas geológicas estáveis. Porém, este é ainda um problema que gera muita discussão, principalmente no que se refere às questões políticas e ambientais internacionais.
Impactos ambientais são de muito interesse para este tema, já que a poluição radioativa é muito perigosa tanto para o homem quanto para o meio ambiente. Além disso, os impactos ambientais e ecológicos causados pelo aquecimento da água do mar nas regiões próximas às usinas também são bastante estudados por pesquisadores da Biologia Marinha e Oceanografia.
Não obstante, os acidentes talvez configurem o principal medo com relação às usinas nucleares e a questão nuclear voltou à tona no mês de março de 2011, frente aos acontecimentos no Japão, como terremoto do dia 11 e os danos à usina nuclear de Fukushima Daiichi, no nordeste do país. Até este ano, talvez o exemplo mais emblemático de acidente com uma usina nuclear fosse o de Chernobyl, na ex-União Soviética, hoje Ucrânia, em 1986.
Os impactos da explosão do reator soviético estão presentes por toda a região até hoje, tanto na população quanto no meio ambiente. Os impactos ambientais são tão grandes que os elementos radioativos liberados na atmosfera se tornaram inclusive marcadores cronológicos em sessões geológicas e em estudos oceanográficos no Hemisfério Norte, por exemplo.
A energia nuclear no Brasil
Por aqui, a energia nuclear é desenvolvida nas usinas Angra I e Angra II, no município de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Além disso, há ainda o projeto de construção de uma terceira usina: a Angra III. O Brasil já detém a tecnologia de enriquecimento do Urânio, fato essencial, já que até pouco tempo ele tinha de ser comprado de outros países.
Entretanto, a produção ainda é baixa, ainda que o potencial de Angra II, por exemplo, seja suficiente para abastecer uma região metropolitana do tamanho da de Curitiba, conta o site da Eletronuclear. Além disso, com a instalação de Angra III, que terá capacidade semelhante à de Angra II, o potencial energético deverá ser ainda maior.
O Prof. Dr. Rubens Figueira, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, defende o uso da energia nuclear no Brasil, não como uma substituta de outras fontes tão abundantes, mas sim devido à sua importância tecnológica e científica. Nos últimos anos, contou o pesquisador em entrevista via e-mail, o país adquiriu a tecnologia para o enriquecimento do Urânio, fator essencial para a produção de energia. Além disso, avanços em outras áreas também foram conquistados, como, por exemplo, no desenvolvimento de radiofármacos.
O Brasil está muito bem posicionado frente aos países desenvolvidos no que se refere à tecnologia do ciclo do combustível nuclear, o que é, na opinião do pesquisador, algo muito importante dos pontos de vista tanto científico quanto estratégico. Conhecer a energia nuclear é muito importante, porém, é também importante discutir sua real necessidade em um país como o Brasil, com um potencial hídrico tão grande.
Quanto aos resíduos produzidos nas usinas de Angra dos Reis, o Dr. Figueira conta que eles são armazenados nas dependências das próprias usinas, já que não existe ainda, no Brasil, um local mais apropriado para isso. Este é, segundo ele, um dos principais problemas para o desenvolvimento da energia nuclear no país. Este problema "deve ser discutido com a opinião pública para que ela entenda seus riscos e benefício", conta o pesquisador.
Os próximos passos, segundo o Dr. Figueira, devem ser a discussão das vantagens e desvantagens da tecnologia nuclear, sem radicalismo de nenhuma parte, ou seja, nem dos ambientalistas, nem dos pesquisadores, nem do governo. É preciso entender tudo o que a energia nuclear pode oferecer de bom e também todos os riscos intrínsecos, a fim de promover uma discussão direta, objetiva e consciente entre os governantes e a população.
Nenhum comentário:
Postar um comentário