quarta-feira, 17 de julho de 2013

BRINC'S

Países emergentes quase alcançam G7 em patentes


RAFAEL GARCIA
EM WASHINGTON
 Folha de São Paulo

Os países do grupo dos Bricks, as cinco maiores economias emergentes do mundo, já têm uma produção científica na mesma escala de grandeza da dos países do G7, as sete nações desenvolvidas mais influentes.

Há 20 anos, a ciência de Brasil, Rússia, Índia, China e Coreia do Sul tinha menos de um décimo do tamanho daquela mostrada pelos países mais ricos do mundo.

Hoje, a publicação científica desses emergentes é um pouco menos da metade daquela do G7, e o número de patentes registradas já quase se iguala aos de EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Japão e Canadá.

Os dados são da divisão científica da multinacional de mídia Thomson Reuters, que produziu um relatório analisando a produção científica dos Bricks -incluindo o "K", de Coreia do Sul em inglês.

O levantamento mostra que a ciência e a inovação desses países cresce não apenas em quantidade, mas também em qualidade.
Editoria de Arte/Folhapress

PESQUISA E INOVAÇÃO Produção de ciência e patentes dos países emergentes está se igualando à das nações mais ricas


"Vemos agora uma divisão mais equitativa da participação na ciência", diz David Pendlebury, um dos autores do relatório. "Parte disso é consequência da globalização, mas é algo que também está ocorrendo na ciência de ponta. Nas próximas décadas, não nos surpreenderemos se mais prêmios Nobel forem concedidos à Asia e à América do Sul."

A participação dos Bricks na ciência de alta qualidade foi avaliada pelo número de citações de estudos científicos. "Fizemos uma busca por estudos que, para seu ano de publicação, estiveram no grupo dos 1% mais citados de suas áreas", explica Pendlebury. "Durante a última década, o numero desses estudo triplicou no Brasil."

O aumento em números absolutos (de 56 para 168, entre 2002 e 2011) ainda é pequeno comparado à participação de gigantes como EUA e Reino Unido na elite científica. Mas esses estudos cresceram proporcionalmente no Brasil, indo de 0,42% da produção nacional a 0,50% -um aumento apreciável quando se trata de um grupo tão seleto de trabalhos.

SINGULAR

O Brasil se destaca dos outros Bricks quando se analisam os campos da ciência que puxam o aumento da produtividade. "Nos 'Ricks', a física, a química, a engenharia e a ciência de materiais são as áreas líderes, mas no Brasil, que é uma 'economia de conhecimento natural', quem lidera o caminho são as ciências biológicas e ambientais", afirma o documento.

Segundo Pendlebury, isso pode se dever ao fato de o Brasil ter um programa de investimento em ciência menos aplicado a metas de produção industrial, como ocorre na Coreia do Sul e na China.

Nesses países, o esforço científico é mais concentrado em áreas determinadas pelo Estado.

Apesar de não ter um governo tão "interventor" na ciência, porém, o Brasil é um dos países onde o setor privado menos aproveita o espaço para investimento. Enquanto na China as empresas contribuem com três quartos da fatia, no Brasil o setor privado concede apenas metade.

"Os baixos gastos corporativos com pesquisa e desenvolvimento no Brasil parecem uma anomalia", diz o relatório. Segundo o documento, a causa pode ser o nível alto de investimento público, especialmente por meio do apoio pelo regime de impostos na região de São Paulo.

Essa menor participação privada tem efeito no número de patentes registradas pelo Brasil, bem menor que os de outros emergentes (em 2011, foram registradas pouco mais de 20 mil patentes no país contra 170 mil da Coreia do Sul e 400 mil da China).

Para Pendlebury, isso parece preocupante em termos do retorno financeiro do investimento em ciência. Mas a escala do problema pode não ser tão grande quanto parece. "A China e a Coreia do Sul provavelmente estão exagerando no patenteamento."

Editoria de Arte/Folhapress
PESQUISA E INOVAÇÃO Produção de ciência e patentes dos países emergentes está se igualando à das nações mais ricas
PESQUISA E INOVAÇÃO Produção de ciência e patentes dos países emergentes está se igualando à das nações mais ricas

Índia Espaço aberto para a inovação

Nos últimos anos, o aumento da inovação na Índia, o "I" dos BRICs (os países emergentes mais próximos de se tornar potências econômicas - além da Índia, Brasil, Rússia e China), tem sido muito debatido.

Por Sunil Mani*

Um dos mais relevantes aspectos do extraordinário desenvolvimento da Índia nos últimos anos é o aumento da inovação. Uma série de fatores explica isso:

1) O país emergiu como a quinta maior economia do mundo em paridade do poder de compra em dólares, segundo o Banco Mundial. Seu PIB cravou 7% em 2007 e menos de 6% em 2009, depois de subir de 5% em 2002 para 9% ao ano entre 2005 e 2007, segundo o Fundo Monetário Internacional.

2) Há muitos exemplos de inovação no setor de serviços, sobretudo quanto à saúde. Atualmente, o setor de serviços representa dois terços do PIB da Índia. Os serviços e setores da indústria transformadora têm tido ótimo desempenho.
No setor industrial, por exemplo, o lançamento do Tata Nano, em 2008, marcou o advento do “carro mais barato do mundo”, vendido na Índia por US$ 2.200. O veículo foi projetado na Itália, com componentes fabricados por uma subsidiária indiana da empresa alemã Bosch. Cerca de dois terços da tecnologia dos produtos Bosch usados no Nano provêm da Índia.
No setor da saúde, a máquina MAC 400, produzida pelo Centro de Tecnologia John F. Welch da General Electric, em Bangalore, registra o eletrocardiograma de um paciente. Como ela é portátil, pode ser usada em áreas rurais para diagnosticar doenças cardíacas.
Por muito tempo, os líderes políticos indianos evitaram usar explicitamente o termo “inovação” nos documentos relativos a atividades tecnológicas. A palavra apareceu pela primeira vez em um documento em 2008, no projeto da Lei Nacional de Inovação. Essa evolução reflete um vasto sentimento nos círculos políticos e empresariais de que o país está se tornando mais inovador – pelo menos em certas indústrias.

3) A intensidade de conhecimento da produção indiana se expandiu. Atualmente, cerca de 11% do PIB do país vem de produtos intensivos em conhecimento e serviços. Também digno de nota é o fato de que o crescimento na produção de conhecimento intensivo supera o da economia global. A maioria das novas empresas pertence a setores intensivos em conhecimento e o número de empresas de conhecimento intensivo tem aumentado rapidamente desde 2003.
Rui Vieira/AFP
Ao adquirir a fabricante de aço britânica Corus, a indiana Tata Steel ganhou direitos sobre mais de 80 patentes norte-americanas.

4) O investimento direto estrangeiro (IDE) na Índia cresceu de US$ 2 milhões em 1993 para cerca de US$ 19 bilhões em 2009. Isso inclui algumas aquisições tecnologicamente relevantes no Exterior por empresas indianas, como a compra da britânica Corus (segunda maior fabricante europeia de aço) pela Tata Steel e a de empresas de energia eólica alemãs pela Suzlon. Essas aquisições têm dado às companhias indianas acesso considerável à capacidade tecnológica das empresas adquiridas. Antes de comprar a Corus, a Tata Steel não possuía uma única patente norte-americana. A aquisição trouxe mais de 80 patentes e quase mil pesquisadores.
Além disso, o número de centros de pesquisa e desenvolvimento (P&D) estrangeiros cresceu de menos de 100 em 2003 para cerca de 750 no fim de 2009. A maioria deles se relaciona às tecnologias de informação e comunicação e às indústrias automobilística e farmacêutica.
Seshadri Sukumar/AFP
Lançamento de uma nave indiana levando cinco satélites, em julho de 2010. A Índia já se consolidou internacionalmente na área de projeto e fabricação de naves espaciais.

5) A Índia tornou-se mais competitiva em alta tecnologia. Embora os itens de baixa tecnologia ainda dominem as exportações de manufaturados, a participação dos produtos de alta tecnologia dobrou nos últimos 20 anos, para 17%. A Índia se tornou o maior exportador mundial de tecnologia da informação (TI) desde 2005 e as exportações de produtos aeroespaciais têm aumentado 74% ao ano, ante 15% para as exportações mundiais desses produtos. A Índia é reconhecida por ter capacidade tecnológica considerável no projeto e na fabricação de naves espaciais e agora é líder mundial em sensoriamento remoto.
A maior parte da inovação nessa área vem do governo, não da indústria – uma situação que está prestes a mudar. As exportações indianas ligadas à aeronáutica, originárias de cerca de 300 pequenas e médias empresas, aumentaram muito nos últimos anos, mesmo limitando-se ainda a peças de aeronaves ou componentes.

Repasse limitado de conhecimento
As despesas governamentais em P&D tendem a concentrar-se em energia nuclear, defesa, espaço, saúde e agricultura. A transmissão da pesquisa do governo para uso civil é muito limitada, embora recentemente esforços conscientes tenham sido feitos por Nova Délhi para orientar a pesquisa mais para objetivos socioeconômicos. Isso está começando a produzir resultados, sobretudo na área de pesquisa espacial, com o desenvolvimento de monitoramento ambiental, comunicações via satélite e assim por diante.

O ensino superior indiano não é uma fonte de tecnologia para a indústria. Isso pode surpreender, já que os institutos de tecnologia locais colaboram com o setor privado. Mas os casos de geração de tecnologia são poucos e distantes entre si. Além disso, os institutos tendem a se dedicar muito ao ensino intensivo. O ensino superior da Índia age como um importante reservatório de pessoal qualificado – mas para outros atores do sistema nacional de inovação do país.

Atualmente, as empresas privadas despendem cerca de quatro vezes mais tempo do que as públicas em P&D e quase três vezes mais do que os institutos de pesquisa do governo. Em outras palavras, as empresas privadas estão se movendo rumo ao núcleo do sistema de inovação da Índia. Quatro indústrias representam a maior parte do investimento em P&D, com as indústrias farmacêutica e automobilística no topo da lista. Não há evidência suficiente para mostrar que todo o setor industrial da Índia se tornou mais inovador desde 1991, mas sua indústria farmacêutica com certeza ajudou nesse sentido.

Em busca de mais qualificação
Ultimamente, a indústria tem se queixado de uma grave escassez de pessoal tecnicamente qualificado. Um estudo feito pela Federação das Câmaras Indianas de Comércio e Indústria em 2007 revela um déficit de 25% de pessoal qualificado em engenharia.

Duas questões têm impacto sobre a oferta potencial de cientistas e engenheiros para as empresas domésticas, em particular. A primeira é o antigo problema da migração de pessoal altamente qualificado, sobretudo para o Ocidente, que se tem acelerado nos últimos tempos. A segunda questão diz respeito ao crescente volume de IDE em P&D. Os centros de P&D estrangeiros podem oferecer aos pesquisadores locais e ao pessoal de P&D incentivos melhores do que as empresas nacionais. Como resultado, o pequeno estoque de cientistas e engenheiros indianos pode ser atraído para os centros de P&D estrangeiros.
Noah Seelam/AFP
Estudantes de um instituto de engenharia aeronáutica assistem a uma aula em Hyderabad. Segundo a Unesco, 25% dos alunos do ensino superior indiano estão matriculados atualmente em áreas ligadas à ciência e à tecnologia.

O governo central, em particular, reagiu energicamente. No ensino superior, ele pretende aumentar a taxa de escolarização bruta de 11% em 2007 para 21% até 2017. Um quarto dos estudantes está atualmente matriculado em áreas ligadas à ciência e tecnologia (C&T), segundo o Instituto de Estatística da Unesco.

O governo decidiu criar 30 universidades centrais a partir de 2010, 14 das quais serão “universidades da inovação”. Cada uma delas deverá se concentrar em uma área importante para a Índia, como urbanização, sustentabilidade ambiental e saúde pública. Em paralelo, o governo está dobrando o número de Institutos Indianos de Tecnologia para 16 e criando 10 Institutos Nacionais de Tecnologia, 3 Institutos Indianos de Ciências da Educação e Pesquisa e 20 Institutos Indianos de Tecnologia da Informação para melhorar a educação em engenharia. Deve ainda permitir que universidades estrangeiras entrem no sistema de ensino superior indiano, criando seus campi próprios ou fazendo joint ventures com universidades e institutos existentes.

O impacto da nova lei de patentes
Uma mudança política importante nos últimos anos foi a nova lei de patentes indiana, de 2005, que procurou deixar o país em conformidade com o Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual (Trips, na sigla em inglês) da Organização Mundial do Comércio. Sua característica mais marcante é o reconhecimento de ambas as patentes, de produtos e de processos – na lei anterior, de 1970, só a patente de processo era reconhecida. Ao deixar a Índia em conformidade com o Trips, a intenção era restringir a inovação na indústria farmacêutica, em particular, já que a falta de patentes de produtos havia permitido às empresas locais fazer a engenharia reversa de produtos conhecidos a baixo custo.

Esses 35 anos de aprendizado, porém, parecem ter dado às farmacêuticas indianas o tempo necessário para adquirir as habilidades fundamentais a fim de criar novas entidades químicas. Após a aprovação da Lei de Patentes, esperavase que a P&D da indústria farmacêutica indiana caísse, já que grande parte da P&D nesse setor ainda consistiria de engenharia reversa. Mas as empresas farmacêuticas privadas da Índia continuaram a registrar um aumento do investimento em P&D de quase 35% ao ano.
Manpreet Romana/AFP
Malvinder Mohan Singh (esquerda), presidente-executivo do laboratório Ranbaxy, e Takashi Shoda, presidente da empresa farmacêutica japonesa Daiichi Sankyo Takashi, respondem a perguntas na conferência de imprensa em que foi anunciada a compra de 35% da Ranbaxy pela Daiichi Sankyo. A Ranbaxy é a maior farmacêutica e a maior produtora de genéricos da Índia .

O volume de negócios da indústria farmacêutica indiana cresceu de modestos US$ 300 milhões em 1980 para cerca de US$ 19 bilhões em 2008. A Índia só está abaixo dos Estados Unidos e do Japão em termos de volume de produção, com 10% do mercado mundial. Em termos do valor da produção, ela é a 14ª, com 1,5% do mercado global.

Há cerca de 5 mil empresas indianas e estrangeiras envolvidas na fabricação de produtos farmacêuticos, que empregam diretamente cerca de 340 mil pessoas. Muito do crescimento dessa indústria advém das exportações, que cresceram 22% em média entre 2003 e 2008. Os principais destinos em 2008 foram, em ordem decrescente, EUA, Alemanha, Rússia, Reino Unido e China.

Essa indústria tem quatro características principais:
• É dominada por formulações, o processo de combinar diferentes substâncias químicas para produzir uma droga, e emprega mais de 400 substâncias ativas para uso na preparação de droga, conhecidas como ingredientes farmacêuticos ativos;
• É muito ativa no mercado mundial de genéricos e chega a abastecer países desenvolvidos;
• Permite que a Índia seja autossuficiente na maioria dos remédios, como testemunhado por um crescente saldo comercial positivo;
• É uma das indústrias mais inovadoras da Índia em termos de P&D e do número de patentes concedidas, tanto na Índia como no Exterior.

Uma derivação da capacidade inovadora dessa indústria é que ela se tornou um destino popular para testes clínicos, contratos de fabricação e terceirização de P&D. Essa capacidade contém uma grande promessa para a indústria farmacêutica indiana, já que se estima que US$ 103 bilhões de genéricos estão sob risco de perder a patente até 2012. Além disso, o mercado global para o contrato de fabricação de remédios deverá crescer de US$ 26 bilhões para US$ 44 bilhões até 2015.

Uma tendência recente é a onda de fusões e aquisições em que empresas indianas compraram companhias estrangeiras e vice-versa. Numa das negociações mais importantes, em 2008, a gigante farmacêutica japonesa Daiichi Sankyo comprou, por US$ 4,6 bilhões, 35% da Ranbaxy, maior farmacêutica da Índia e maior produtora de genéricos do país.

Salto nos artigos científicos
Os dados mais recentes da Thomson Reuters confirmam que a força da Índia está em farmacologia, química e toxicologia. O número de artigos indianos registrados no Science Citation Index duplicou entre 2002 e 2008, chegando a 36.261. Se essa taxa for mantida, o registro de publicações da Índia estará em pé de igualdade com a maioria dos países do G8 em 7 ou 8 anos. Nos últimos dez anos, a Índia tem acelerado o registro de patentes nos EUA. A maioria dessas patentes se relaciona a novas invenções. Em geral, elas se referem a áreas ligadas à química e a maioria está sendo concedida a empresas estrangeiras instaladas na Índia, com base em projetos de P&D que elas desenvolveram lá.

O número de patentes nacionais concedidas pelo Escritório de Patentes da Índia também aumentou bastante, embora 75% delas tenham sido concedidas a empresas estrangeiras. Mais uma vez, a maioria delas se refere às áreas química e farmacêutica. Embora a nova lei indiana de patentes pareça ter tido um efeito positivo para inventores indianos, a maioria das patentes concedidas a eles na Índia e no Exterior vai para empresas estrangeiras.

A Índia tem feito grandes avanços na investigação espacial, em ciências da vida e, sobretudo, em biofármacos e TI. Apesar de a ciência doméstica continuar a dominar, há uma presença crescente de instituições estrangeiras no sistema de tecnologia local.

O principal desafio será o de melhorar a qualidade e a quantidade do pessoal de C&T. Como vimos, os líderes políticos tomaram medidas enérgicas para resolver a situação. O êxito futuro do sistema indiano de inovação vai depender da medida de seu sucesso.

*Sumil Mani, autor do capítulo sobre a Índia do Relatório de Ciência da Unesco de 2010, é professor e presidente da Comissão de Planejamento do Centro de Estudos de Desenvolvimento em Trivandrum, Kerala.

Revista Planeta

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